26/08/2008

Os Gully - Os Gully EP

Os Gully - Os Gully EP

Num mercado de música ainda acometido por uma excessiva magreza, é sempre de louvar que uma banda siga em contra-corrente e edite em nome próprio. Com a enorme vantagem de uma liberdade criativa sem amarras e a inevitável desvantagem de uma distribuição escassa, as edições de autor são um grito na pacatez de uma indústria que raramente consente riscos. Infelizmente, também falta aos projectos independentes algum jogo de cintura para encaixar uma crítica mais desfavorável.

Toda esta conversa seria desnecessária se este país não se chamasse Portugal e não passasse parte do tempo a lamber feridas. A bem da nação, sublima-se a escrita na língua de Camões e faz-se disso bandeira, ainda que a música não ultrapasse a marca do sofrível. É o caso deste primeiro EP dos Gully, que assenta essencialmente na linguagem de guitarras afinadas nos anos 70. Foi, de resto, nesta década que o quinteto de Azeitão cavou influências, mais na escola Deep Purple do que na de Jimi Hendrix.

São cinco temas, mais um radio edit de 'Estou Preso', de uma xaropada revivalista de gente que parou no tempo. Nada contra olhar para trás e lançar perspectiva sobre o presente. Afinal, a música é também e sobretudo memória. O problema é que os Gully não se conseguem decidir entre um rock sinfónico e um registo de pop pegajosa. As mais das vezes, ficam-se por uma beatice asfixiante amplificada por letras como "na ombreira da porta/ à entrada da igreja/ numa aldeia morta/ procuro onde esteja".

Logo aí, em 'Corpo Sem Sombra', se percebe que eles vêm de uma linhagem que faz do solo de guitarra o altar do virtuosismo. E a voz de Pedro Veiga aproxima-se perigosamente da de Axl Rose (ouça-se o arrastado 'Reencontro'). As rimas são, no mínimo, desinspiradas e ficam entre o piegas e o piroso. Como em "apareço de surpresa/ em corpo de inocência/ conforto e dou defesa/ não sou só de aparência". Em resumo, é um EP que passa mas não fica. Pode tocar em casa mas não é por ele que deixamos queimar a comida que está ao lume.

http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=382

2 comentários:

Unknown disse...

Apesar de apresentar um texto bem redigido, acho que tem de ouvir melhor o EP.
Devemos sempre incentivar as bandas nacionais a cantar em português , por muito piegas,pegajosas, ou lamechas que sejam as letras.
Se o mercado está magro, talvez se deva a este tipo de critica destrutiva, pouco interesante, que não produz curiosidade intelectual de própria reflexão

Helder Gomes disse...

Obrigado pelo comentário, Dalores! Devo, no entanto, confessar que é com muita dificuldade que leio sobre "incentivar as bandas nacionais a cantar em português". Soa-me sempre a um portuguesismo muito pouco exigente, que permite enunciados como "eles até tocam mal e fazem umas letras mazinhas mas olha, sempre são portugueses e cantam na nossa língua"... Prefiro escrever com honestidade sobre um disco a deixar-me embrutecer por essa espécie de nacionalismo bafiento que, volta e meia, milita por aí. Posso dizer-te que Os Gully tiveram uma atitude bem mais adulta e profissional ao colocarem no MySpace deles um link para a minha crítica, que não foi, de facto, positiva.