Geffen
Rating: 5/10
Anyone familiar with the intricacies present in Bleach, Nirvana’s debut record, will tell you how different it sounds from the great rock n’ roll swindle that followed, Nevermind. Songs like "Floyd the Barber" and "Paper Cuts" seemed to surrender themselves to the slippery purgatory of college radio. At least, that’s what happened with Dinosaur Jr. and The Melvins.
To put a long story in a small paragraph, let’s just say that, a few years after formation, Nirvana inadvertently left their insurrectionary status as a band from Aberdeen, Washington, and toured the world. From transgressive art vandals, Nirvana became pop stars. In the end, Kurt Cobain took his own life and another rock mimesis act was accomplished. And after Nirvana, no band was ever capable of outdoing the legacy inherited.
I know it sounds terribly lame and everything in music (and art, for that matter) has to be put in some kind of perspective - and I do have a perspective, but choose the emotional one whenever Nirvana is the subject. But that doesn’t stop me from stating that nothing reverential has to be said about Sliver: The Best of the Box. As the title suggests, this release is a brief summary of last year’s much-balyhooed boxed set, With the Lights Out.
That, of course, and three previously unreleased tracks, but that is too weak of an argument to put an album out. Sure it’s always a delight to hear "Clean Up Before She Comes" or their cover of Leadbelly’s "Ain’t It a Shame", but it must be really frustrating for the diehard fan to purchase an album with 19 (out of 22) tracks that were released the year before. But mind you, that’s how the music industry works. Besides, Christmas is fast approaching.
What really sets the tone for a record that, otherwise, would sound merely revisionist (and, in a way, this surely is) is the first track. Unreleased before the Geffen marketing machine roared to life, aiming to put a hand or two in your wallet, "Spank Thru" is one hell of a track. Particularly because this is the version taken from the now mythical Fecal Matter demo tape, released in 1985 and featuring Cobain on guitar and vocals, and Dale Crover (of the mighty Melvins) on bass and drums.
The second reason why this makes any sense is "Sappy", a studio recording from 1990, which is a candelabrum of a song that documents Kurt Cobain’s love for the folksy side of music. This one here crosses his poppy voice with a bassline reminiscent of Motown. Ironically, this is the sort of music most fans of Nirvana’s more oblique side will have to grit their teeth to get through.
Finally, the pre-Nevermind, rougher version of "Come As You Are" included here lacks the rhythmic anchor of the more polished versions of the track. It doesn’t set things on a knife edge as most Nirvana tracks do. Besides, this is the kind of tune that deserved a less-abrupt ending, one that would serve as a proper instrumental postscript.
To really break it down for you, let me just say that if you haven’t bought With the Lights Out, don’t make the mistake of trying use this compilation as a surrogate. Save a few more bucks and get the real deal. If you are a devoted fan, you may want to consider getting this for the meager novelties it encloses but, at the end of the day, you will agree that Sliver: The Best of the Box is just a pair of sloppy brackets encapsulating ever more interesting takes, still hidden in the vault. This is clear for anyone who knows which end of a guitar goes through the amp.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=927236035439e7038d0740
15/12/2005
NEU! - NEU! / NEU! 2 / NEU! 75
1972 / 1973 / 1975 (2005)
Gronland Records/Popstock!
Chamaram-lhe shoegaze porque as bandas tocavam imóveis enquanto fixavam os olhos no chão do palco. Esta é uma das pistas possíveis para redescobrir os NEU! mas não é talvez a mais correcta. Quando se reeditam os três álbuns com que fizeram história (na verdade, são dois mais um, mas já lá vamos), importa situar a formação germânica num conceito-chave: o “motorik”, um tipo de som industrial que soa às engrenagens que fizeram falta nalguma da cinematografia de Chaplin. Assim sendo, e indo um pouco mais à frente na árvore de conceitos, encontramos outro para designar os dissidentes kraftwerkianos: nem mais nem menos que “krautrock”. Mas relativamente a esse terão de repartir louros com uns Faust ou uns Can. O rigor de enquadramento oblige.
A cidade de Düsseldorf pariu-os em 1971, depois de Klaus Dinger e Michael Rother terem abortado nos Kraftwerk. No início do ano seguinte, os NEU! lançavam o disco homónimo de estreia. Gravado com Conrad Plank, produtor com os Can no cabeçalho do currículo, NEU! é a cábula a que se recorre quando o que importa é perceber as matizes do krautrock. Até porque, como veremos adiante, foi o único trabalho gravado em condições ditas “normais”, se descontarmos o facto de ter sido gravado em apenas quatro dias. Lapso de tempo manifestamente curto para apurar estruturas tão complexas quanto as que se declinam, por exemplo, em “Negativland”.
Imaginemos um fio de contas em que cada uma destas se desmultiplica em outras tantas e estas últimas teimam em constituir família. Daí até se decantar de cada tema uma nebulosa de espirais de guitarra, uma percussão maquínica, um baixo descomplexado mas parco nas notas, um sentido de comunidade, nem que seja entre roldanas e parafusos, locomotivas e trovões (um deles até cunhou a expressão “apache beat” para definir o som que faziam no interior da banda) é um pequeníssimo passo e um salto grande na direcção de abrir novos caminhos. Para pôr as coisas numa perspectiva histórica, diríamos, sem grandes achaques, que sem os NEU! nunca os My Bloody Valentine ou os Stereolab teriam existido, ou, a existirem, seriam certamente pouco mais do que interessantes.
Mas ao disco o que é do disco: um Dinger endiabrado a levar a bateria ao céu, a fazer descer sobre as nossas cabeças uma Via Láctea de peles esticadas ao invés de as fazer seguir pela Via Verde. A música é lenta mas tocada a um volume impossível, denso, nada circunstancial, aglomerador de empatias e ouvidos em sangue. É aqui que devem procurar as bases fundadoras desse estilo barroco de tocar alto e devagar. Já o baixo de Rother é da ordem de grandeza de uma rede de pesca para peixe graúdo, em cujos nós ficam suspensas linhas de guitarras que são protagonistas nos sonhos húmidos dos melómanos que nunca calçam o sapato errado. Mas não vejam na pintura pinceladas de virtuosismo desmesurado: só para terem uma ideia, “Hallogallo” é o mesmo acorde de guitarra em distintas variações. Por aqui até parece simples ser-se complexo.
E, no entretanto, enquanto o disco evolui – aqui sem metade da piada da edição original, porque nesta tinha que se mudar de lado –, aquilo que se afere é um estado liquefeito, quase de narratividade, apesar dos drones afoitos, do feedback a rodos e de fades capazes de deixar qualquer produtor mais académico com os nervos à flor da pele. O eco, empilhado em montanhas de outros efeitos, e um toque despudoradamente industrial estão para “Im Glück” como o carimbo de “essencial” está para o resto do disco. Mas isto foi só o princípio do fim.
Em 1973, era NEU! 2 que saía para alemão ver (note-se que, durante o período de carburação da máquina, os sons foram de difícil exportação para lá da Alemanha Ocidental). Com prazos muito difíceis de cumprir e um orçamento dificilmente deduzível em sede de IRS, este segundo tomo conta apenas duas canções acabadas: “Super” e “Neuschnee”. E é isto. Bom, isto mais umas sobras e diferentes velocidades para aqueles temas para encher um disco e fazê-lo seguir para as lojas.
Ou seja, tudo o que seria frontalmente dispensado por músicos sem vocação para o suicídio, todas as imperfeições, as minudências de estúdio – tipo o som da fita de cassete a sucumbir ao traquejo do gravador ou o tradicional ruído de disco riscado – fizeram uma aparição fulgurante num disco que também começou a dar mostras do aflorar de problemas internos. Vale sobretudo pelo “statement” absolutamente contra-sistema que representa, bem mais do que pelos retalhos de experimentação avulsa que seguiram para serem prensados.
Claro que os tais problemas no seio dos NEU! deram em bronca e a bronca deu em reunião, que por sua vez deu em disco – NEU! 75 de 1975 e nova separação. Depois, Rother começou uma carreira a solo, Dinger e Hans Lampe começaram os La Düsseldorf, nova reunião dos NEU! na década de 80 e compasso de espera até ser editado NEU! 4, em 1996. Mas a história que aqui se conta termina ali em cima, em 75. Arrumemo-lo pois em três ou quatro frases porque até é o menos interessante do material reeditado. Despachemos já a faixa alienígena: “Hero” é tão desajustada que mais parece hino punk à Johnny Rotten (e o pior é que acaba com o chilrear de pássaros). “Isi” é New Order para a estrada. O disco fica salvo por “E-Musik”, tema sombrio, sequenciadores no sítio certo, fogo de artifício rítmico, com uma verdadeira noção de perspectiva, espaço e vagas dentro do som. Noves fora, será sempre um prazer ouvir os NEU!, sentir-lhes os ossos e as articulações de novo e reaprender, a cada escuta, a gostar de música. Trinta anos depois. Antes mesmo de muitos de nós termos nascido ou aprendido a gostar da música que interessa.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=557
Gronland Records/Popstock!
Chamaram-lhe shoegaze porque as bandas tocavam imóveis enquanto fixavam os olhos no chão do palco. Esta é uma das pistas possíveis para redescobrir os NEU! mas não é talvez a mais correcta. Quando se reeditam os três álbuns com que fizeram história (na verdade, são dois mais um, mas já lá vamos), importa situar a formação germânica num conceito-chave: o “motorik”, um tipo de som industrial que soa às engrenagens que fizeram falta nalguma da cinematografia de Chaplin. Assim sendo, e indo um pouco mais à frente na árvore de conceitos, encontramos outro para designar os dissidentes kraftwerkianos: nem mais nem menos que “krautrock”. Mas relativamente a esse terão de repartir louros com uns Faust ou uns Can. O rigor de enquadramento oblige.
A cidade de Düsseldorf pariu-os em 1971, depois de Klaus Dinger e Michael Rother terem abortado nos Kraftwerk. No início do ano seguinte, os NEU! lançavam o disco homónimo de estreia. Gravado com Conrad Plank, produtor com os Can no cabeçalho do currículo, NEU! é a cábula a que se recorre quando o que importa é perceber as matizes do krautrock. Até porque, como veremos adiante, foi o único trabalho gravado em condições ditas “normais”, se descontarmos o facto de ter sido gravado em apenas quatro dias. Lapso de tempo manifestamente curto para apurar estruturas tão complexas quanto as que se declinam, por exemplo, em “Negativland”.
Imaginemos um fio de contas em que cada uma destas se desmultiplica em outras tantas e estas últimas teimam em constituir família. Daí até se decantar de cada tema uma nebulosa de espirais de guitarra, uma percussão maquínica, um baixo descomplexado mas parco nas notas, um sentido de comunidade, nem que seja entre roldanas e parafusos, locomotivas e trovões (um deles até cunhou a expressão “apache beat” para definir o som que faziam no interior da banda) é um pequeníssimo passo e um salto grande na direcção de abrir novos caminhos. Para pôr as coisas numa perspectiva histórica, diríamos, sem grandes achaques, que sem os NEU! nunca os My Bloody Valentine ou os Stereolab teriam existido, ou, a existirem, seriam certamente pouco mais do que interessantes.
Mas ao disco o que é do disco: um Dinger endiabrado a levar a bateria ao céu, a fazer descer sobre as nossas cabeças uma Via Láctea de peles esticadas ao invés de as fazer seguir pela Via Verde. A música é lenta mas tocada a um volume impossível, denso, nada circunstancial, aglomerador de empatias e ouvidos em sangue. É aqui que devem procurar as bases fundadoras desse estilo barroco de tocar alto e devagar. Já o baixo de Rother é da ordem de grandeza de uma rede de pesca para peixe graúdo, em cujos nós ficam suspensas linhas de guitarras que são protagonistas nos sonhos húmidos dos melómanos que nunca calçam o sapato errado. Mas não vejam na pintura pinceladas de virtuosismo desmesurado: só para terem uma ideia, “Hallogallo” é o mesmo acorde de guitarra em distintas variações. Por aqui até parece simples ser-se complexo.
E, no entretanto, enquanto o disco evolui – aqui sem metade da piada da edição original, porque nesta tinha que se mudar de lado –, aquilo que se afere é um estado liquefeito, quase de narratividade, apesar dos drones afoitos, do feedback a rodos e de fades capazes de deixar qualquer produtor mais académico com os nervos à flor da pele. O eco, empilhado em montanhas de outros efeitos, e um toque despudoradamente industrial estão para “Im Glück” como o carimbo de “essencial” está para o resto do disco. Mas isto foi só o princípio do fim.
Em 1973, era NEU! 2 que saía para alemão ver (note-se que, durante o período de carburação da máquina, os sons foram de difícil exportação para lá da Alemanha Ocidental). Com prazos muito difíceis de cumprir e um orçamento dificilmente deduzível em sede de IRS, este segundo tomo conta apenas duas canções acabadas: “Super” e “Neuschnee”. E é isto. Bom, isto mais umas sobras e diferentes velocidades para aqueles temas para encher um disco e fazê-lo seguir para as lojas.
Ou seja, tudo o que seria frontalmente dispensado por músicos sem vocação para o suicídio, todas as imperfeições, as minudências de estúdio – tipo o som da fita de cassete a sucumbir ao traquejo do gravador ou o tradicional ruído de disco riscado – fizeram uma aparição fulgurante num disco que também começou a dar mostras do aflorar de problemas internos. Vale sobretudo pelo “statement” absolutamente contra-sistema que representa, bem mais do que pelos retalhos de experimentação avulsa que seguiram para serem prensados.
Claro que os tais problemas no seio dos NEU! deram em bronca e a bronca deu em reunião, que por sua vez deu em disco – NEU! 75 de 1975 e nova separação. Depois, Rother começou uma carreira a solo, Dinger e Hans Lampe começaram os La Düsseldorf, nova reunião dos NEU! na década de 80 e compasso de espera até ser editado NEU! 4, em 1996. Mas a história que aqui se conta termina ali em cima, em 75. Arrumemo-lo pois em três ou quatro frases porque até é o menos interessante do material reeditado. Despachemos já a faixa alienígena: “Hero” é tão desajustada que mais parece hino punk à Johnny Rotten (e o pior é que acaba com o chilrear de pássaros). “Isi” é New Order para a estrada. O disco fica salvo por “E-Musik”, tema sombrio, sequenciadores no sítio certo, fogo de artifício rítmico, com uma verdadeira noção de perspectiva, espaço e vagas dentro do som. Noves fora, será sempre um prazer ouvir os NEU!, sentir-lhes os ossos e as articulações de novo e reaprender, a cada escuta, a gostar de música. Trinta anos depois. Antes mesmo de muitos de nós termos nascido ou aprendido a gostar da música que interessa.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=557
13/12/2005
Sonic Youth - Goo [Deluxe Edition]
Geffen
Rating: 9/10
Two years after Sonic Youth’s Dirty got the deluxe treatment it deserved, Goo emerges from the vaults and is upgraded for a new generation of sonic prospectors. The addition of outtakes, B-sides and material never before released is indeed what makes this 2xCD set appealing to the diehard fans who bought the follow-up to Daydream Nation in its heyday.
Retrospectively, Goo, originally released in the summer of 1990, was extremely important for at least a couple of reasons: a) it hinted at the direction the New Yorkers were heading in, both musically and as a cohesive art ensemble, and b) it pulverized all scepticism that inevitably blossomed after they had signed with a major label. (Before moving on, let’s just thank everyone involved for keeping the original Raymond Pettibon artwork intact.)
In the liner notes for this expanded edition, music writer Byron Coley recalls: "A college student named Debbie told me… ‘When I was 12 years old someone gave me a copy of Goo. It’s the only thing that saved me from being a teenybopper." In a time when it was the rock star, and not the DJ, who could save your life, the guitar/bass and drum slugfest that occurs throughout the course of this album is tentatively provocative and rather inspiring, to say the least. Anyone expecting a softened detour in Sonic Youth’s path, after Daydream Nation broke its way to the masses, must certainly have felt really confused with tracks like "Mildred Pierce" and "Disappearer", the latter a song about UFOs. Some even dismissed it as mere artistic filler before pointing to an overall artistic failure circa Experimental Jet Set, Trash and No Star. But Thurston Moore, Kim Gordon, Lee Ranaldo and Steve Shelley are still here to prove them all wrong.
The real highlight of this record remains Kim Gordon’s collaboration with Public Enemy’s Chuck D on "Kool Thing". Her vocal mannerisms defy any sort of categorization when assisted by the always ferocious and poignant presence of the storied MC. But, for the purists, there’s also the clean, Chuck-less version of "Kool Thing" on Disc Two. Of course Goo would never be the same without "Mary-Christ", a song about dating Jesus’ mother, which gets all the exposure it deserves on both discs of the release; or "Tunic (Song For Karen)", a tribute to the lead singer for the Carpenters, who died of heart failure brought on by anorexia nervosa, in the early 80s – a song also featured on side two as an 8-track demo, along with other revisited luminaries like "My Friend Goo" and "Cinderella’s Big Score".
As it is normally the rule when these expanded records come out, the tracks featured on side two strip the original album to its barest essentials and all manner of studio-induced glimmer goes out the window. Those not connected to the Sonic Youth galaxy – and therefore a thousand light-years away from the genesis of everything interesting – will now have the chance to pull the plug twice on this album. All others - meaning those who understand that these songs aren’t supposed to be sung in the bath and who despise self-pitying arguments about a certain taste in music - will delve into the lethargic moan of Moore, and the incontinent emotion enclosed in Gordon’s voice.
As an addendum, those who understand will know how it feels like to be one of the first to put their hands on valuable material such as "That’s All I Know (Right Now)" and "I Know There’s an Answer" – amazingly-crafted covers of the Neon Boys and the Beach Boys songs, respectively – as well as the instrumentals "Can Song" and "Isaac", and the essential "Dr. Benway’s House", which was Sonic Youth’s contribution to William Burroughs’ Dead City Radio. Some will argue that this deluxe edition flattens Goo’s primal scream into a commercial item, full of extras, and overexposes its fundamental truth (the inclusion of a six-minute, promotion-only interview may also be regarded as a marketing appetizer per se). But I would say that the least we can do for Sonic Youth is to sacrifice our philosophical argumentation on the altar of their music, updated or otherwise.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1539382983439e4981346f1
Rating: 9/10
Two years after Sonic Youth’s Dirty got the deluxe treatment it deserved, Goo emerges from the vaults and is upgraded for a new generation of sonic prospectors. The addition of outtakes, B-sides and material never before released is indeed what makes this 2xCD set appealing to the diehard fans who bought the follow-up to Daydream Nation in its heyday.
Retrospectively, Goo, originally released in the summer of 1990, was extremely important for at least a couple of reasons: a) it hinted at the direction the New Yorkers were heading in, both musically and as a cohesive art ensemble, and b) it pulverized all scepticism that inevitably blossomed after they had signed with a major label. (Before moving on, let’s just thank everyone involved for keeping the original Raymond Pettibon artwork intact.)
In the liner notes for this expanded edition, music writer Byron Coley recalls: "A college student named Debbie told me… ‘When I was 12 years old someone gave me a copy of Goo. It’s the only thing that saved me from being a teenybopper." In a time when it was the rock star, and not the DJ, who could save your life, the guitar/bass and drum slugfest that occurs throughout the course of this album is tentatively provocative and rather inspiring, to say the least. Anyone expecting a softened detour in Sonic Youth’s path, after Daydream Nation broke its way to the masses, must certainly have felt really confused with tracks like "Mildred Pierce" and "Disappearer", the latter a song about UFOs. Some even dismissed it as mere artistic filler before pointing to an overall artistic failure circa Experimental Jet Set, Trash and No Star. But Thurston Moore, Kim Gordon, Lee Ranaldo and Steve Shelley are still here to prove them all wrong.
The real highlight of this record remains Kim Gordon’s collaboration with Public Enemy’s Chuck D on "Kool Thing". Her vocal mannerisms defy any sort of categorization when assisted by the always ferocious and poignant presence of the storied MC. But, for the purists, there’s also the clean, Chuck-less version of "Kool Thing" on Disc Two. Of course Goo would never be the same without "Mary-Christ", a song about dating Jesus’ mother, which gets all the exposure it deserves on both discs of the release; or "Tunic (Song For Karen)", a tribute to the lead singer for the Carpenters, who died of heart failure brought on by anorexia nervosa, in the early 80s – a song also featured on side two as an 8-track demo, along with other revisited luminaries like "My Friend Goo" and "Cinderella’s Big Score".
As it is normally the rule when these expanded records come out, the tracks featured on side two strip the original album to its barest essentials and all manner of studio-induced glimmer goes out the window. Those not connected to the Sonic Youth galaxy – and therefore a thousand light-years away from the genesis of everything interesting – will now have the chance to pull the plug twice on this album. All others - meaning those who understand that these songs aren’t supposed to be sung in the bath and who despise self-pitying arguments about a certain taste in music - will delve into the lethargic moan of Moore, and the incontinent emotion enclosed in Gordon’s voice.
As an addendum, those who understand will know how it feels like to be one of the first to put their hands on valuable material such as "That’s All I Know (Right Now)" and "I Know There’s an Answer" – amazingly-crafted covers of the Neon Boys and the Beach Boys songs, respectively – as well as the instrumentals "Can Song" and "Isaac", and the essential "Dr. Benway’s House", which was Sonic Youth’s contribution to William Burroughs’ Dead City Radio. Some will argue that this deluxe edition flattens Goo’s primal scream into a commercial item, full of extras, and overexposes its fundamental truth (the inclusion of a six-minute, promotion-only interview may also be regarded as a marketing appetizer per se). But I would say that the least we can do for Sonic Youth is to sacrifice our philosophical argumentation on the altar of their music, updated or otherwise.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1539382983439e4981346f1
21/11/2005
Boards of Canada - The Campfire Headphase
2005
Warp
Os Boards of Canada ocupam um lugar quase mítico nas consciências de algumas pessoas cujas preocupações ultrapassam, em muitos quilómetros, o perímetro do seu bairro. Conhecemos a Escócia dos canais, dos kilts, do calão e do Loch Ness, mas também dos Mogwai e dos Belle & Sebastian – esqueçam os Franz Ferdinand! (Há por estas noites de Inverno um senhor que se senta num banco de jardim da Avenida da Liberdade e toca gaita de foles... Apetece perguntar se é escocês e se gosta do bife bem ou mal passado. Por detrás de cada rosto há uma história para contar e é sempre tentador interagir com a fauna humana que vive sob o manto cinzento da urbe.)
Não sabemos o que levou Michael Sandison e Marcus Eoin a juntarem-se e chamarem casa à costa norte da Escócia, uma franja de terra confinada entre o Mar do Norte e o Oceano Atlântico. Na verdade, não se sabe muito sobre os Boards of Canda (BoC) para além dos discos e das colaborações que vão mantendo no campo sideral das remisturas (confira-se, a propósito, o brilho sujo de “Dead Dogs Two”, original dos cLOUDDEAD, revisto por Michael e Marcus. That’s fucking beautiful, lad!). Há uma espécie de lei da rolha a vigorar, um black out que leva os admiradores e as línguas viperinas pelos caminhos da especulação lunática.
Passar sete anos sem editar mais do que três discos é também um bom reagente que ajuda na combustão de distorcidas visões da coisa. A proporção pode não ser comparável à taxa de reprodução de coelhos em idade adulta, mas se atentarmos no mercado extra-LP, temos uma boa meia-dúzia de estremosas edições – desde o inaugural Twoism a In a Beautiful Place out in the Country, o EP que esteve entre a edição de Music Has the Right to Children e Geogaddi (sem esquecer, claro, as inevitáveis Peel Sessions, de 1999).
Acontece que o duo escocês começou do nada absoluto, que é por onde começam, com honrosas excepções, as bandas que nunca poderão ser confundidas com uma sopa expresso. Era o ano de 1996 e os embrionários BoC gravavam canções a um ritmo masturbatório quando se associaram ao selo Skam, já na altura afamado pelo vínculo à electrónica e ao experimental. Seguiram-se edições menores mas os rabinhos já se voltavam para a Lua ao fazerem primeiras partes de Autechre e Plaid. Em 1998, Music Has the Right to Children veio encerrar a discussão sobre qual seria o álbum maior que conjugasse um hip-hop minimal com umas subtilezas downtempo, uns pozinhos de trip-hop e duas pitadas de dope. Tinha sido criado e estava ali. Não foi há muito tempo mas desde então tem havido cópias obtusas da fórmula testada. Mas falta-lhes a minúcia (oh, a minúcia!), o jeito para a produção, para o constante alijar de velas vergadas por um vento lunar.
O travo essencialmente ambient, com ocasionais beliscões menos hip que hop, de Music... e depois de Geogaddi faria talvez prever um disco de toca e foge, de revisão da matéria dada e salto no precipício que se abre quando se fala da música da contemporaneidade. Mas não, não é isso que ouvimos neste The Campfire Headphase. Aquilo se ouve é até um nadinha obsceno: ouvem-se, aqui e ali, guitarras desfraldadas, sem make-up tecnológico. Antes de gritarem “vendidos”, tentem encontrar um padrão no percurso dos BoC. Pois, é difícil. Agora tentem não manter a boca aberta enquanto ouvem “Chromakey Dreamcoat”, um registo próximo do chill-out tardio, já quando a manhã espreita, seguido de curtíssimos samples do que parece ser uma televisão, mais lá para o fim.
É a isto que deve soar a entrada no cérebro de Kevin Shields: uma base instrumental sublime e limpa e umas migalhas de voz manipulada para não se ficar a conhecer o emissor. E o rigor do sample, sempre oportuno, seja a chuva no início de “Satellite Anthem Icarus”, o choro de uma criança ou as programações de uma idade pré-cibernética em “’84 Pontiac Dream” e “Oscar See Through Red Eye”. ”Soft like there’s silk everywhere”. Isso. Ou música de elevador numa estação espacial, aumentada por um glitch soltinho como arroz malandro (especialmente em “Peacock Tail”). The Campfire Headphase é uma escultura de gelo ao detalhe com ligeira inflexão na procura da melodia. É que os BoC são tudo menos orelhudos e isso nem sequer interessa aqui.
Com óbvias diferenças (até, ou sobretudo, estilísticas), mas de certa forma nos BoC podemos ver os Kraftwerk da nova geração. Não deixem de mostrar este disco aos vossos filhos quando eles buscarem referências na cultura pop da altura ou no formato para que tiver evoluído o telelixo. Passados alguns anos, eles saberão como agradecer.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=540
Warp
Os Boards of Canada ocupam um lugar quase mítico nas consciências de algumas pessoas cujas preocupações ultrapassam, em muitos quilómetros, o perímetro do seu bairro. Conhecemos a Escócia dos canais, dos kilts, do calão e do Loch Ness, mas também dos Mogwai e dos Belle & Sebastian – esqueçam os Franz Ferdinand! (Há por estas noites de Inverno um senhor que se senta num banco de jardim da Avenida da Liberdade e toca gaita de foles... Apetece perguntar se é escocês e se gosta do bife bem ou mal passado. Por detrás de cada rosto há uma história para contar e é sempre tentador interagir com a fauna humana que vive sob o manto cinzento da urbe.)
Não sabemos o que levou Michael Sandison e Marcus Eoin a juntarem-se e chamarem casa à costa norte da Escócia, uma franja de terra confinada entre o Mar do Norte e o Oceano Atlântico. Na verdade, não se sabe muito sobre os Boards of Canda (BoC) para além dos discos e das colaborações que vão mantendo no campo sideral das remisturas (confira-se, a propósito, o brilho sujo de “Dead Dogs Two”, original dos cLOUDDEAD, revisto por Michael e Marcus. That’s fucking beautiful, lad!). Há uma espécie de lei da rolha a vigorar, um black out que leva os admiradores e as línguas viperinas pelos caminhos da especulação lunática.
Passar sete anos sem editar mais do que três discos é também um bom reagente que ajuda na combustão de distorcidas visões da coisa. A proporção pode não ser comparável à taxa de reprodução de coelhos em idade adulta, mas se atentarmos no mercado extra-LP, temos uma boa meia-dúzia de estremosas edições – desde o inaugural Twoism a In a Beautiful Place out in the Country, o EP que esteve entre a edição de Music Has the Right to Children e Geogaddi (sem esquecer, claro, as inevitáveis Peel Sessions, de 1999).
Acontece que o duo escocês começou do nada absoluto, que é por onde começam, com honrosas excepções, as bandas que nunca poderão ser confundidas com uma sopa expresso. Era o ano de 1996 e os embrionários BoC gravavam canções a um ritmo masturbatório quando se associaram ao selo Skam, já na altura afamado pelo vínculo à electrónica e ao experimental. Seguiram-se edições menores mas os rabinhos já se voltavam para a Lua ao fazerem primeiras partes de Autechre e Plaid. Em 1998, Music Has the Right to Children veio encerrar a discussão sobre qual seria o álbum maior que conjugasse um hip-hop minimal com umas subtilezas downtempo, uns pozinhos de trip-hop e duas pitadas de dope. Tinha sido criado e estava ali. Não foi há muito tempo mas desde então tem havido cópias obtusas da fórmula testada. Mas falta-lhes a minúcia (oh, a minúcia!), o jeito para a produção, para o constante alijar de velas vergadas por um vento lunar.
O travo essencialmente ambient, com ocasionais beliscões menos hip que hop, de Music... e depois de Geogaddi faria talvez prever um disco de toca e foge, de revisão da matéria dada e salto no precipício que se abre quando se fala da música da contemporaneidade. Mas não, não é isso que ouvimos neste The Campfire Headphase. Aquilo se ouve é até um nadinha obsceno: ouvem-se, aqui e ali, guitarras desfraldadas, sem make-up tecnológico. Antes de gritarem “vendidos”, tentem encontrar um padrão no percurso dos BoC. Pois, é difícil. Agora tentem não manter a boca aberta enquanto ouvem “Chromakey Dreamcoat”, um registo próximo do chill-out tardio, já quando a manhã espreita, seguido de curtíssimos samples do que parece ser uma televisão, mais lá para o fim.
É a isto que deve soar a entrada no cérebro de Kevin Shields: uma base instrumental sublime e limpa e umas migalhas de voz manipulada para não se ficar a conhecer o emissor. E o rigor do sample, sempre oportuno, seja a chuva no início de “Satellite Anthem Icarus”, o choro de uma criança ou as programações de uma idade pré-cibernética em “’84 Pontiac Dream” e “Oscar See Through Red Eye”. ”Soft like there’s silk everywhere”. Isso. Ou música de elevador numa estação espacial, aumentada por um glitch soltinho como arroz malandro (especialmente em “Peacock Tail”). The Campfire Headphase é uma escultura de gelo ao detalhe com ligeira inflexão na procura da melodia. É que os BoC são tudo menos orelhudos e isso nem sequer interessa aqui.
Com óbvias diferenças (até, ou sobretudo, estilísticas), mas de certa forma nos BoC podemos ver os Kraftwerk da nova geração. Não deixem de mostrar este disco aos vossos filhos quando eles buscarem referências na cultura pop da altura ou no formato para que tiver evoluído o telelixo. Passados alguns anos, eles saberão como agradecer.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=540
11/11/2005
Yip-Yip - Pro-Twelve Thinker
Strictly Amateur Films
Rating: 4/10
Although this record definitely doesn’t knock me off my feet, it may be worth a listen by all those noise lovers out there. Formed by Brian Esser and Jason Temple in Longwood (a suburb of Orlando), Yip-Yip may be regarded as the new acquisition in the world of a certain art form that finds its G-spot near a multitude of keyboards and synthesizers.
First self-released as a CD-R in 2003 and limited to 300 copies, Pro-Twelve Thinker is now re-issued on Strictly Amateur Films. I don’t know about you, dear reader, but I could go to sleep without all these disassembled gushes of notes, spilled as if “harmony” and “rhythm” were not words of their dictionary. I wouldn’t go as far as stating that this music is structure-less - because it does have one - but theirs is rather difficult to ascertain.
Probably poured into a hiss-swamped tape recorder, “100 MPH Checker Champ” is a pictorial map of noise, pulling hard at the very fabric of the song (wait; let’s call it a ‘piece’ or whatever, not song). A handful of tracks later and there comes the obnoxious “High Heel to Mammal”, which sounds like a serrated knife chopping your arm off, with all its blips chiming in agonizing pain. Undoubtedly, the problem with this album is that it barely gives itself oxygen, placing a turbine of resounding paraphernalia at the helm most of the time.
Constant reruns of Pro-Twelve Thinker induce terrible headaches and a sense of animosity toward the outside world; a regular human being needs some puffs of fresh air to breathe. I can only hope that one day this noise-related scene will become out of vogue, and out of the renewed ghetto will emerge a refilled set of bands, willing to please themselves as well all music enthusiasts. Until then, I shall put this out to temporary pasture, and that’s the best I can do.
But find out for yourself and your tolerances: you may find this as remarkable a statement as Marvin Gaye’s languid howl on “Sexual Healing”. That’s the beauty of music, and certainly that of noise and whatnot. That being said, the naïve, childish drawings inside its liner notes are inspired.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=14328884994371dfa4e8dab
Rating: 4/10
Although this record definitely doesn’t knock me off my feet, it may be worth a listen by all those noise lovers out there. Formed by Brian Esser and Jason Temple in Longwood (a suburb of Orlando), Yip-Yip may be regarded as the new acquisition in the world of a certain art form that finds its G-spot near a multitude of keyboards and synthesizers.
First self-released as a CD-R in 2003 and limited to 300 copies, Pro-Twelve Thinker is now re-issued on Strictly Amateur Films. I don’t know about you, dear reader, but I could go to sleep without all these disassembled gushes of notes, spilled as if “harmony” and “rhythm” were not words of their dictionary. I wouldn’t go as far as stating that this music is structure-less - because it does have one - but theirs is rather difficult to ascertain.
Probably poured into a hiss-swamped tape recorder, “100 MPH Checker Champ” is a pictorial map of noise, pulling hard at the very fabric of the song (wait; let’s call it a ‘piece’ or whatever, not song). A handful of tracks later and there comes the obnoxious “High Heel to Mammal”, which sounds like a serrated knife chopping your arm off, with all its blips chiming in agonizing pain. Undoubtedly, the problem with this album is that it barely gives itself oxygen, placing a turbine of resounding paraphernalia at the helm most of the time.
Constant reruns of Pro-Twelve Thinker induce terrible headaches and a sense of animosity toward the outside world; a regular human being needs some puffs of fresh air to breathe. I can only hope that one day this noise-related scene will become out of vogue, and out of the renewed ghetto will emerge a refilled set of bands, willing to please themselves as well all music enthusiasts. Until then, I shall put this out to temporary pasture, and that’s the best I can do.
But find out for yourself and your tolerances: you may find this as remarkable a statement as Marvin Gaye’s languid howl on “Sexual Healing”. That’s the beauty of music, and certainly that of noise and whatnot. That being said, the naïve, childish drawings inside its liner notes are inspired.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=14328884994371dfa4e8dab
08/11/2005
Daedelus - Exquisite Corpse
2005
Mush
Tempo de levar a castanha ao braseiro que o Outono já vai alto. Por cá, está encontrado o disco bricolage do ano. De martelo impressionista em punho, Daedelus, natural de Santa Monica (EUA), parte pedra ao quarto álbum e faz-se acompanhar de uma equipa de emcees que puxam o lustro a um hip-hop que nasceu torto e não é certamente desta que se endireita. Exquisite Corpse é um esqueleto no armário que, apesar da aparência baça e fétida, conserva os olhos esbugalhados da carne que um dia lhe deu vida. Ou seja: é hip-hop de divã, em permanente tentativa de descoberta das linhas com que se cosem as entranhas.
A colaboração com MF Doom, o Homem da Máscara de Ferro, – o tema “Impending Doom” – parece um comercial ou uma sitcom fatela dos anos 20 ou 30 do audiovisual norte-americano e acaba a renegar a tradição mastigada do transformismo desenxabido em que o hip-hop se perdeu quando foi às putas do mercantilismo e se deixou ficar no bordel. Num trabalho em que só um terço das canções não tem convidado, a celebração acontece naturalmente num rés-do-chão esquerdo de um prédio dos subúrbios, quando as rádios especializadas só dão importância ao grime que vem de Londres.
“Just Briefly” não podia ser mais desconstrucionista no seu intento de andar às fisgadas aos pardalecos parolos e parvos (olhem a métrica, miúdos!) que andam a enganar os outros com deboches sensaborões. Nesse sentido, o número soa a DJ Shadow e coloca-se ao lado dos servidores da causa romântica do traquejo rap que anda para a frente, rap de rapina e não de rapsódia manhosa que mete gajas seminuas e álcool mais do que a conta.
“The Crippled Hand” parece assombração que só um copy/paste permissivo deixa nascer: carregadinha de swing (“lots, lots of swing”, para a comunidade jazz), esta faixa é o abraço da paz. Ou não tivesse já Mike Ladd, que assina um dos dois “Welcome Home” do disco, provado que isso era possível (e recomendável) no Negrophilia deste ano. As primeiras boas-vindas a casa são dadas por Scott Herren sob o cognome Prefuse 73 Danse Macabre, produção anti-lounge, nublada, difícil, bonita, que só funciona na região demarcada onde coabitam ele mais uma meia dúzia de iluminados, como Luke Vibert ou mesmo Boards of Canada.
Depois do reencontro com velhos amigos dos headphones, acontece o vislumbre do pânico. Enfim, no melhor pano cai a nódoa. Os TTC são franceses e fazem de “Cadavre Exquis” uma latinada que provoca indigestão. Só a piada de ouvir rappar na língua de Edith Piaf salva a coisa. A fechar, “Thanatopsis” entra em fulgurante contra-ciclo, baralhando a lógica dos temas anteriores e inscrevendo os que chegaram até aqui num tribalismo emancipado e emancipador.
Exquisite Corpse é uma Pompeia prestes a sucumbir à força dos vulcões da crítica mais conservadora. Pode até ser olhado como o pior pesadelo do escriba acometido pela preguiça mais castradora mas, para os admiradores, será sempre um soufflé de uma natureza rítmica diversa e desafiante. O mundo está a precisar de discos assim.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=528
Mush
Tempo de levar a castanha ao braseiro que o Outono já vai alto. Por cá, está encontrado o disco bricolage do ano. De martelo impressionista em punho, Daedelus, natural de Santa Monica (EUA), parte pedra ao quarto álbum e faz-se acompanhar de uma equipa de emcees que puxam o lustro a um hip-hop que nasceu torto e não é certamente desta que se endireita. Exquisite Corpse é um esqueleto no armário que, apesar da aparência baça e fétida, conserva os olhos esbugalhados da carne que um dia lhe deu vida. Ou seja: é hip-hop de divã, em permanente tentativa de descoberta das linhas com que se cosem as entranhas.
A colaboração com MF Doom, o Homem da Máscara de Ferro, – o tema “Impending Doom” – parece um comercial ou uma sitcom fatela dos anos 20 ou 30 do audiovisual norte-americano e acaba a renegar a tradição mastigada do transformismo desenxabido em que o hip-hop se perdeu quando foi às putas do mercantilismo e se deixou ficar no bordel. Num trabalho em que só um terço das canções não tem convidado, a celebração acontece naturalmente num rés-do-chão esquerdo de um prédio dos subúrbios, quando as rádios especializadas só dão importância ao grime que vem de Londres.
“Just Briefly” não podia ser mais desconstrucionista no seu intento de andar às fisgadas aos pardalecos parolos e parvos (olhem a métrica, miúdos!) que andam a enganar os outros com deboches sensaborões. Nesse sentido, o número soa a DJ Shadow e coloca-se ao lado dos servidores da causa romântica do traquejo rap que anda para a frente, rap de rapina e não de rapsódia manhosa que mete gajas seminuas e álcool mais do que a conta.
“The Crippled Hand” parece assombração que só um copy/paste permissivo deixa nascer: carregadinha de swing (“lots, lots of swing”, para a comunidade jazz), esta faixa é o abraço da paz. Ou não tivesse já Mike Ladd, que assina um dos dois “Welcome Home” do disco, provado que isso era possível (e recomendável) no Negrophilia deste ano. As primeiras boas-vindas a casa são dadas por Scott Herren sob o cognome Prefuse 73 Danse Macabre, produção anti-lounge, nublada, difícil, bonita, que só funciona na região demarcada onde coabitam ele mais uma meia dúzia de iluminados, como Luke Vibert ou mesmo Boards of Canada.
Depois do reencontro com velhos amigos dos headphones, acontece o vislumbre do pânico. Enfim, no melhor pano cai a nódoa. Os TTC são franceses e fazem de “Cadavre Exquis” uma latinada que provoca indigestão. Só a piada de ouvir rappar na língua de Edith Piaf salva a coisa. A fechar, “Thanatopsis” entra em fulgurante contra-ciclo, baralhando a lógica dos temas anteriores e inscrevendo os que chegaram até aqui num tribalismo emancipado e emancipador.
Exquisite Corpse é uma Pompeia prestes a sucumbir à força dos vulcões da crítica mais conservadora. Pode até ser olhado como o pior pesadelo do escriba acometido pela preguiça mais castradora mas, para os admiradores, será sempre um soufflé de uma natureza rítmica diversa e desafiante. O mundo está a precisar de discos assim.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=528
28/10/2005
Zu - The Way of the Animal Powers
Xeng Records
Rating: 7.5/10
Joseph Campbell was an American writer and orator well-known for his studies on comparative mythology. The title for Zu’s (a jazz/industrial trio hailing from Rome) latest record is taken from 1983’s The Way of the Animal Powers, a fine introduction to world mythology. Since there’s no greater mythology than that of rock music, an instant connection is made and appreciated - so let’s move on with no further delay.
Simply put, this 25-minute record shows the Italian ensemble at their most mature, and it follows Radiale - a much-acclaimed collaborative effort with Spaceways Inc. - released last year on Atavistic. Despite its title, we believe no animals were harmed in the making of these nine dysfunctional, droid-made, jazzy clusters. In order to augment their eccentric orbits and spit out all the insurrect sounds they live up to, Zu invited Fred Lonberg-Holm, a renowned cellist that has worked, among others, with Morton Feldman and Anthony Braxton.
But what really makes Zu break from the norm of contemporary jazz-core is its readiness to wrangle around a song, articulate it with strings at fucked-up angles and go beyond the symplistic take on chunk-based music. For instance, Luca Tomasso’s sax is not in the slightest reminiscent of the apprentice’s scholastic mannerisms, but more in tune with Sweden’s Mats Gustafsson (with whom Zu will be releasing How to Raise an Ox sometime next month).
If the opening track, “Tom Araya Is Our Elvis,” makes you wonder which direction Zu is heading to with this album - from the sample-endorsed “Anatomy of a Lost Battle” on - the band scotches any fear that their sound would be less bleak and easier than usual. You may argue that simplicity is what it takes to hold everyone’s heart, but simplicity is rather boring sometimes. Aging a song is like nurturing and looking after a baby and it takes time.
Jacopo, on percussion, also does the vocal part on the last piece, “Every Seagull Knows”, a contemplative drum-based invocation of all things supernatural. It features a crying baby and wards off the spread of tainted, diehard stiffness that popped up from the rest of the album. Massimo’s bass lines are a case study in unpatterned, sinister ventures, hanging clouds of dust and heavy rain here and there.
Before that, the circular, lounge-driven number that is “The Witch Herbalist of the Remote Town” on its own makes the album a valuable purchase, but in the case that you like going all quartz-like, detailing each parameter in music, the following track should be your favorite. Either way, Zu is one of the missing links between Evan Parker’s spiraling tones and John Zorn’s aggravated subtelities. Go and grab it now!
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1034951694435f5cbe2e640
Rating: 7.5/10
Joseph Campbell was an American writer and orator well-known for his studies on comparative mythology. The title for Zu’s (a jazz/industrial trio hailing from Rome) latest record is taken from 1983’s The Way of the Animal Powers, a fine introduction to world mythology. Since there’s no greater mythology than that of rock music, an instant connection is made and appreciated - so let’s move on with no further delay.
Simply put, this 25-minute record shows the Italian ensemble at their most mature, and it follows Radiale - a much-acclaimed collaborative effort with Spaceways Inc. - released last year on Atavistic. Despite its title, we believe no animals were harmed in the making of these nine dysfunctional, droid-made, jazzy clusters. In order to augment their eccentric orbits and spit out all the insurrect sounds they live up to, Zu invited Fred Lonberg-Holm, a renowned cellist that has worked, among others, with Morton Feldman and Anthony Braxton.
But what really makes Zu break from the norm of contemporary jazz-core is its readiness to wrangle around a song, articulate it with strings at fucked-up angles and go beyond the symplistic take on chunk-based music. For instance, Luca Tomasso’s sax is not in the slightest reminiscent of the apprentice’s scholastic mannerisms, but more in tune with Sweden’s Mats Gustafsson (with whom Zu will be releasing How to Raise an Ox sometime next month).
If the opening track, “Tom Araya Is Our Elvis,” makes you wonder which direction Zu is heading to with this album - from the sample-endorsed “Anatomy of a Lost Battle” on - the band scotches any fear that their sound would be less bleak and easier than usual. You may argue that simplicity is what it takes to hold everyone’s heart, but simplicity is rather boring sometimes. Aging a song is like nurturing and looking after a baby and it takes time.
Jacopo, on percussion, also does the vocal part on the last piece, “Every Seagull Knows”, a contemplative drum-based invocation of all things supernatural. It features a crying baby and wards off the spread of tainted, diehard stiffness that popped up from the rest of the album. Massimo’s bass lines are a case study in unpatterned, sinister ventures, hanging clouds of dust and heavy rain here and there.
Before that, the circular, lounge-driven number that is “The Witch Herbalist of the Remote Town” on its own makes the album a valuable purchase, but in the case that you like going all quartz-like, detailing each parameter in music, the following track should be your favorite. Either way, Zu is one of the missing links between Evan Parker’s spiraling tones and John Zorn’s aggravated subtelities. Go and grab it now!
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1034951694435f5cbe2e640
25/10/2005
S&N - Homages EP
2005
Bully Records
Quando o facto de um rapper tão desprezível quanto 50 Cent encher o Pavilhão Atlântico serve para desembainhar considerações saloias sobre o público que vai lá vê-lo, apetece enterrar ainda mais a cabeça na areia. E continuar no processo de deslumbramento com coisas como Non-Prophets, David Axelrod ou Diplo. Que se lixe a Bíblia dos costumezinhos toscos daquela gente que descobre o hip-hop nos tiros que um rufia leva na cabeça ou abaixo da linha do abdómen e pensa que descobriu a verdade, a essenciazinha dessa coisa esquisita de metralhar rimas e preparar um bom beat.
No caso do tipo dos grandes concertos, as rimas não podiam ser mais básicas, o flow mais rasteiro nem a passividade / agressividade mais ensaiada. Alguém que dificilmente teve que lidar com a falta de saneamento básico ou água potável lá no bairro dele. Que se mete em barafunda e tiroteios porque quer ou os provoca. Não há paciência para miúdos mimados, com os peitos de pombo inchados pelos dólares que conseguem juntar, sem a mínima noção do que é pôr um disco no mercado e tentar chegar ao coração de alguém.
Só quem andou com a cabeça perdida pelo gangster dos tiros deixou passar o disco do ano passado de Sixtoo, um rapper canadiano que sabe misturar bem as linguagens da música contemporânea. Chewing on Glass & Other Miracle Cures era um assombro. A colaboração deste início de Outono com Norsola no EP Homages leva um pouco mais longe a sua vontade de romper as membranas que só existem na música, porque as pessoas são estúpidas como amibas dormentes.
Enfim, faltam as apresentações: Sixtoo é quem já se sabe, canadiano, produtor afamado na divisão do “toma e volta a baralhar”, com uma perninha no turntablism soturno e outra num break poderosíssimo em cuja bolsa criativa cabem músicos como Damo Suzuki (dos Can), Thierry Amar e Norsola Johnson; esta Norsola é a violoncelista dos Godspeed You! Black Emperor, que já tinha entrado no disco anterior e agora repete o feito neste soberbo sete polegadas.
Sixtoo assume a parte da electrólise, fazendo aquilo que tem vindo a fazer desde que aprendeu a girar discos: piruetas rítmicas, salpicadas por uma sensibilidade cinemática que faz de câmara de eco aos próprios sons que vai produzindo, reverberando-os, samplando-os e deixando o tapete sonoro cheio de franjas inacabadas e irreverentes. Norsola é a metade orgânica do duo, toca violoncelo, baixo e outra instrumentália não especificada. A soma das partes é uma coisa que só ouvida: um borrão na pintura obsoleta da música actual, um soco desferido no estômago dos maus alunos do hip-hop, o que quiserem.
Quatro temas chegam para estes arquitectos paisagistas mostrarem onde pára o downbeat quando leva um banho de instrumentos orgânicos e os cristais ficam à espreita. A imagem do arquitecto que tenta dar novas soluções ao espaço social / individual não é nova e decorre até, num desajeitado acto falhado, de um cruzamento de figuras mentais sugeridas quer pela capa de Chewing on Glass..., quer por “Old Days Architecture”, o oitavo tema do disco do ano passado – o primeiro que Sixtoo gravou para a Ninja Tune. A propósito, este Homages vem já pela Bully Records, uma casa que tem servido de morada a gente fresca como Mat Young, P Love ou Mat Kelly.
O disco evolui por atmosferas manifestamente down-tempo, aqui e ali com apontamentos de percussão (alguma percebe-se viva, outra sabe-se gravada). Ainda: ganchos rítmicos de oscilação variável e linhas retorcidas. Voos nocturnos próprios para o descompensar da actividade nas horas mais tardias. Planos rasantes de brinde entre discursos do gira-discos e sons colhidos nas sementeiras. A grafonola da capa remete para uma toada ligeiramente retro do animal criado. Ora, se for para ter alguém como 50 Cent a fazer a festa, até é bom que não haja circuito de concertos de hip-hop em Portugal. Pelo menos, não se lixa a cabeça dos putos com uma fabricação mercantil sem brilho nenhum. Homages, pelo contrário, é uma estupefacção.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=522
Bully Records
Quando o facto de um rapper tão desprezível quanto 50 Cent encher o Pavilhão Atlântico serve para desembainhar considerações saloias sobre o público que vai lá vê-lo, apetece enterrar ainda mais a cabeça na areia. E continuar no processo de deslumbramento com coisas como Non-Prophets, David Axelrod ou Diplo. Que se lixe a Bíblia dos costumezinhos toscos daquela gente que descobre o hip-hop nos tiros que um rufia leva na cabeça ou abaixo da linha do abdómen e pensa que descobriu a verdade, a essenciazinha dessa coisa esquisita de metralhar rimas e preparar um bom beat.
No caso do tipo dos grandes concertos, as rimas não podiam ser mais básicas, o flow mais rasteiro nem a passividade / agressividade mais ensaiada. Alguém que dificilmente teve que lidar com a falta de saneamento básico ou água potável lá no bairro dele. Que se mete em barafunda e tiroteios porque quer ou os provoca. Não há paciência para miúdos mimados, com os peitos de pombo inchados pelos dólares que conseguem juntar, sem a mínima noção do que é pôr um disco no mercado e tentar chegar ao coração de alguém.
Só quem andou com a cabeça perdida pelo gangster dos tiros deixou passar o disco do ano passado de Sixtoo, um rapper canadiano que sabe misturar bem as linguagens da música contemporânea. Chewing on Glass & Other Miracle Cures era um assombro. A colaboração deste início de Outono com Norsola no EP Homages leva um pouco mais longe a sua vontade de romper as membranas que só existem na música, porque as pessoas são estúpidas como amibas dormentes.
Enfim, faltam as apresentações: Sixtoo é quem já se sabe, canadiano, produtor afamado na divisão do “toma e volta a baralhar”, com uma perninha no turntablism soturno e outra num break poderosíssimo em cuja bolsa criativa cabem músicos como Damo Suzuki (dos Can), Thierry Amar e Norsola Johnson; esta Norsola é a violoncelista dos Godspeed You! Black Emperor, que já tinha entrado no disco anterior e agora repete o feito neste soberbo sete polegadas.
Sixtoo assume a parte da electrólise, fazendo aquilo que tem vindo a fazer desde que aprendeu a girar discos: piruetas rítmicas, salpicadas por uma sensibilidade cinemática que faz de câmara de eco aos próprios sons que vai produzindo, reverberando-os, samplando-os e deixando o tapete sonoro cheio de franjas inacabadas e irreverentes. Norsola é a metade orgânica do duo, toca violoncelo, baixo e outra instrumentália não especificada. A soma das partes é uma coisa que só ouvida: um borrão na pintura obsoleta da música actual, um soco desferido no estômago dos maus alunos do hip-hop, o que quiserem.
Quatro temas chegam para estes arquitectos paisagistas mostrarem onde pára o downbeat quando leva um banho de instrumentos orgânicos e os cristais ficam à espreita. A imagem do arquitecto que tenta dar novas soluções ao espaço social / individual não é nova e decorre até, num desajeitado acto falhado, de um cruzamento de figuras mentais sugeridas quer pela capa de Chewing on Glass..., quer por “Old Days Architecture”, o oitavo tema do disco do ano passado – o primeiro que Sixtoo gravou para a Ninja Tune. A propósito, este Homages vem já pela Bully Records, uma casa que tem servido de morada a gente fresca como Mat Young, P Love ou Mat Kelly.
O disco evolui por atmosferas manifestamente down-tempo, aqui e ali com apontamentos de percussão (alguma percebe-se viva, outra sabe-se gravada). Ainda: ganchos rítmicos de oscilação variável e linhas retorcidas. Voos nocturnos próprios para o descompensar da actividade nas horas mais tardias. Planos rasantes de brinde entre discursos do gira-discos e sons colhidos nas sementeiras. A grafonola da capa remete para uma toada ligeiramente retro do animal criado. Ora, se for para ter alguém como 50 Cent a fazer a festa, até é bom que não haja circuito de concertos de hip-hop em Portugal. Pelo menos, não se lixa a cabeça dos putos com uma fabricação mercantil sem brilho nenhum. Homages, pelo contrário, é uma estupefacção.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=522
24/10/2005
Growing & Mark Evan Burden - Self Titled
Xeng Records
Rating: 7/10
The self-titled collaborative effort between Growing and pianist Mark Evan Burden is a split CD based on two compositions that can be heard separately, but work much better when digested back to back.
Those familiar with Growing’s previous releases - notably the superlative album from 2003, The Sky’s Run Into the Sea - will not be jaw-droppingly surprised with this 19-minute “Firmament,” a prelude to an underbelly of drone-y splendor. The snake-wrangling, incantatory ambient that the ensemble produces cuts directly into Portland-based Burden’s “10 24 02,” a busy, ascending and descending musical movement.
“Firmament” is like a cloudy aural painting, drained through its grey corners that gently collapse into themselves. Growing’s half of the disc is a peek into the mind itself as well as those protein complexes capable of pumping new blood into dead veins. The pianist’s piece is a slippery glissando wherein notes emerge like a phoenix after being suppressed to near silence.
In the middle of this slow chaos, there are little pockets of warmth that, in Mark Evan Burden’s case, evolve into drops of convalescent sound fragments. Then again, how one could allow an experimental, avant-garde ensemble - sometimes reminiscent of Brian Eno - to mess around with a modern pianist is something most will never comprehend. But if listening closely, it is easier to realize how these two go hand in glove without interfering with each other’s work.
When I had the chance to talk to Joe DeNardo circa The Sky’s Run Into the Sea, I asked how he felt like when everyone wrote about Growing’s music being so womb-like. He dismissed those comments simply by saying that he didn’t know how a womb sounds like; my opinion is that we should really ask a newborn for an answer because I think he or she would relate to this record. Maybe it’s just me, but these nebulous sounds must definitely be the kind a newborn hears just before the water breaks.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1291377869435a7e9a9261a
Rating: 7/10
The self-titled collaborative effort between Growing and pianist Mark Evan Burden is a split CD based on two compositions that can be heard separately, but work much better when digested back to back.
Those familiar with Growing’s previous releases - notably the superlative album from 2003, The Sky’s Run Into the Sea - will not be jaw-droppingly surprised with this 19-minute “Firmament,” a prelude to an underbelly of drone-y splendor. The snake-wrangling, incantatory ambient that the ensemble produces cuts directly into Portland-based Burden’s “10 24 02,” a busy, ascending and descending musical movement.
“Firmament” is like a cloudy aural painting, drained through its grey corners that gently collapse into themselves. Growing’s half of the disc is a peek into the mind itself as well as those protein complexes capable of pumping new blood into dead veins. The pianist’s piece is a slippery glissando wherein notes emerge like a phoenix after being suppressed to near silence.
In the middle of this slow chaos, there are little pockets of warmth that, in Mark Evan Burden’s case, evolve into drops of convalescent sound fragments. Then again, how one could allow an experimental, avant-garde ensemble - sometimes reminiscent of Brian Eno - to mess around with a modern pianist is something most will never comprehend. But if listening closely, it is easier to realize how these two go hand in glove without interfering with each other’s work.
When I had the chance to talk to Joe DeNardo circa The Sky’s Run Into the Sea, I asked how he felt like when everyone wrote about Growing’s music being so womb-like. He dismissed those comments simply by saying that he didn’t know how a womb sounds like; my opinion is that we should really ask a newborn for an answer because I think he or she would relate to this record. Maybe it’s just me, but these nebulous sounds must definitely be the kind a newborn hears just before the water breaks.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1291377869435a7e9a9261a
19/10/2005
The Ebb and Flow - Time to Echolocate
Three Ring Records
Rating: 8/10
The Ebb and Flow is a retro futuristic trio that glues together the geniuses of a Russian Jew, an Iranian native and a Midwestern girl. On this record they sound like a Siamese experiment that caught everyone in the lab off guard. Their aim consists in recycling good old synthesizers with upfront electronic twists and moves, delivering a sweet aroma that blinks an eye to the swell sound of the 80s while still harassing last week’s disco-goers.
Take the inaugural, two-part joint “Sonorous”, a polyphonic spree that will leave you defenceless and clueless for the rest of the album. The group proves that the Time to Echolocate is the exactly when organic, analog-driven melodies clash into the electronic, contemplative and frequently overrated blips of today. “Body and Soul” is pretty revisionist in this sense, mixing Casio-like reminiscences with jarring comments about being “time to pay the bill.” The following track - this time a female-vocalized number entitled “Framer Framed” - is dissonant and rebellious, finding its branch on the family tree by way of acts like !!! and Large Number.
Sara Cassetti is the US-based one-third of the group and she plays the drums; Sam Tsitrin and Roshy Kheshti are, as the press release puts it, “two illegal immigrants,” who alternate the vocal parts - the latter also plays the Moog synthesizers, the Farfisa organ, melodica and vibes, whilst the former gives birth to the guitar and bass lines. This ethnic mash-up is the fertile soil wherein fine seeds are manipulated and heart-shaped orchids blossom.
The Christmas-scented, baritone saxophone-fuelled “Interlude” serves as the perfect appetizer for the Tsitrin-penned, mellow “See You in the Fjords”, as accompanied by a trumpet courtesy of Jeff Jacobs. The dialogue with cross-faded genres does not end here: “Country Verses” attempts to capitalize on the teachings of Willie Nelson with a taste of counterfeit machinery; it does put a smile upon your face, but it sometimes feels like the country legend cheated on an IQ test before conquering Nashville.
To set the record straight, The Ebb and Flow prepare a farewell, multi-layered track, “Sweet Southern Melody”, where the keyboards are infinitely warmer and more familiar, and augmented by the voice of the late (and very great) Bob Moog. His analog philosophy is sampled here to a great result, bridging the gap between the manic 80s and today.
If only Human League managed to break the time spell, they would sound pretty much like this - but never before bathing in the newest technological fluids, of course - and this should be the best they would ever sound. So, if you still go weak at the knees for scholastic, mathematical disco sound, Time to Echolocate should be a fine treat for you. Just put on your Sunday shoes and dance to this cerebral, electronic ballet. It is defiintely better than any synth-pop accelerated version of Tchaikovsky’s The Nutcracker, I can promise you that.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=21078242454350f71f4edd0
Rating: 8/10
The Ebb and Flow is a retro futuristic trio that glues together the geniuses of a Russian Jew, an Iranian native and a Midwestern girl. On this record they sound like a Siamese experiment that caught everyone in the lab off guard. Their aim consists in recycling good old synthesizers with upfront electronic twists and moves, delivering a sweet aroma that blinks an eye to the swell sound of the 80s while still harassing last week’s disco-goers.
Take the inaugural, two-part joint “Sonorous”, a polyphonic spree that will leave you defenceless and clueless for the rest of the album. The group proves that the Time to Echolocate is the exactly when organic, analog-driven melodies clash into the electronic, contemplative and frequently overrated blips of today. “Body and Soul” is pretty revisionist in this sense, mixing Casio-like reminiscences with jarring comments about being “time to pay the bill.” The following track - this time a female-vocalized number entitled “Framer Framed” - is dissonant and rebellious, finding its branch on the family tree by way of acts like !!! and Large Number.
Sara Cassetti is the US-based one-third of the group and she plays the drums; Sam Tsitrin and Roshy Kheshti are, as the press release puts it, “two illegal immigrants,” who alternate the vocal parts - the latter also plays the Moog synthesizers, the Farfisa organ, melodica and vibes, whilst the former gives birth to the guitar and bass lines. This ethnic mash-up is the fertile soil wherein fine seeds are manipulated and heart-shaped orchids blossom.
The Christmas-scented, baritone saxophone-fuelled “Interlude” serves as the perfect appetizer for the Tsitrin-penned, mellow “See You in the Fjords”, as accompanied by a trumpet courtesy of Jeff Jacobs. The dialogue with cross-faded genres does not end here: “Country Verses” attempts to capitalize on the teachings of Willie Nelson with a taste of counterfeit machinery; it does put a smile upon your face, but it sometimes feels like the country legend cheated on an IQ test before conquering Nashville.
To set the record straight, The Ebb and Flow prepare a farewell, multi-layered track, “Sweet Southern Melody”, where the keyboards are infinitely warmer and more familiar, and augmented by the voice of the late (and very great) Bob Moog. His analog philosophy is sampled here to a great result, bridging the gap between the manic 80s and today.
If only Human League managed to break the time spell, they would sound pretty much like this - but never before bathing in the newest technological fluids, of course - and this should be the best they would ever sound. So, if you still go weak at the knees for scholastic, mathematical disco sound, Time to Echolocate should be a fine treat for you. Just put on your Sunday shoes and dance to this cerebral, electronic ballet. It is defiintely better than any synth-pop accelerated version of Tchaikovsky’s The Nutcracker, I can promise you that.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=21078242454350f71f4edd0
26/09/2005
Geoff Farina, Luther Gray, Dan Littleton - New Salt
Xeng
Rating: 9/10
Geoff Farina is one hell of a guy. As the front man of the innovative Karate, he has deployed a battery of guitar techniques and instrumentation for almost a decade and a half. Dissecting music as if profanating corpses was allowed, the trio - with Jeffrey Goddard on bass and Gavin McCarthy on drums - explores the listener’s inner sanctum by stealing his or her virginity from minute one. Nevertheless, Karate’s music represents a huge challenge to the incurious, casual enthusiast. In fact, pummelling off-centre chords served with loose beats that blur like an overreacting spermatozoid is not an easy meal to digest.
Like I said, Geoff Farina is one hell of a guy. I don’t know him personally, but I wish I did. His music, along with the other Karate folks or any of his multiple collaborations, has soul-stealing properties, and succeeds in hybridising the post-everything tactics of all stripes. One year after forming Karate (1992) - whose last year’s Pockets was dubbed an “indie gem” by no less than CNN - he co-founded the folksy Secret Stars with Jodi Buonanno. Since then, he has been busy working with an array of musicians, and in 1998 he finally dropped his solo debut, the cohesive Usonian Dream Sequence.
This New Salt record is the first output coming from Geoff Farina as accompanied by guitarist Dan Littleton (known for his album with Tara Jane O’Neil) and the jazz drummer Luther Gray. It’s a 7-track cerebral journey which purposely sutures your brain while extracting your attention from the outside world. Its ill-tuned guitars insist on sharp, contemplative spasms while Gray’s beats trap themselves in locked, panoramic grooves.
What makes this new collective cuts above the generic, post-90s space rock norm is its ability to sound fresh, anaemic and simultaneously powerful within the incidental, microscopic details it releases. The final track, “Pouring Water on Stone,” proves just that; it instinctively seeks a direction but, in the end, is more than willing to resignedly pack its instruments and leave the room to come again tomorrow. Considering that the idea of New Salt came after they sonically illustrated silent movies live - notably Beckett’s and Ray’s classics - suddenly everything makes sense.
But the languorous path was drafted from track one; the 3-minute “Harmonia” would possibly work better as an interlude than as an opener, particularly because it then segues to the epic title track. “Song for Che” is as political as Godspeed You! Black Emperor dared to be on Yanqui U.X.O., that is to say, barely. This hasn’t been a poor year in analytical music after all; if you enjoyed David Pajo’s solo debut, you should love this. Just try and fill it with the words you like and it will soon become the best soundtrack to over-caffeinated mornings, guaranteed.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=146779095043373619537c0
Rating: 9/10
Geoff Farina is one hell of a guy. As the front man of the innovative Karate, he has deployed a battery of guitar techniques and instrumentation for almost a decade and a half. Dissecting music as if profanating corpses was allowed, the trio - with Jeffrey Goddard on bass and Gavin McCarthy on drums - explores the listener’s inner sanctum by stealing his or her virginity from minute one. Nevertheless, Karate’s music represents a huge challenge to the incurious, casual enthusiast. In fact, pummelling off-centre chords served with loose beats that blur like an overreacting spermatozoid is not an easy meal to digest.
Like I said, Geoff Farina is one hell of a guy. I don’t know him personally, but I wish I did. His music, along with the other Karate folks or any of his multiple collaborations, has soul-stealing properties, and succeeds in hybridising the post-everything tactics of all stripes. One year after forming Karate (1992) - whose last year’s Pockets was dubbed an “indie gem” by no less than CNN - he co-founded the folksy Secret Stars with Jodi Buonanno. Since then, he has been busy working with an array of musicians, and in 1998 he finally dropped his solo debut, the cohesive Usonian Dream Sequence.
This New Salt record is the first output coming from Geoff Farina as accompanied by guitarist Dan Littleton (known for his album with Tara Jane O’Neil) and the jazz drummer Luther Gray. It’s a 7-track cerebral journey which purposely sutures your brain while extracting your attention from the outside world. Its ill-tuned guitars insist on sharp, contemplative spasms while Gray’s beats trap themselves in locked, panoramic grooves.
What makes this new collective cuts above the generic, post-90s space rock norm is its ability to sound fresh, anaemic and simultaneously powerful within the incidental, microscopic details it releases. The final track, “Pouring Water on Stone,” proves just that; it instinctively seeks a direction but, in the end, is more than willing to resignedly pack its instruments and leave the room to come again tomorrow. Considering that the idea of New Salt came after they sonically illustrated silent movies live - notably Beckett’s and Ray’s classics - suddenly everything makes sense.
But the languorous path was drafted from track one; the 3-minute “Harmonia” would possibly work better as an interlude than as an opener, particularly because it then segues to the epic title track. “Song for Che” is as political as Godspeed You! Black Emperor dared to be on Yanqui U.X.O., that is to say, barely. This hasn’t been a poor year in analytical music after all; if you enjoyed David Pajo’s solo debut, you should love this. Just try and fill it with the words you like and it will soon become the best soundtrack to over-caffeinated mornings, guaranteed.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=146779095043373619537c0
09/09/2005
Portable - Version
2005
~scape/Flur
Este último fim-de-semana foi aquele em que os peregrinos vermelhos entopem os transportes da margem sul do Tejo. A Quinta da Atalaia, pólo de oração dos comunistas no último mês do tempo quente, recebeu-os num contexto especial. A Festa do Avante deste ano aconteceu depois da debochada popular e mediática que foi levar o líder espiritual do clã a enterrar. O partido dos reformados e das gentes reaccionárias todos os anos prepara um acampamento de jovens e tenta atirar areia para os olhos de muita gente. No fundo, é tudo malta inofensiva cujo único crime é trajar uma t-shirt do Che, mas também não se pode assumir que toda a gente conhece a História. Ao mesmo tempo, mas na parte norte do rio, acontecia um festival de reggae e derivados na Ericeira. Estes, sabe-se, estão lá pela música e têm a vantagem de não venderem a alma a Estaline.
As tribos existem, embora sempre vá havendo quem tenha a mente suficientemente aberta para picar mais do que um género, e rivalizam entre si. Tudo isto é saudável, tudo isto acontece desde que há jovens a habitar a superfície do planeta. Mas desconhece-se música tão apátrida como o dub. A resistência que a maior parte das pessoas tem quanto ao dub só o torna mais querido dentro dos círculos em que ele se mexe. A ~scape é morada de muita coisa que está para lá do lancil da magra via mediática. Já editou Deadbeat, Triosk meets Jan Jelinek, Pole ou colaborações ovni tipo Burnt Friedman e os Nu Dub Players, só para citar alguns. E agora edita Portable, ou antes Alan Abrahams, um tipo que soube crescer na África do Sul do pós-apartheid e que deu um salto a Londres para aí se estabelecer enquanto músico. Version é um disco do mundo, antes de ser qualquer outra coisa. Cruza idiomas tão aparentemente inconciliáveis que, só por faixas como “Thought in Action”, merecia ser conhecido por uma rua inteira. Os únicos temas em que ele mostra as raízes descarnadinhas da sua música encontram-se, logo a seguir, em “Temporal Distortion” e em “Tempura”, peças desavergonhadas que buscam inspiração em samples permissivos.
Mas, voltando atrás, ainda à boleia de “Thought in Action”, temos um pedaço de infusão africana. Uma espécie de remake pós-(inserir termo aqui) das partituras sonoras do King Kong, a clássica obra cinematográfica da dupla Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack. Aliás, não se percebe por que raio os gritos da actriz sempre que vê o gorila não foram samplados para aqui. Avante, camaradas, que há ainda “Typhoon”, um chamamento dos deuses, uma centopeia rítmica que induz uma preguiça tal, só disfarçada pelos tambores e pela voz que se mete no meio.
As miudezas electrónicas não podiam faltar e ocupam sobretudo a primeira metade do disco. Percebe-se um house que se sabe importado, um techno a brotar do coração da Europa, uma lipoaspiração de toda a tralha acessória que faz a programação das noites dos bares da Expo. Mas, como ovelha tresmalhada que é, Portable não poderia ficar-se pelo continente negro, onde se demora nos vinte minutos que se seguem aos primeiros de Version. É que, à última faixa – “The Opened Book” –, abre o livro e aponta a sua verdadeira filiação, uma linhagem transpirada de influências rítmicas, geograficamente demarcadas, mas uma adoração especial por Berlim. Não está mal.
Portable vai passar por cá já amanhã, dia 9, para uma data única, a acontecer no Castelo de Linhares da Beira. Os bóinas vermelhas já estão dispensados. É que é muita música para um revolucionário!
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=500
~scape/Flur
Este último fim-de-semana foi aquele em que os peregrinos vermelhos entopem os transportes da margem sul do Tejo. A Quinta da Atalaia, pólo de oração dos comunistas no último mês do tempo quente, recebeu-os num contexto especial. A Festa do Avante deste ano aconteceu depois da debochada popular e mediática que foi levar o líder espiritual do clã a enterrar. O partido dos reformados e das gentes reaccionárias todos os anos prepara um acampamento de jovens e tenta atirar areia para os olhos de muita gente. No fundo, é tudo malta inofensiva cujo único crime é trajar uma t-shirt do Che, mas também não se pode assumir que toda a gente conhece a História. Ao mesmo tempo, mas na parte norte do rio, acontecia um festival de reggae e derivados na Ericeira. Estes, sabe-se, estão lá pela música e têm a vantagem de não venderem a alma a Estaline.
As tribos existem, embora sempre vá havendo quem tenha a mente suficientemente aberta para picar mais do que um género, e rivalizam entre si. Tudo isto é saudável, tudo isto acontece desde que há jovens a habitar a superfície do planeta. Mas desconhece-se música tão apátrida como o dub. A resistência que a maior parte das pessoas tem quanto ao dub só o torna mais querido dentro dos círculos em que ele se mexe. A ~scape é morada de muita coisa que está para lá do lancil da magra via mediática. Já editou Deadbeat, Triosk meets Jan Jelinek, Pole ou colaborações ovni tipo Burnt Friedman e os Nu Dub Players, só para citar alguns. E agora edita Portable, ou antes Alan Abrahams, um tipo que soube crescer na África do Sul do pós-apartheid e que deu um salto a Londres para aí se estabelecer enquanto músico. Version é um disco do mundo, antes de ser qualquer outra coisa. Cruza idiomas tão aparentemente inconciliáveis que, só por faixas como “Thought in Action”, merecia ser conhecido por uma rua inteira. Os únicos temas em que ele mostra as raízes descarnadinhas da sua música encontram-se, logo a seguir, em “Temporal Distortion” e em “Tempura”, peças desavergonhadas que buscam inspiração em samples permissivos.
Mas, voltando atrás, ainda à boleia de “Thought in Action”, temos um pedaço de infusão africana. Uma espécie de remake pós-(inserir termo aqui) das partituras sonoras do King Kong, a clássica obra cinematográfica da dupla Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack. Aliás, não se percebe por que raio os gritos da actriz sempre que vê o gorila não foram samplados para aqui. Avante, camaradas, que há ainda “Typhoon”, um chamamento dos deuses, uma centopeia rítmica que induz uma preguiça tal, só disfarçada pelos tambores e pela voz que se mete no meio.
As miudezas electrónicas não podiam faltar e ocupam sobretudo a primeira metade do disco. Percebe-se um house que se sabe importado, um techno a brotar do coração da Europa, uma lipoaspiração de toda a tralha acessória que faz a programação das noites dos bares da Expo. Mas, como ovelha tresmalhada que é, Portable não poderia ficar-se pelo continente negro, onde se demora nos vinte minutos que se seguem aos primeiros de Version. É que, à última faixa – “The Opened Book” –, abre o livro e aponta a sua verdadeira filiação, uma linhagem transpirada de influências rítmicas, geograficamente demarcadas, mas uma adoração especial por Berlim. Não está mal.
Portable vai passar por cá já amanhã, dia 9, para uma data única, a acontecer no Castelo de Linhares da Beira. Os bóinas vermelhas já estão dispensados. É que é muita música para um revolucionário!
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=500
Crónicas : feature
Shooting a psychological thriller in a location where one might actually happen in real life is a detail passed over by most filmmakers, but not by Sebastián Cordero. As the Ecuadorian director points out when discussing his new film, Crónicas, Babahoyo is a town where houses don’t have running water, but they do have television, a situation that creates an interesting, unpredictable dynamic. I'll buy that, even when a movie that tries to operate on remove the vertebrae of journalistic ethics (are there any left?) couldn’t be more acridly out of tune with my cinematic tastes.
In the film, which debuted earlier this year in the Cannes Film Festival's Un Certain Regard section, John Leguizamo plays Manolo Bonilla, an ambitious journalist who works for a tabloid TV series. He and his crew – a cameraman and the beautiful Marisa – are willing to sell their souls to the devil, if they must, in the eternal quest for career advancement. The crew's anything-goes mentality is the best part of the movie, really: their readiness to disregard any sense of ethics or deontology they might harbor. Marisa is the only one who truly regrets having overlooked some basic principles.
In a reversal of human and God roles (and we all know how feverously religious Mexican people can be), everyone plays God here. From the mutinous people seeking to lynch a Bible salesman for accidentally running over a boy, to the “monster of Babahoyo” himself, a killer famed for targeting children, and Leguizamo's character, salivating for his biggest story, there is no power more righteous than one's own. And so an odd alliance is made, somehow reminiscent of Faust, if you look carefully: Vinicio Cepeda, the traveling preacher who finds himself behind bars after indivertibly killing a boy with his truck and, in a desperate attempt to free himself from jail, is reduced to selling his story of the monster rather than selling the Bible.
Crónicas underlines the dense variety of human fauna populating Mexican villages, but the story fails to divert our view from the traditional, commonsensical approach of people eager to be seen on TV. Cordero seems so anxious to set and scan the voltage levels of human behaviour that he completely forgets to deliver an interesting story, serving the usual, kitsch-like menu instead. His camera even sprinkles extra lemon juice over certain sordid moments of the film, making it a tabloid-esque, arid and dreary modern tale, hollow of any real meaning or value.
It is obvious that the director weighed every camera move cautiously, his lenses traveling through the village to detail the setting, but it ultimately fails to compromise our view of fractured cinema. In the end, it leaves itself ambiguous, unable to put a time-signatured footprint in our minds. Shot with a glossy production and wrought with careless close-ups, Crónicas falls short in texture, leaving many unsolved problems hanging in the air.
The best films are the ones which we recall in detail, not only the content but also our relationship to it, where and when and with whom we saw them. Crónicas is ultimately ambiguous, lacking that intimacy of human experience. Even though Cordero deserves applause for delivering a human touch to every character, including the monster of Babahoyo, the human experience presented languishes as entertainment, failing to develop a connection with the viewer, always remaining distant, a video collage that is cold, detatched and vaccum sealed under the glaze of the lens.
SEE ALSO: www.cronicasthemovie.net
http://www.lostatsea.net/feature.phtml?fid=1756569747431db04f6ce0a
In the film, which debuted earlier this year in the Cannes Film Festival's Un Certain Regard section, John Leguizamo plays Manolo Bonilla, an ambitious journalist who works for a tabloid TV series. He and his crew – a cameraman and the beautiful Marisa – are willing to sell their souls to the devil, if they must, in the eternal quest for career advancement. The crew's anything-goes mentality is the best part of the movie, really: their readiness to disregard any sense of ethics or deontology they might harbor. Marisa is the only one who truly regrets having overlooked some basic principles.
In a reversal of human and God roles (and we all know how feverously religious Mexican people can be), everyone plays God here. From the mutinous people seeking to lynch a Bible salesman for accidentally running over a boy, to the “monster of Babahoyo” himself, a killer famed for targeting children, and Leguizamo's character, salivating for his biggest story, there is no power more righteous than one's own. And so an odd alliance is made, somehow reminiscent of Faust, if you look carefully: Vinicio Cepeda, the traveling preacher who finds himself behind bars after indivertibly killing a boy with his truck and, in a desperate attempt to free himself from jail, is reduced to selling his story of the monster rather than selling the Bible.
Crónicas underlines the dense variety of human fauna populating Mexican villages, but the story fails to divert our view from the traditional, commonsensical approach of people eager to be seen on TV. Cordero seems so anxious to set and scan the voltage levels of human behaviour that he completely forgets to deliver an interesting story, serving the usual, kitsch-like menu instead. His camera even sprinkles extra lemon juice over certain sordid moments of the film, making it a tabloid-esque, arid and dreary modern tale, hollow of any real meaning or value.
It is obvious that the director weighed every camera move cautiously, his lenses traveling through the village to detail the setting, but it ultimately fails to compromise our view of fractured cinema. In the end, it leaves itself ambiguous, unable to put a time-signatured footprint in our minds. Shot with a glossy production and wrought with careless close-ups, Crónicas falls short in texture, leaving many unsolved problems hanging in the air.
The best films are the ones which we recall in detail, not only the content but also our relationship to it, where and when and with whom we saw them. Crónicas is ultimately ambiguous, lacking that intimacy of human experience. Even though Cordero deserves applause for delivering a human touch to every character, including the monster of Babahoyo, the human experience presented languishes as entertainment, failing to develop a connection with the viewer, always remaining distant, a video collage that is cold, detatched and vaccum sealed under the glaze of the lens.
SEE ALSO: www.cronicasthemovie.net
http://www.lostatsea.net/feature.phtml?fid=1756569747431db04f6ce0a
06/09/2005
The Capitol Years - Let Them Drink
Burn & Shiver
Rating: 5.5/10
It should be no surprise that any band claiming to belong, or righteously belonging, to the garage revival chunk of these last years will, as time goes by, embody no less than a penny in a slot machine. To kick things off, I should clarify that the Capitol Years are no different than the Mooney Suzuki or the Warlocks - or even the Strokes, to raise more than a couple of eyebrows - in that every two tracks, they mimic.
There’s no use in elaborating on my resistance to most garage revivalist bands (the Walkmen should always be mentioned as a clear exception), so let me put it this way: most of them seem to have picked an era and chosen to live there forever.
Therefore, most songs from the Capitol Years’ first true full-length sound no stronger to me than if they were hit by a reversing truck (and no, Morrissey’s words about dying by her/his side, after being hit by a double-decker, and that being “such a heavenly way to die” do not apply here). Let Them Drink’s first two songs speak to the attention deficit disorder in each one of us; they send us into a head spin, but just when we were all crossing our fingers - thinking it’s about time they added insult to injury - their music proves to be plain and harmless.
Throughout the rest of the 40-minute album, these Philly folks maintain a cool poise while playing risibly at moderate volume. At times choosing to travel faster than the speed of comprehension, they cast a shadow on their musical skills, which seem to disappear as suddenly as they arrived. Jeff Van Newkirk’s guitar, for example, gets tossed into a river of foaming harmonies, the sort that cleanse any dirty material that could have erupted and heightened their performance.
And therein lies their biggest problem: the Capitol Years create a trap for themselves - like a two-way spectrum between whirled harmonies and heavier clusters - and can’t find their way out of that maze. On the other hand, on tracks like “Ramona” or even “Everyone Is a Skunk,” with their ascending or descending power chords, feel like a sombre wizard showed up and left a stain - like a blessed splash of ink - in the otherwise void sound-mantra. Needless to say, these are the best cuts taken from Let Them Drink. Every other hot-fingered guitar interlude lacks a grain of salt or two. To put matters briefly, although they do show some potential, the Capitol Years do not rightfully deserve the hype they are getting.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=31807272431c337236816
Rating: 5.5/10
It should be no surprise that any band claiming to belong, or righteously belonging, to the garage revival chunk of these last years will, as time goes by, embody no less than a penny in a slot machine. To kick things off, I should clarify that the Capitol Years are no different than the Mooney Suzuki or the Warlocks - or even the Strokes, to raise more than a couple of eyebrows - in that every two tracks, they mimic.
There’s no use in elaborating on my resistance to most garage revivalist bands (the Walkmen should always be mentioned as a clear exception), so let me put it this way: most of them seem to have picked an era and chosen to live there forever.
Therefore, most songs from the Capitol Years’ first true full-length sound no stronger to me than if they were hit by a reversing truck (and no, Morrissey’s words about dying by her/his side, after being hit by a double-decker, and that being “such a heavenly way to die” do not apply here). Let Them Drink’s first two songs speak to the attention deficit disorder in each one of us; they send us into a head spin, but just when we were all crossing our fingers - thinking it’s about time they added insult to injury - their music proves to be plain and harmless.
Throughout the rest of the 40-minute album, these Philly folks maintain a cool poise while playing risibly at moderate volume. At times choosing to travel faster than the speed of comprehension, they cast a shadow on their musical skills, which seem to disappear as suddenly as they arrived. Jeff Van Newkirk’s guitar, for example, gets tossed into a river of foaming harmonies, the sort that cleanse any dirty material that could have erupted and heightened their performance.
And therein lies their biggest problem: the Capitol Years create a trap for themselves - like a two-way spectrum between whirled harmonies and heavier clusters - and can’t find their way out of that maze. On the other hand, on tracks like “Ramona” or even “Everyone Is a Skunk,” with their ascending or descending power chords, feel like a sombre wizard showed up and left a stain - like a blessed splash of ink - in the otherwise void sound-mantra. Needless to say, these are the best cuts taken from Let Them Drink. Every other hot-fingered guitar interlude lacks a grain of salt or two. To put matters briefly, although they do show some potential, the Capitol Years do not rightfully deserve the hype they are getting.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=31807272431c337236816
31/08/2005
Brendon Anderegg - Falling Air
Psych-O-Path Records
Rating: 7/10
Some circles have already labelled him “this year’s Sufjan Stevens.” Maybe Falling Air sells him a bit short, but Brendon Anderegg is still an apprentice whereas Stevens has the matured tricks of a wizard. But, as trends become trends, maybe some day we will be looking forward to the new Anderegg instead.
The legacy of Miles Davis, one of jazz’s most groundbreaking musicians, lives on in the perpetuation of two myths: the one that states Miles plays it simple, and the one that points out he plays it simple and with few notes. For those who still believe in that shit, I suggest they carefully listen to “One For Daddy-O” - where Miles is accompanied by ‘Cannonball’ Adderley, Art Blakey and Hank and Sam Jones - and try to reproduce the trumpet parts as elegantly as he plays them.
So, it’s time to drop another myth that may have popped in your head: however soothing and outstanding Falling Air may sound, it is entirely replicable at home - unlike Mile Davis. Headphone listening will greatly heighten awareness of its glow, but then again most lo-fi folkies were born to live in the intimacy of the sound field created when your ears are covered with that device.
Brendon Anderegg is a singer/songwriter definitely devoted to the acid-folk and low-key electronics, and thus the unplugging of his record playing feels like a disturbingly scorched nightmare. It’s truly amazing how songs like “They’re Still Here” build a new world into which the listener can’t help but be drawn. Therefore, switching all these glowing elements off makes the experience of these record’s latter symptoms all the more painful.
Anderegg’s is music bound to be listened in the closure of a dark, silent bedroom. When the first blips emerge, although they are very welcome, one bluntly feels that form and function somehow lose touch with one another. The musician lacks some sense of literacy and consistency when putting out this handful of songs, although this record contains some of his boldest moves yet recorded.
The funniest and most challenging part arises when trying to distinguish the sound of the acoustic guitar from that of the banjo - both included here - and then when attempting to tell the difference between a piano and an organ, or an accordion, a violin, a computer and all sorts of minimalist instruments. “My Baby Bird” packs a lot into its 4 minutes of whispered annoyance...
This was the year when the press sublimated Patrick Wolf as being an outstanding kid with heaps and heaps of talent, shortly after releasing a record that is merely above average; I will not do the same thing with Brendon Anderegg. He has a lot of potential, and Falling Air possesses a haunting drone that surprisingly amuses, but there is a long way to go before ascending Olympus.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1724308254313885bb2a61
Rating: 7/10
Some circles have already labelled him “this year’s Sufjan Stevens.” Maybe Falling Air sells him a bit short, but Brendon Anderegg is still an apprentice whereas Stevens has the matured tricks of a wizard. But, as trends become trends, maybe some day we will be looking forward to the new Anderegg instead.
The legacy of Miles Davis, one of jazz’s most groundbreaking musicians, lives on in the perpetuation of two myths: the one that states Miles plays it simple, and the one that points out he plays it simple and with few notes. For those who still believe in that shit, I suggest they carefully listen to “One For Daddy-O” - where Miles is accompanied by ‘Cannonball’ Adderley, Art Blakey and Hank and Sam Jones - and try to reproduce the trumpet parts as elegantly as he plays them.
So, it’s time to drop another myth that may have popped in your head: however soothing and outstanding Falling Air may sound, it is entirely replicable at home - unlike Mile Davis. Headphone listening will greatly heighten awareness of its glow, but then again most lo-fi folkies were born to live in the intimacy of the sound field created when your ears are covered with that device.
Brendon Anderegg is a singer/songwriter definitely devoted to the acid-folk and low-key electronics, and thus the unplugging of his record playing feels like a disturbingly scorched nightmare. It’s truly amazing how songs like “They’re Still Here” build a new world into which the listener can’t help but be drawn. Therefore, switching all these glowing elements off makes the experience of these record’s latter symptoms all the more painful.
Anderegg’s is music bound to be listened in the closure of a dark, silent bedroom. When the first blips emerge, although they are very welcome, one bluntly feels that form and function somehow lose touch with one another. The musician lacks some sense of literacy and consistency when putting out this handful of songs, although this record contains some of his boldest moves yet recorded.
The funniest and most challenging part arises when trying to distinguish the sound of the acoustic guitar from that of the banjo - both included here - and then when attempting to tell the difference between a piano and an organ, or an accordion, a violin, a computer and all sorts of minimalist instruments. “My Baby Bird” packs a lot into its 4 minutes of whispered annoyance...
This was the year when the press sublimated Patrick Wolf as being an outstanding kid with heaps and heaps of talent, shortly after releasing a record that is merely above average; I will not do the same thing with Brendon Anderegg. He has a lot of potential, and Falling Air possesses a haunting drone that surprisingly amuses, but there is a long way to go before ascending Olympus.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=1724308254313885bb2a61
03/08/2005
Various Artists - Verve Remixed, Vol. 3
Verve Music Group
Rating: 5/10
After a decade of fighting, a medieval knight returns home more battered and sceptical than ever. There’s misery all over, and there’s also the plague, so he blamelessly concludes that there is no God. But our hero is then visited by Death, who wants to take him from the world of the living. He doesn’t concede, however, and challenges Death to a game of chess. This is how Ingmar Bergman’s The Seventh Seal begins, casting a revelatory light on cinema. Coupling great minds with flourishing ideas is the best recipe for the advancement of art.
The idea of reworking jazz classics with a beat-infused cover is a tricky decision. In the tradition of the two previous Verve Remixed releases, this third volume feels like we are trapped in a noisy room and a jazz record is heard through the wall of an adjoining apartment. Some of these remixes inevitably sink like a stone and fail to pay an honourable tribute to the classics, instead sounding like distant thunder in your head: you try to separate the new from the old parts of the songs and you often end up starving for the original versions.
Take the Brazilian Girls’ remixing of Blossom Dearie’s “Just One of Those Things”, for instance. You enter a drawn-out wind tunnel that sucks you in and sets a dirty, beat-soaked trail, like crumbs on the floor for you to go after; there is no clue where the mould was left. The only true exceptions are Bent’s reinterpretation of “Speak Low” and “Sing, Sing, Sing,” as addressed by RSL. The former is a beautiful, chilled-out version of Billie Holiday’s track where the British duo refuses to shift an inch off the course they pursued in Programmed to Love, most notably on tracks like the neat “Swollen”. They thus take the original even further in emotional depth. RSL’s take on Anita O’Day benefits from the loads of swing that the original already possesses.
Add to this “The Gentle Rain”, which RJD2 redefines with his lowercase hip hop-scented blips and his reductionist formulae, while Astrud Gilberto’s voice stays crystal clear. And, unlike Postal Service’s reviewing of “Little Girl Blue” which is a real flop, when Nina Simone resurfaces by means of The Album Leaf’s remix of “Lilac Wine”, real magic occurs. That may be due solely to Simone’s ethereal voice – as it goes well with any sound collage - but the resulting track nears perfection. Well, Jeff Buckley did it better, but this one is a fair shot. Overall, only a third of Verve Remixed, Vol. 3 is worth hearing. Just go back to your vinyls for the classics and you won’t regret it.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=122074030342ecf0ed08b79
Rating: 5/10
After a decade of fighting, a medieval knight returns home more battered and sceptical than ever. There’s misery all over, and there’s also the plague, so he blamelessly concludes that there is no God. But our hero is then visited by Death, who wants to take him from the world of the living. He doesn’t concede, however, and challenges Death to a game of chess. This is how Ingmar Bergman’s The Seventh Seal begins, casting a revelatory light on cinema. Coupling great minds with flourishing ideas is the best recipe for the advancement of art.
The idea of reworking jazz classics with a beat-infused cover is a tricky decision. In the tradition of the two previous Verve Remixed releases, this third volume feels like we are trapped in a noisy room and a jazz record is heard through the wall of an adjoining apartment. Some of these remixes inevitably sink like a stone and fail to pay an honourable tribute to the classics, instead sounding like distant thunder in your head: you try to separate the new from the old parts of the songs and you often end up starving for the original versions.
Take the Brazilian Girls’ remixing of Blossom Dearie’s “Just One of Those Things”, for instance. You enter a drawn-out wind tunnel that sucks you in and sets a dirty, beat-soaked trail, like crumbs on the floor for you to go after; there is no clue where the mould was left. The only true exceptions are Bent’s reinterpretation of “Speak Low” and “Sing, Sing, Sing,” as addressed by RSL. The former is a beautiful, chilled-out version of Billie Holiday’s track where the British duo refuses to shift an inch off the course they pursued in Programmed to Love, most notably on tracks like the neat “Swollen”. They thus take the original even further in emotional depth. RSL’s take on Anita O’Day benefits from the loads of swing that the original already possesses.
Add to this “The Gentle Rain”, which RJD2 redefines with his lowercase hip hop-scented blips and his reductionist formulae, while Astrud Gilberto’s voice stays crystal clear. And, unlike Postal Service’s reviewing of “Little Girl Blue” which is a real flop, when Nina Simone resurfaces by means of The Album Leaf’s remix of “Lilac Wine”, real magic occurs. That may be due solely to Simone’s ethereal voice – as it goes well with any sound collage - but the resulting track nears perfection. Well, Jeff Buckley did it better, but this one is a fair shot. Overall, only a third of Verve Remixed, Vol. 3 is worth hearing. Just go back to your vinyls for the classics and you won’t regret it.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=122074030342ecf0ed08b79
23/07/2005
Deerhoof - Green Cosmos EP
Menlo Park Recordings
Rating: 6/10
Some records just seem like a folded Sunday newspaper. You get to learn what the cover story is about but you cannot engage in a thorough reading unless you unfold the whole thing and go through the printed pages. The difference with Deerhoof’s latest EP is that you are not allowed to unfold the work or double its duration without repeating what you’ve already heard. In this sense, Green Cosmos is a flatulent, speculating blister that succeeds in anticipating the proper follow-up to the highly-acclaimed Milk Man, but fails to provide the casual listener with many reasons to stay and wait.
The inaugural track, “Come See the Duck”, builds from an emancipated guitar riff to encounter a menacing, female voice somehow reminiscent of Yeah Yeah Yeahs’ Karen O., but this is where the rock comparisons end. From the title track on, the record evolves into experimentation that both mesmerizes and makes us prisoners of the rhythm discharge.
“Spiral Golden Town” begins with a charmed drone that most producers would consider using as the soundtrack to an animated series, with churning trumpets and beautifully arranged bass lines. Before “Koneko Kitten”, one might think that the San Francisco pop experimentalists had lowered their humour quotient, or at least the smirk shown on tracks from previous records like Reveille’s “No One Fed Me So I Stayed” or last year’s “That Big Orange Sun Run Over Speed Light”. On the aforementioned "Koneko", even the listener goes searching for the lost kitten.
Sometimes this release is like taking part of a sci-fi adventure; then again, it is often like going to the nearest cafeteria and being bothered by an old TV set re-broadcasting a Japanese singing contest… or even being dragged through an unbearable conversation with a guy who claims to buy Penthouse for the articles. Either way, what seems most correct is that here, Deerhoof have somehow orphaned their music from its original context and placed it squarely in a brave new world where new things may burst. For those who thought Deerhoof could do no wrong, they have proven they can - and that it may have been the right thing to do, really.
It’s not that they have to sit on telephone directories to reach the piano keys; it’s more like they tumbled into them and loved it. Green Cosmos will probably be regarded by some as a statement by factory workers desperate for overtime pay, but it has many sonic pearls that will amuse enthusiasts. The only possible drawback to this is its recording time, which doesn’t exceed fifteen minutes; the duration is a little too short of a testimony to warrant new recruits or money from the boss. Besides, Green Cosmos will always be footnoted in favour of Milk Man, so why bother?
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=181498063542da542194366
Rating: 6/10
Some records just seem like a folded Sunday newspaper. You get to learn what the cover story is about but you cannot engage in a thorough reading unless you unfold the whole thing and go through the printed pages. The difference with Deerhoof’s latest EP is that you are not allowed to unfold the work or double its duration without repeating what you’ve already heard. In this sense, Green Cosmos is a flatulent, speculating blister that succeeds in anticipating the proper follow-up to the highly-acclaimed Milk Man, but fails to provide the casual listener with many reasons to stay and wait.
The inaugural track, “Come See the Duck”, builds from an emancipated guitar riff to encounter a menacing, female voice somehow reminiscent of Yeah Yeah Yeahs’ Karen O., but this is where the rock comparisons end. From the title track on, the record evolves into experimentation that both mesmerizes and makes us prisoners of the rhythm discharge.
“Spiral Golden Town” begins with a charmed drone that most producers would consider using as the soundtrack to an animated series, with churning trumpets and beautifully arranged bass lines. Before “Koneko Kitten”, one might think that the San Francisco pop experimentalists had lowered their humour quotient, or at least the smirk shown on tracks from previous records like Reveille’s “No One Fed Me So I Stayed” or last year’s “That Big Orange Sun Run Over Speed Light”. On the aforementioned "Koneko", even the listener goes searching for the lost kitten.
Sometimes this release is like taking part of a sci-fi adventure; then again, it is often like going to the nearest cafeteria and being bothered by an old TV set re-broadcasting a Japanese singing contest… or even being dragged through an unbearable conversation with a guy who claims to buy Penthouse for the articles. Either way, what seems most correct is that here, Deerhoof have somehow orphaned their music from its original context and placed it squarely in a brave new world where new things may burst. For those who thought Deerhoof could do no wrong, they have proven they can - and that it may have been the right thing to do, really.
It’s not that they have to sit on telephone directories to reach the piano keys; it’s more like they tumbled into them and loved it. Green Cosmos will probably be regarded by some as a statement by factory workers desperate for overtime pay, but it has many sonic pearls that will amuse enthusiasts. The only possible drawback to this is its recording time, which doesn’t exceed fifteen minutes; the duration is a little too short of a testimony to warrant new recruits or money from the boss. Besides, Green Cosmos will always be footnoted in favour of Milk Man, so why bother?
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=181498063542da542194366
23/06/2005
Consafos - Tilting at Windmills
Greyday Productions
Rating: 6/10
Originally formed in Los Angeles in 2000 and currently established in Omaha, Consafos is a nicotine-stained, feminine and more ethereal version of Tindersticks - but where Stuart Staples manages to create little pockets of gravity for his gloomy vocals to travel, this Midwest five-piece ensemble takes the path of least resistance when it comes to placing the various elements together. They are well-intentioned, but sadly on Tilting at Windmills they become fossilized a little too soon.
Whenever “On and On” emerges from the stereo, it feels like they’ve just returned from a private lesson from no less than Hope Sandoval; its sepia-driven, folksy feel segues into the beautiful trumpet solo, but afterwards sounds amorphous and deviant that it’s difficult to see the intended direction. By the time the title track evolves with the gentle violin and the vibraphone, you have come up with the band’s underlying equation: Consafos’ interest grows in inverse proportion to the amount of influences they leave behind.
Sadly, most of the time they seem too attached to a background that guides, but also limits, their choices. In fact, Stefanie Drootin’s vocals - unnervingly reminiscent of Neko Case and Margo Timmins (Cowboy Junkies) - send these acoustic gems to the stratosphere, but for rotten pay. Also a member of Bright Eyes and The Good Life, the vocalist tames the apparently untamed drooling effect of her lyrics by seducing and deducing a whole universe from her front porch.
The spell is nevertheless broken when “Chelsea’s Got a Knife” reveals its telluric existence at the last minute. Add to this the harmonica on “Wide Eyed”, which reconfigures all established priorities and sends the listener back to the misty forest; by then it’s too late to haunt and confuse the hangers on. Consafos succeed in showing the path to light, but they finish this illumination after the fourth or fifth song; every latter attempt to walk the same way sounds false, like an anathema to the correct fruition of this work.
From “Broken Record” on, the album enters an infatuated state of epiglottal trance that infuriates any listener who fell in love at first sight. For the second half of this, the band repeats itself, sounding like margin walkers with way less charm than previously shown. Only Laura Watral’s violin is truly necessary and irreplaceable, salvaging the tone. Over all, this should have been an EP instead of a full-length, as sometimes, half the duration means double the delight.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=153367602542b559ee8f2a7
Rating: 6/10
Originally formed in Los Angeles in 2000 and currently established in Omaha, Consafos is a nicotine-stained, feminine and more ethereal version of Tindersticks - but where Stuart Staples manages to create little pockets of gravity for his gloomy vocals to travel, this Midwest five-piece ensemble takes the path of least resistance when it comes to placing the various elements together. They are well-intentioned, but sadly on Tilting at Windmills they become fossilized a little too soon.
Whenever “On and On” emerges from the stereo, it feels like they’ve just returned from a private lesson from no less than Hope Sandoval; its sepia-driven, folksy feel segues into the beautiful trumpet solo, but afterwards sounds amorphous and deviant that it’s difficult to see the intended direction. By the time the title track evolves with the gentle violin and the vibraphone, you have come up with the band’s underlying equation: Consafos’ interest grows in inverse proportion to the amount of influences they leave behind.
Sadly, most of the time they seem too attached to a background that guides, but also limits, their choices. In fact, Stefanie Drootin’s vocals - unnervingly reminiscent of Neko Case and Margo Timmins (Cowboy Junkies) - send these acoustic gems to the stratosphere, but for rotten pay. Also a member of Bright Eyes and The Good Life, the vocalist tames the apparently untamed drooling effect of her lyrics by seducing and deducing a whole universe from her front porch.
The spell is nevertheless broken when “Chelsea’s Got a Knife” reveals its telluric existence at the last minute. Add to this the harmonica on “Wide Eyed”, which reconfigures all established priorities and sends the listener back to the misty forest; by then it’s too late to haunt and confuse the hangers on. Consafos succeed in showing the path to light, but they finish this illumination after the fourth or fifth song; every latter attempt to walk the same way sounds false, like an anathema to the correct fruition of this work.
From “Broken Record” on, the album enters an infatuated state of epiglottal trance that infuriates any listener who fell in love at first sight. For the second half of this, the band repeats itself, sounding like margin walkers with way less charm than previously shown. Only Laura Watral’s violin is truly necessary and irreplaceable, salvaging the tone. Over all, this should have been an EP instead of a full-length, as sometimes, half the duration means double the delight.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=153367602542b559ee8f2a7
A Hawk and a Hacksaw - Darkness at Noon
The Leaf Label
Rating: 9/10
Shuffling through Eastern European flavours, Jeremy Barnes unleashes sections of tape recordings and spits out clumsy fragments of found and augmented noise in his most recent inception as A Hawk and a Hacksaw. Drummer for Neutral Milk Hotel’s instantly recognized record, In the Aeroplane Over the Sea, Barnes doesn’t cash in on the myth of the weird fuzz-folk scene; instead he chooses to punctuate his accordion-playing with moments of near-silence, efficiently applying the principles of some sort of musical renaissance.
The residual aura of appeal enclosed in Darkness at Noon - in case you were able to stomach and fully comprehend “Laughter in the Dark”, the texturally-detailed first track - is its close reverence to a rural America – a far way from being commonsensical here. Words, almost inexistent in this record, seem to accidentally tumble from lips, as if warning you that this is a listening process to be deflowered petal by petal, with extra care. At times, it may seem like more of Emir Kusturica’s political lip service, addressed as gypsy-driven memorabilia, but this is a sound work bound to put a spell on you once you lend your ear to it.
“For Slavoj”, for instance, is a track that carries the whole world inside. Expanding from early well-ventilated strings, it builds towards a central point of overwhelming physicality, personified by all instruments resonating where the aural dots – appropriately connected – bleed into those of visual language. You get a picture of a ceremony taking place in the Balkans - especially when beautiful chants spring out and inflame your senses, pilling bricks of gravitational laments into a carefully built wall of call-and-response melodies.
Unlike some of Yann Tiersen’s achievements, particularly those shared by Shannon Wright earlier this year, Jeremy Barnes succeeds in going past the casual oddities he finds in the way; he goes back and forth with his carousel-like slow rhythms and builds up cells of world music that only exist in dreams. “Pastelka on the Train” indivertibly shows what a mariachi ensemble would sound like if they toured around the far-eastern part of Europe. In a word: challenging.
The next track, “Goodbye Great Britain”, is a glitch-fuelled number, whose reminiscence of New York-raised prodigal sons might make one or two wince, even if it doesn’t exceed the two-minute mark. In fact, the eruption of these unconventional parameters occurs in inverse proportion to an adjusted deglutition of the whole work, but Jeremy Barnes soon redeems himself with a puzzled “Wicky Pocky” and a get together with his roots throughout “Portlandtown”.
For some, this whole thing would be a shambles - particularly by someone who has worked with Neutral Milk Hotel (and their confessed love for Anne Frank) - but this is coherent with Barnes’ other projects and collaborations, from Guignol to Oliver Tremor Control. As far as I’m concerned, Darkness at Noon is the most exciting record to be put out this semester, and is definitely more suited to a stuffy bar - located in the Balkans or even in Texas - than the moronic paraphernalia of any commercial radio’s meagre playlist.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=136883219242b414801ac4a
Rating: 9/10
Shuffling through Eastern European flavours, Jeremy Barnes unleashes sections of tape recordings and spits out clumsy fragments of found and augmented noise in his most recent inception as A Hawk and a Hacksaw. Drummer for Neutral Milk Hotel’s instantly recognized record, In the Aeroplane Over the Sea, Barnes doesn’t cash in on the myth of the weird fuzz-folk scene; instead he chooses to punctuate his accordion-playing with moments of near-silence, efficiently applying the principles of some sort of musical renaissance.
The residual aura of appeal enclosed in Darkness at Noon - in case you were able to stomach and fully comprehend “Laughter in the Dark”, the texturally-detailed first track - is its close reverence to a rural America – a far way from being commonsensical here. Words, almost inexistent in this record, seem to accidentally tumble from lips, as if warning you that this is a listening process to be deflowered petal by petal, with extra care. At times, it may seem like more of Emir Kusturica’s political lip service, addressed as gypsy-driven memorabilia, but this is a sound work bound to put a spell on you once you lend your ear to it.
“For Slavoj”, for instance, is a track that carries the whole world inside. Expanding from early well-ventilated strings, it builds towards a central point of overwhelming physicality, personified by all instruments resonating where the aural dots – appropriately connected – bleed into those of visual language. You get a picture of a ceremony taking place in the Balkans - especially when beautiful chants spring out and inflame your senses, pilling bricks of gravitational laments into a carefully built wall of call-and-response melodies.
Unlike some of Yann Tiersen’s achievements, particularly those shared by Shannon Wright earlier this year, Jeremy Barnes succeeds in going past the casual oddities he finds in the way; he goes back and forth with his carousel-like slow rhythms and builds up cells of world music that only exist in dreams. “Pastelka on the Train” indivertibly shows what a mariachi ensemble would sound like if they toured around the far-eastern part of Europe. In a word: challenging.
The next track, “Goodbye Great Britain”, is a glitch-fuelled number, whose reminiscence of New York-raised prodigal sons might make one or two wince, even if it doesn’t exceed the two-minute mark. In fact, the eruption of these unconventional parameters occurs in inverse proportion to an adjusted deglutition of the whole work, but Jeremy Barnes soon redeems himself with a puzzled “Wicky Pocky” and a get together with his roots throughout “Portlandtown”.
For some, this whole thing would be a shambles - particularly by someone who has worked with Neutral Milk Hotel (and their confessed love for Anne Frank) - but this is coherent with Barnes’ other projects and collaborations, from Guignol to Oliver Tremor Control. As far as I’m concerned, Darkness at Noon is the most exciting record to be put out this semester, and is definitely more suited to a stuffy bar - located in the Balkans or even in Texas - than the moronic paraphernalia of any commercial radio’s meagre playlist.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=136883219242b414801ac4a
11/06/2005
Populous - Queue for Love
2005
Morr Music/Flur
Não estaremos todos um bocado fartos do Improv, do noise e de fazer barulho for the sake of it? Há qualquer coisa de tremendamente umbiguista nos retalhos de som que vão tecendo a manta do nosso contentamento ou do contentamento deles, dos críticos e dos músicos. Começa a faltar paciência para as “descobertas” da editora Kranky de cassetes perdidas nos 90 dos Charalambides. Vão estar ainda de rabo alçado, sempre a fuçar, antes de perceberem que a fonte secou ou então não tarda. O mesmo se passa com o hip-hop progressista. Descobriu-se ali uma galinha dos ovos de ouro e vai de lançar coisas a eito, sem qualquer preocupação estetizante. Por isso, também o hip-hop de fragmentos é tão do ano passado.
Dose One é um repetente nisto mas com cátedra assegurada na divisão do alt-hop. Assim se percebe que Populous, produtor italiano a tentar a sorte nesse comprimento de onda, o tenha convidado para espalhar poesia falada numa das faixas do novo disco. E é logo na segunda, “My Winter Vacation”, que é para o ouvinte morder o isco. Aquele hiss de cassete, aquela nebulosidade toda, aquelas palavras circulares lembram qualquer coisa. Que saudades de quando se fazia hip-hop de serviço comunitário, com o credo a desfazer-se em rimas. Há pouco gueto a explorar no Pro Tools.
Mesmo “Hip-hop Cocotte”, que parecia de início desviar-se para a velha guarda, é explorada por Andrea Mangia com o mesmo aparato de circum-navegação das electrónicas de bolso ou laptop. Também há o empréstimo vocal de Matilde Davoli em dois temas, “Bunco” e “Clap Like Breeze”, a tactear a folk, a tingir de luz um quarteirão maquínico. Ainda se safa a penúltima “Canoe Canoa”, que deixa à mostra linhas de guitarra, recortes analógicos, superfícies adocicadas pelo dedilhar humano.
Mas o som demasiado glitch de Queue for Love torna-o objecto de uma hibridez que não sabe encontrar resposta corpórea para a excessiva colonização das máquinas. Dá para animar noites lounge e golpear dias de rotina chata mas pouco mais. Foi uma oportunidade perdida.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=457
Morr Music/Flur
Não estaremos todos um bocado fartos do Improv, do noise e de fazer barulho for the sake of it? Há qualquer coisa de tremendamente umbiguista nos retalhos de som que vão tecendo a manta do nosso contentamento ou do contentamento deles, dos críticos e dos músicos. Começa a faltar paciência para as “descobertas” da editora Kranky de cassetes perdidas nos 90 dos Charalambides. Vão estar ainda de rabo alçado, sempre a fuçar, antes de perceberem que a fonte secou ou então não tarda. O mesmo se passa com o hip-hop progressista. Descobriu-se ali uma galinha dos ovos de ouro e vai de lançar coisas a eito, sem qualquer preocupação estetizante. Por isso, também o hip-hop de fragmentos é tão do ano passado.
Dose One é um repetente nisto mas com cátedra assegurada na divisão do alt-hop. Assim se percebe que Populous, produtor italiano a tentar a sorte nesse comprimento de onda, o tenha convidado para espalhar poesia falada numa das faixas do novo disco. E é logo na segunda, “My Winter Vacation”, que é para o ouvinte morder o isco. Aquele hiss de cassete, aquela nebulosidade toda, aquelas palavras circulares lembram qualquer coisa. Que saudades de quando se fazia hip-hop de serviço comunitário, com o credo a desfazer-se em rimas. Há pouco gueto a explorar no Pro Tools.
Mesmo “Hip-hop Cocotte”, que parecia de início desviar-se para a velha guarda, é explorada por Andrea Mangia com o mesmo aparato de circum-navegação das electrónicas de bolso ou laptop. Também há o empréstimo vocal de Matilde Davoli em dois temas, “Bunco” e “Clap Like Breeze”, a tactear a folk, a tingir de luz um quarteirão maquínico. Ainda se safa a penúltima “Canoe Canoa”, que deixa à mostra linhas de guitarra, recortes analógicos, superfícies adocicadas pelo dedilhar humano.
Mas o som demasiado glitch de Queue for Love torna-o objecto de uma hibridez que não sabe encontrar resposta corpórea para a excessiva colonização das máquinas. Dá para animar noites lounge e golpear dias de rotina chata mas pouco mais. Foi uma oportunidade perdida.
http://www.bodyspace.net/album.php?album_id=457
07/06/2005
Acid Mothers Temple and the Melting Paraiso U.F.O. - Born to Be Wild in the U.S.A. 2000
Wabana
Rating: 7/10
Music used to be a communal thing, and still is in some cases. From the work songs that - along with the blues, the protestant spirituals and ragtime - gave birth to jazz, to the traditional rituals of yesteryear and everyday based on deep-rooted cultures, music is addressed in a public manner. Nevertheless, Internet and the proliferation of freeform radio stations have created an individual appeal and most musicians who share a common, ever-growing ground have dropped off the public radar.
Sometimes mistaken for a religious congregation, Acid Mothers Temple and the Melting Paraiso U.F.O. (Underground Freak Out) is Japanese guitarist Mokoto Kawabata’s collective ensemble. He founded the Temple in 1996 to pursue the paths of such heavyweights as avant-garde prominent Karlheinz Stockhausen, psychedelic and progressive gems and the Krautrock heritage personified by the German eccentrics Faust, just to name a few. Before forming the band - allegedly to give room for unknown musicians to record and release their work - Kawabata had already received plaudits for his guitar additions to other projects.
Originally released as a cassette, then leaked to a 1000 copies-limited edition LP, Born to Be Wild in the U.S.A. 2000, now properly remastered as a CD, documents part of the Temple’s American tour that year. It does so unleashing sonic prophecies that are well worth the price value of the record, keeping a precarious balance between the fudged bass played by Atsushi Tsuyama and left hanging pendulously around tracks like “Pink Lady Lemonade” and “Speed Guru”. The hard-edged vector of 13-minute “La Novia” cuts through the twitching feel of the rest of the disc, remaining half-cooked and engrossing a crowd of advancing zombies to their following.
Most progressive acts take pains to dismiss any link to the unknown and take comfort in nurturing a (sometimes fake) sympathy for the devil, but Kawabata’s troupe is completely different. Being Japanese, they don’t renegade the spiritual prism of perception they grew up with. At certain points, notably in records like last year’s Mantra of Love, it feels like psychedelic journeys are painted in a more tainted hue when shone through the pyramid of their spiritual selves. They even finish this record with a track called “God Bless AMT”, feeding constant highbrow allusions to folksy mystical endeavors. Before listening, take note: it is advisable to delve into other Japanese fellow musicians like Ghost and Nagisa Ni Te in order to fully comprehend Acid Mothers Temple’s DNA.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=132650370042a30dfed5ba7
Rating: 7/10
Music used to be a communal thing, and still is in some cases. From the work songs that - along with the blues, the protestant spirituals and ragtime - gave birth to jazz, to the traditional rituals of yesteryear and everyday based on deep-rooted cultures, music is addressed in a public manner. Nevertheless, Internet and the proliferation of freeform radio stations have created an individual appeal and most musicians who share a common, ever-growing ground have dropped off the public radar.
Sometimes mistaken for a religious congregation, Acid Mothers Temple and the Melting Paraiso U.F.O. (Underground Freak Out) is Japanese guitarist Mokoto Kawabata’s collective ensemble. He founded the Temple in 1996 to pursue the paths of such heavyweights as avant-garde prominent Karlheinz Stockhausen, psychedelic and progressive gems and the Krautrock heritage personified by the German eccentrics Faust, just to name a few. Before forming the band - allegedly to give room for unknown musicians to record and release their work - Kawabata had already received plaudits for his guitar additions to other projects.
Originally released as a cassette, then leaked to a 1000 copies-limited edition LP, Born to Be Wild in the U.S.A. 2000, now properly remastered as a CD, documents part of the Temple’s American tour that year. It does so unleashing sonic prophecies that are well worth the price value of the record, keeping a precarious balance between the fudged bass played by Atsushi Tsuyama and left hanging pendulously around tracks like “Pink Lady Lemonade” and “Speed Guru”. The hard-edged vector of 13-minute “La Novia” cuts through the twitching feel of the rest of the disc, remaining half-cooked and engrossing a crowd of advancing zombies to their following.
Most progressive acts take pains to dismiss any link to the unknown and take comfort in nurturing a (sometimes fake) sympathy for the devil, but Kawabata’s troupe is completely different. Being Japanese, they don’t renegade the spiritual prism of perception they grew up with. At certain points, notably in records like last year’s Mantra of Love, it feels like psychedelic journeys are painted in a more tainted hue when shone through the pyramid of their spiritual selves. They even finish this record with a track called “God Bless AMT”, feeding constant highbrow allusions to folksy mystical endeavors. Before listening, take note: it is advisable to delve into other Japanese fellow musicians like Ghost and Nagisa Ni Te in order to fully comprehend Acid Mothers Temple’s DNA.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=132650370042a30dfed5ba7
04/06/2005
Os Bravos Não Têm Descanso, de Alain Guiraudie
França / Áustria, 2003
Temos a imagem do penúltimo sono, sonha-se e depois morre-se. Mas sabe-se: um dia vamos ter que acabar por dormir. É um filme de vigília em permanente rota de colisão com os filmes de vigília orientados para o segmento pré-adolescente. O protagonista foi beber um copo e só voltou dois meses depois, em Agosto, queixa-se a mãe. Souleilhes é uma aldeia pacata onde morreram vinte pessoas numa noite, assassinadas.
Há cenas de uma ironia mordaz, como aquela em que um rapaz toca guitarra e outro ordenha as cabras. Ou quando, pela inércia, o autocarro pára e o rapaz é projectado pelo vidro da frente (que não existe). A cena de sexo na mesa de bilhar, as cores inebriantes, estamos à superfície dos sonhos, geografia de todos os desejos e luxúrias. A conversa à janela, uma vela atrás, com um vizinho. Planos quentes.
Basile é o rapaz que não dorme porque não pode. Mas arranja forma de descansar um pouco. Se puser o despertador para daí a algumas horas, acorda e aquele não será o seu último sono. Johnny Got é o outro, preso a um baloiço por alegadamente ter roubado bolinhas vermelhas. E há ainda Igor. Há um que repete as perguntas que lhe fazem. E depois há cidades imaginárias como Bairoute.
Um ano depois regressa, o filho pródigo. A mãe queixa-se, claro. Mas só não o viu porque não procurou por ele. O plano de fecho dos três amigos, com a ficha técnica a passar, é qualquer coisa de inenarrável.
Temos a imagem do penúltimo sono, sonha-se e depois morre-se. Mas sabe-se: um dia vamos ter que acabar por dormir. É um filme de vigília em permanente rota de colisão com os filmes de vigília orientados para o segmento pré-adolescente. O protagonista foi beber um copo e só voltou dois meses depois, em Agosto, queixa-se a mãe. Souleilhes é uma aldeia pacata onde morreram vinte pessoas numa noite, assassinadas.
Há cenas de uma ironia mordaz, como aquela em que um rapaz toca guitarra e outro ordenha as cabras. Ou quando, pela inércia, o autocarro pára e o rapaz é projectado pelo vidro da frente (que não existe). A cena de sexo na mesa de bilhar, as cores inebriantes, estamos à superfície dos sonhos, geografia de todos os desejos e luxúrias. A conversa à janela, uma vela atrás, com um vizinho. Planos quentes.
Basile é o rapaz que não dorme porque não pode. Mas arranja forma de descansar um pouco. Se puser o despertador para daí a algumas horas, acorda e aquele não será o seu último sono. Johnny Got é o outro, preso a um baloiço por alegadamente ter roubado bolinhas vermelhas. E há ainda Igor. Há um que repete as perguntas que lhe fazem. E depois há cidades imaginárias como Bairoute.
Um ano depois regressa, o filho pródigo. A mãe queixa-se, claro. Mas só não o viu porque não procurou por ele. O plano de fecho dos três amigos, com a ficha técnica a passar, é qualquer coisa de inenarrável.
28/05/2005
Dälek + Oddateee @ Galeria Zé dos Bois, Lisboa
24_05_2005
Desconhece-se se as pessoas, em geral, percebem ou não o hip-hop que não passa na TV, e se é isso que as faz ficar em casa quando uma das mais contravencionais bandas vem a terreiro. Certo é que, quando Oddateee subiu ao palco da ZDB para fazer o warm-up, a sala estava às moscas. Numa actuação afivelada a um alinhamento de Oktopus (produtor do colectivo que se seguia) e a versar por cima, o músico natural de New Jersey, “co-coming from the hood”, teve algumas tiradas brilhantes e outras menos boas.
Sozinho, sem o DJ que o costuma acompanhar em digressão, Oddateee apelou a um sentimento de comunidade, a uma aproximação das pessoas ao palco, à coisa dialógica que marcou os primórdios do hip-hop. Saiu-se bem, ainda que o público, que ia agora crescendo, nem sempre respondesse. Arrepiante foi o número em que desfiou, uma por uma, as mortes de gente próxima, o tipo alvejado por 450 dólares, o trompetista, a miúda com Sida, etc. Mas insistiu em mostrar às pessoas como se escrevia o seu nome artístico e em malhar no DJ, aquele “asshole” que não marcou presença.
Compreende-se a necessidade de preencher os espaços mortiços enquanto o computador não devolve a faixa seguinte, mas às vezes a repetição sem brilho aborrece. No que realmente conta, Oddateee fez um set competente e percebeu-se por que é que os Dälek pegaram neste miúdo. Sai-se melhor quando se agarra ao groove do baixo para pôr a voz, do que quando tenta furar a bateria ou o material samplado de que se faz acompanhar; nestes, a voz fica abafada e é difícil ler as suas palavras. Qualidades de MC não lhe faltam, falta-lhe talvez maior capacidade de encaixe, mais cola criativa que torne a sua música mais forte e coesa, da raiz até às pontas.
Mas a noite era dos Dälek (lê-se “dialect”, para quem ainda não sabe). Colectivo formado por Dälek, o peso-pesado, o MC e principal produtor, Oktopus, produtor também a cargo das teclas, e DJ Still, o gira-disquista de serviço, senhor da mais swingante cabeleira afro. Os Dälek de Negro, Necro, Nekros, o primeiro disco editado em 1998, não são já os mesmos que se apresentaram na Galeria. Entretanto cresceram muito e, sobretudo, cresceram muito depressa. Uma das obras maiores foi o disco que gravaram a meias com Faust, nome intocável do krautrock germânico.
Ao vivo, tudo é diferente, é tudo mais descontrolado, mais sónico, mais avassalador. Houve quem se queixasse da muralha de som que se constituiu e que tornava imperceptível quase tudo. Sentiu-se, de facto, uma reverberação que tornava macroscópicos apontamentos ligeiros de som e isso acabou por influir na degustação plena do concerto. Possível explicação: as ondas acústicas encontravam muito atrito, muitos espaços vazios entre a assistência e, como a sala é pequena, as ondas chocavam entre si e adensavam o barulho, o ruído na comunicação, já de si ruidosa, emanada da voz e instrumentos.
Uma espécie de hip-hop progressivo que tem tudo para defraudar os fundamentalistas do hip-hop ou do metal. É preciso alguma abertura para levar com um live sampling agressivo, aturar o berreiro de DJ Still para a agulha do gira-discos, beats ultracinéticos e uma poesia que não cabe nesse termo. Há quem ande a descobrir no som dos Dälek vestígios de My Bloody Valentine. Eles existem sim, mas apenas na exacta medida que os encontramos nos Jesu, novo projecto de Justin Broadrick (ex-Goldflesh e Techno Animal): uma nebulosa de som que se expande como gás tóxico, que calcina tudo à passagem. E a analogia acaba aqui, não vão os incautos do shoegaze calçar o sapato errado. Demolidor e inspirador, simultaneamente, assim foi Dälek.
Desconhece-se se as pessoas, em geral, percebem ou não o hip-hop que não passa na TV, e se é isso que as faz ficar em casa quando uma das mais contravencionais bandas vem a terreiro. Certo é que, quando Oddateee subiu ao palco da ZDB para fazer o warm-up, a sala estava às moscas. Numa actuação afivelada a um alinhamento de Oktopus (produtor do colectivo que se seguia) e a versar por cima, o músico natural de New Jersey, “co-coming from the hood”, teve algumas tiradas brilhantes e outras menos boas.
Sozinho, sem o DJ que o costuma acompanhar em digressão, Oddateee apelou a um sentimento de comunidade, a uma aproximação das pessoas ao palco, à coisa dialógica que marcou os primórdios do hip-hop. Saiu-se bem, ainda que o público, que ia agora crescendo, nem sempre respondesse. Arrepiante foi o número em que desfiou, uma por uma, as mortes de gente próxima, o tipo alvejado por 450 dólares, o trompetista, a miúda com Sida, etc. Mas insistiu em mostrar às pessoas como se escrevia o seu nome artístico e em malhar no DJ, aquele “asshole” que não marcou presença.
Compreende-se a necessidade de preencher os espaços mortiços enquanto o computador não devolve a faixa seguinte, mas às vezes a repetição sem brilho aborrece. No que realmente conta, Oddateee fez um set competente e percebeu-se por que é que os Dälek pegaram neste miúdo. Sai-se melhor quando se agarra ao groove do baixo para pôr a voz, do que quando tenta furar a bateria ou o material samplado de que se faz acompanhar; nestes, a voz fica abafada e é difícil ler as suas palavras. Qualidades de MC não lhe faltam, falta-lhe talvez maior capacidade de encaixe, mais cola criativa que torne a sua música mais forte e coesa, da raiz até às pontas.
Mas a noite era dos Dälek (lê-se “dialect”, para quem ainda não sabe). Colectivo formado por Dälek, o peso-pesado, o MC e principal produtor, Oktopus, produtor também a cargo das teclas, e DJ Still, o gira-disquista de serviço, senhor da mais swingante cabeleira afro. Os Dälek de Negro, Necro, Nekros, o primeiro disco editado em 1998, não são já os mesmos que se apresentaram na Galeria. Entretanto cresceram muito e, sobretudo, cresceram muito depressa. Uma das obras maiores foi o disco que gravaram a meias com Faust, nome intocável do krautrock germânico.
Ao vivo, tudo é diferente, é tudo mais descontrolado, mais sónico, mais avassalador. Houve quem se queixasse da muralha de som que se constituiu e que tornava imperceptível quase tudo. Sentiu-se, de facto, uma reverberação que tornava macroscópicos apontamentos ligeiros de som e isso acabou por influir na degustação plena do concerto. Possível explicação: as ondas acústicas encontravam muito atrito, muitos espaços vazios entre a assistência e, como a sala é pequena, as ondas chocavam entre si e adensavam o barulho, o ruído na comunicação, já de si ruidosa, emanada da voz e instrumentos.
Uma espécie de hip-hop progressivo que tem tudo para defraudar os fundamentalistas do hip-hop ou do metal. É preciso alguma abertura para levar com um live sampling agressivo, aturar o berreiro de DJ Still para a agulha do gira-discos, beats ultracinéticos e uma poesia que não cabe nesse termo. Há quem ande a descobrir no som dos Dälek vestígios de My Bloody Valentine. Eles existem sim, mas apenas na exacta medida que os encontramos nos Jesu, novo projecto de Justin Broadrick (ex-Goldflesh e Techno Animal): uma nebulosa de som que se expande como gás tóxico, que calcina tudo à passagem. E a analogia acaba aqui, não vão os incautos do shoegaze calçar o sapato errado. Demolidor e inspirador, simultaneamente, assim foi Dälek.
27/05/2005
A Hawk and a Hacksaw - Darkness at Noon
2005
Leaf/Flur
Ouvir música ao deitar pode ter um de dois efeitos. Ou se assemelha àquelas pessoas que quebram o contrato social do silêncio no cinema, ou serve de acelerador de partículas nos sonhos. Nas vésperas de se escrever ou falar sobre A Hawk and a Hacksaw, pôr In the Aeroplane Over the Sea a tocar pode ajudar no processo de configuração dos laços de sangue que existem entre este projecto emergente e os Neutral Milk Hotel. Há qualquer coisa de geográfico no disco maior de uma das mais citadas formações dentro da divisão estranhíssima da folk encharcada de fuzz em marcha nupcial e/ou fúnebre. Na última audição, canções como “The King of Carrot Flowers”, “Two-Headed Boy” e “Communist Daughter” recordaram como foi estar a milhares de quilómetros de casa, num país frio e com distintas referências culturais.
Os Neutral Milk Hotel têm um espaço particular na cabeça de quem os ouviu, que é capaz de dizer onde estava e o que sentiu ao recuperar o disco. Sabemos que isto na música contemporânea está para modas - pois que assim seja -, mas desde já fica o aviso: os Neutral Milk Hotel valem mil Arcade Fires. Por isso, é natural que um segundo disco (normalmente, apontado como decisivo para a continuidade das coisas novas ou para a certidão de óbito passada na praia) de alguém que esteve ligado umbilicalmente aos aduladores de Anne Frank seja aguardado com a mesma ânsia e a mesma ascese – tudo no mesmo corpo – usadas para aguentar a demora das últimas pinguinhas que caem num urinol público. Aqui há ainda um sentimento comunal, fica esclarecido o amigo leitor que é para saber ao que vem, mas é sobretudo uma comunidade de festarola, que joga com cambiantes étnicos e geográficos. Música sim, e a incitar à marcha também, mas música de feira popular, de carrossel. Música de palhaço triste.
Um diálogo das nações que enche o mundo de músicas (do mundo) sujeitas ao crivo de Jeremy Barnes, que é como quem diz ao acordeão do baterista do álbum maior daqueles senhores lá em cima. O homem disse um dia que sempre quis ser um homem-orquestra no sentido mais tradicional e acústico do termo. É um pouco isso que se passa aqui, ao segundo volume, sendo que o primeiro, homónimo de 2002, andou arredado do mapa mental de grande parte de promotores e críticos. Sem ser ofensa, temas como “A Black and White Rainbow” podiam ser cançonetas arrancadas aos trôpegos indigentes que fazem a vida no metropolitano. Mas têm uma tal universalidade que só um espírito viajante pode conceber. Não se ouvia música tão afectada e agregadora de linguagens desde que o colectivo de jazz yeah NO lançou Swell Henry no ano passado.
Barnes vai um pouco mais longe no processo de sedimentação de culturas e influências ao assediar uma canção tradicional da Transilvânia em “Laughter in the Dark”, ao visitar os Balcãs em “Europa”, ao dar um salto ao Leste Europeu em “Pastelka on the Train”, e regressando depois à pátria que o pariu e estacionando em Portland, na derradeira “Portlandtown”, de onde se desprendem umas notas de piano a reagir com um banjo acelerado. Mas o acordeão é, sem dúvida, a peça de encaixe de todas estas composições graves, cola que une sem uniformizar ou embrutecer. Dá espaço para os outros instrumentos, como a harpa executada pela mãe de Barnes, e só perde andamento em “Goodbye Great Britain”, que é um número contemplativo, de reverência aos assomos de glitch que andam a impressionar muita gente. Em “The Water Under the Moon” vêm à memória as imagens de Um Violino no Telhado, mas também as das calçadas de Paris sugeridas por Yann Tiersen.
Esse tema e o seguinte, “Our Lady of the Vlatva”, são como interregnos, pausas para descompressão, curtinhos interlúdios no desdobramento cinescópio que é o resto do disco. Este último tem, aliás, uma voz feminina travestida de amarra, anzol, isco lamacento, enfim o registo longínquo, espécie de canto de sereia, de Heather Trost, que também toca violino no álbum. A embriagar os navegantes, a fazê-los abeirar-se do abismo. Gravado numa igreja no coração da Inglaterra e também na Albuquerque natal, Darkness at Noon (belo título) é um disco vagante que abre espaços, percorre trilhos, encharca-se de tipologias de vários pontos cardeais mas que é capaz de aglomerar mais um pouco, de conter mais uma nota. A Hawk and a Hacksaw, designação pilhada de uma tradução do Dom Quixote de Miguel de Cervantes, é confluência de cheiros e coordenadas. Como o são algumas das bandas em que esteve envolvido Barnes, mais os Guignol e menos, por exemplo, os Now It’s Overhead ou Oliver Tremor Control. Caleidoscópio de formas de recorte neotradicionalista que passa n’ O Meu Mercedes É Maior Que o Teu, no Porto, a 10 de Junho, e na Zé dos Bois, em Lisboa, no dia seguinte. A ampola fez mesmo “pop”.
Leaf/Flur
Ouvir música ao deitar pode ter um de dois efeitos. Ou se assemelha àquelas pessoas que quebram o contrato social do silêncio no cinema, ou serve de acelerador de partículas nos sonhos. Nas vésperas de se escrever ou falar sobre A Hawk and a Hacksaw, pôr In the Aeroplane Over the Sea a tocar pode ajudar no processo de configuração dos laços de sangue que existem entre este projecto emergente e os Neutral Milk Hotel. Há qualquer coisa de geográfico no disco maior de uma das mais citadas formações dentro da divisão estranhíssima da folk encharcada de fuzz em marcha nupcial e/ou fúnebre. Na última audição, canções como “The King of Carrot Flowers”, “Two-Headed Boy” e “Communist Daughter” recordaram como foi estar a milhares de quilómetros de casa, num país frio e com distintas referências culturais.
Os Neutral Milk Hotel têm um espaço particular na cabeça de quem os ouviu, que é capaz de dizer onde estava e o que sentiu ao recuperar o disco. Sabemos que isto na música contemporânea está para modas - pois que assim seja -, mas desde já fica o aviso: os Neutral Milk Hotel valem mil Arcade Fires. Por isso, é natural que um segundo disco (normalmente, apontado como decisivo para a continuidade das coisas novas ou para a certidão de óbito passada na praia) de alguém que esteve ligado umbilicalmente aos aduladores de Anne Frank seja aguardado com a mesma ânsia e a mesma ascese – tudo no mesmo corpo – usadas para aguentar a demora das últimas pinguinhas que caem num urinol público. Aqui há ainda um sentimento comunal, fica esclarecido o amigo leitor que é para saber ao que vem, mas é sobretudo uma comunidade de festarola, que joga com cambiantes étnicos e geográficos. Música sim, e a incitar à marcha também, mas música de feira popular, de carrossel. Música de palhaço triste.
Um diálogo das nações que enche o mundo de músicas (do mundo) sujeitas ao crivo de Jeremy Barnes, que é como quem diz ao acordeão do baterista do álbum maior daqueles senhores lá em cima. O homem disse um dia que sempre quis ser um homem-orquestra no sentido mais tradicional e acústico do termo. É um pouco isso que se passa aqui, ao segundo volume, sendo que o primeiro, homónimo de 2002, andou arredado do mapa mental de grande parte de promotores e críticos. Sem ser ofensa, temas como “A Black and White Rainbow” podiam ser cançonetas arrancadas aos trôpegos indigentes que fazem a vida no metropolitano. Mas têm uma tal universalidade que só um espírito viajante pode conceber. Não se ouvia música tão afectada e agregadora de linguagens desde que o colectivo de jazz yeah NO lançou Swell Henry no ano passado.
Barnes vai um pouco mais longe no processo de sedimentação de culturas e influências ao assediar uma canção tradicional da Transilvânia em “Laughter in the Dark”, ao visitar os Balcãs em “Europa”, ao dar um salto ao Leste Europeu em “Pastelka on the Train”, e regressando depois à pátria que o pariu e estacionando em Portland, na derradeira “Portlandtown”, de onde se desprendem umas notas de piano a reagir com um banjo acelerado. Mas o acordeão é, sem dúvida, a peça de encaixe de todas estas composições graves, cola que une sem uniformizar ou embrutecer. Dá espaço para os outros instrumentos, como a harpa executada pela mãe de Barnes, e só perde andamento em “Goodbye Great Britain”, que é um número contemplativo, de reverência aos assomos de glitch que andam a impressionar muita gente. Em “The Water Under the Moon” vêm à memória as imagens de Um Violino no Telhado, mas também as das calçadas de Paris sugeridas por Yann Tiersen.
Esse tema e o seguinte, “Our Lady of the Vlatva”, são como interregnos, pausas para descompressão, curtinhos interlúdios no desdobramento cinescópio que é o resto do disco. Este último tem, aliás, uma voz feminina travestida de amarra, anzol, isco lamacento, enfim o registo longínquo, espécie de canto de sereia, de Heather Trost, que também toca violino no álbum. A embriagar os navegantes, a fazê-los abeirar-se do abismo. Gravado numa igreja no coração da Inglaterra e também na Albuquerque natal, Darkness at Noon (belo título) é um disco vagante que abre espaços, percorre trilhos, encharca-se de tipologias de vários pontos cardeais mas que é capaz de aglomerar mais um pouco, de conter mais uma nota. A Hawk and a Hacksaw, designação pilhada de uma tradução do Dom Quixote de Miguel de Cervantes, é confluência de cheiros e coordenadas. Como o são algumas das bandas em que esteve envolvido Barnes, mais os Guignol e menos, por exemplo, os Now It’s Overhead ou Oliver Tremor Control. Caleidoscópio de formas de recorte neotradicionalista que passa n’ O Meu Mercedes É Maior Que o Teu, no Porto, a 10 de Junho, e na Zé dos Bois, em Lisboa, no dia seguinte. A ampola fez mesmo “pop”.
26/05/2005
American Music Club @ Santiago Alquimista, Lisboa
23_05_05
Na hora da autocomiseração farsola, balão de ensaio de seus afectos, Mark Eitzel é ventríloquo de si, caricatura de si, espasmo sedutor da ridicularização de nós, assistida sempre por uma humildade só percebida depois do esgar ou da gargalhada. Sala arranjadinha em baixo, com algumas (muito poucas) clareiras, a varanda superior do Santiago Alquimista a um terço da sua capacidade. E Eitzel ali, o palhacito, de chapéu à avozinho, roupa casual e ténis.
Sempre no seu tom miserabilista delicioso, pediu desculpas por só tocar canções de amor. Pediu desculpas por ser tão lamechas. Quase se desculpou por existir, mas a isso estamos nós habituados. Nada que não esperássemos da figura-mor dos American Music Club, outra vez nas bocas do mundo, dobrada uma década desde a implosão. Em boa verdade, eles nunca estiveram arredados das esferas opinativas, seja por ordem da grandeza dos trabalhos a solo de Eitzel e pela necessária menção na árvore genealógica, seja porque American Music Club é sinónimo de Mark Eitzel. E toda a gente sabe isso.
Foi com o tema que abre o disco novo, Love Songs for Patriots, que inauguraram a noite num arrastado “Ladies and Gentlemen”, depois “Only Love Can Set You Free” e “Patriot’s Heart”, este sobre um “gay strip club” lá do sítio, palavras de Eitzel. Quando ele se dirige à plateia, conta invariavelmente conversas de bares, reais ou inventadas. Como aquela em que um tipo se lhe dirige, muito entusiástico, e pergunta o que ele faz da vida. Que era bibliotecário, respondeu Mark. Não deve ser muito “fulfilling”, diz o outro, e continua a melgar: “Eu sou DJ, faço psychedelic house.” “Fuck off!” foi a resposta. E isso arrancou uma gargalhada à sala lisboeta.
Mark Eitzel é diferente de muitas das vozes da nova geração. Primeiro porque começou mais cedo. Segundo porque leva anos de experiências, vícios, cristianismo de lapela, uma solidão interior muito grande e uma auto-ironia acutilante, como demonstrou em conversa telefónica há um par de anos. Terceiro porque não faz parte de qualquer vaga de redescoberta do hedonismo patente num gajo e numa guitarra. O que fez foi a pulso e o que fez foi muito. É um old–school crooner, se assim lhe podemos chamar. E pertence à casta geracional de outros dois Marks, Lanegan e Kozelek, que, sendo muito diferentes, caminham na mesma estrada de loucos, sozinhos e avessos ao mundo.
Depois de uma hora em que deu para partir uma corda da guitarra, sai com a banda para regressar logo a seguir, debaixo de aplausos. Regressa sozinho com um copo de cerveja a agradecer e sai. Volta com a banda, apresenta-a e juntos tocam um par de temas mais uplifting. Depois, é só ele, acompanhado da guitarra, numa rendição de “Heart and Soul” dos Joy Division. Antes disso, voltou-se de costas para quase todo o auditório para dedicar uma canção às poucas pessoas que estavam em cima, sobre o palco.
No total, tocaram cerca de hora e vinte, fizeram a rotação necessária ao disco que marca o regresso e reafirmaram a genialidade de Mark Eitzel. Genialidade que não se mostra, que não se impõe mas que se vai revelando aos poucos, em cima do palco ou em disco. Há coisas que não se explicam para não se faltar à verdade das experiências. Na recorrência das piadas autopunitivas, na fluidez daquele olhar alcoólico, na efervescência dos sons tirados à guitarra (e ao baixo, à bateria e às teclas) mora uma figura imensa.
Na hora da autocomiseração farsola, balão de ensaio de seus afectos, Mark Eitzel é ventríloquo de si, caricatura de si, espasmo sedutor da ridicularização de nós, assistida sempre por uma humildade só percebida depois do esgar ou da gargalhada. Sala arranjadinha em baixo, com algumas (muito poucas) clareiras, a varanda superior do Santiago Alquimista a um terço da sua capacidade. E Eitzel ali, o palhacito, de chapéu à avozinho, roupa casual e ténis.
Sempre no seu tom miserabilista delicioso, pediu desculpas por só tocar canções de amor. Pediu desculpas por ser tão lamechas. Quase se desculpou por existir, mas a isso estamos nós habituados. Nada que não esperássemos da figura-mor dos American Music Club, outra vez nas bocas do mundo, dobrada uma década desde a implosão. Em boa verdade, eles nunca estiveram arredados das esferas opinativas, seja por ordem da grandeza dos trabalhos a solo de Eitzel e pela necessária menção na árvore genealógica, seja porque American Music Club é sinónimo de Mark Eitzel. E toda a gente sabe isso.
Foi com o tema que abre o disco novo, Love Songs for Patriots, que inauguraram a noite num arrastado “Ladies and Gentlemen”, depois “Only Love Can Set You Free” e “Patriot’s Heart”, este sobre um “gay strip club” lá do sítio, palavras de Eitzel. Quando ele se dirige à plateia, conta invariavelmente conversas de bares, reais ou inventadas. Como aquela em que um tipo se lhe dirige, muito entusiástico, e pergunta o que ele faz da vida. Que era bibliotecário, respondeu Mark. Não deve ser muito “fulfilling”, diz o outro, e continua a melgar: “Eu sou DJ, faço psychedelic house.” “Fuck off!” foi a resposta. E isso arrancou uma gargalhada à sala lisboeta.
Mark Eitzel é diferente de muitas das vozes da nova geração. Primeiro porque começou mais cedo. Segundo porque leva anos de experiências, vícios, cristianismo de lapela, uma solidão interior muito grande e uma auto-ironia acutilante, como demonstrou em conversa telefónica há um par de anos. Terceiro porque não faz parte de qualquer vaga de redescoberta do hedonismo patente num gajo e numa guitarra. O que fez foi a pulso e o que fez foi muito. É um old–school crooner, se assim lhe podemos chamar. E pertence à casta geracional de outros dois Marks, Lanegan e Kozelek, que, sendo muito diferentes, caminham na mesma estrada de loucos, sozinhos e avessos ao mundo.
Depois de uma hora em que deu para partir uma corda da guitarra, sai com a banda para regressar logo a seguir, debaixo de aplausos. Regressa sozinho com um copo de cerveja a agradecer e sai. Volta com a banda, apresenta-a e juntos tocam um par de temas mais uplifting. Depois, é só ele, acompanhado da guitarra, numa rendição de “Heart and Soul” dos Joy Division. Antes disso, voltou-se de costas para quase todo o auditório para dedicar uma canção às poucas pessoas que estavam em cima, sobre o palco.
No total, tocaram cerca de hora e vinte, fizeram a rotação necessária ao disco que marca o regresso e reafirmaram a genialidade de Mark Eitzel. Genialidade que não se mostra, que não se impõe mas que se vai revelando aos poucos, em cima do palco ou em disco. Há coisas que não se explicam para não se faltar à verdade das experiências. Na recorrência das piadas autopunitivas, na fluidez daquele olhar alcoólico, na efervescência dos sons tirados à guitarra (e ao baixo, à bateria e às teclas) mora uma figura imensa.
Us3 - Questions
Us3/Kudos Records
Rating: 8/10
There is a growing trend of jazz and hip-hop revivalism happening as we speak. From Mike Ladd’s Negrophilia to the exciting records that Soul Jazz Records is putting out, this may become the year when it is again fun to merge two apparently unrelated languages, as opposed to last year’s freak folk of Banhart and Six Organs of Admittance. Jazz and hip-hop have one thing in common to start with: it is hard to come up with a definition to describe both genres. When asked what jazz was, veteran musician Louis Armstrong had this to say: “If you still have to ask… shame on you.”
Us3 is a soul meets jazz meets hip-hop (and everything in between) project, commissioned by London-based Geoff Wilkinson, and its first US album in seven years, the appropriately titled Questions, is no exception to that ongoing symbiosis of genres. Formed in 1992, Us3 had since relied on sampling jazz tracks and meshing them with beats and breaks from various origins as their basic hub of work, and in that Blue Note had always occupied a central stage – until they gathered enough material to release their third album, An Ordinary Day in an Unusual Place. Initially meant to be issued on Sony, you know how the story ends: legal issues led to a two-year delay and the record ended up being released in Europe and Japan in 2001 and available as import-only in the US.
Partially because of that, and, Wilkinson says, as they are now more fond of working with “live musicians rather than dead ones,” Questions is their first sample-free record. This is to a great result, judging from the first track, “A New Beginning”, an instrumental two-minute take on ambient sounds to help digest the eclectic cauldron ahead. When the piano erupts from the trumpet-led track that is “Watcha Gonna Do?”, anticipating the soft and warm voice of South African Mpho, you know that you are holding a soothing album to accompany you throughout the year.
Its soul-searching kick is what gives this record enough ambience to delve into late-night, sax-driven tepid waters where romance can truly emerge. Reggi Wyns, just another affiliate of Us3’s rotating vocalists, first appears when “What Does That Mean?” comes to a start. Wyns is what I like to call a rap crooner, coming all the way from Brooklyn to embellish this distinctive melting pot. Also a distinguished actor, having appeared in Serendipity and Law and Order, Wyns has also recorded with New York crew LIB and is the break beat counterpart to the nu soul-influenced vocal work of Mpho.
The mash up between the two and other guests is perfect. The music never gets boring because they know how to cleverly mix styles, topping a new form of bastardized pop that has everything to evolve and influence. Latin and drum ‘n’ bass elements resonate throughout the tracks like a sharpened blade cutting through butter. “Why Not?” is so strongly-rooted in a studio-like performance, with all Wyns’ rap manners intertwined with the flutes, that the Us3 themselves would struggle to out-trump it when performing live, especially with a different line-up.
Some tracks here are assumedly cut from the same cloth, “Cantaloop 2004: Soul Mix” and its bossa mix equivalent (check out us3.com for an animated video of the former) being the most notorious examples, but the album rarely concedes to its stylistic parameters, instead expanding from those hot spots. The best parts come with the faint chalk sketching of “Give Thanks” and “The Healer.” There is indeed an unfinished sympathy about them, as Massive Attack would state. Although there is nothing here likely to significantly challenge our perspective on nu-jazz, Questions represents all that is done well when mixing diverse styles.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=156331282442848bff0b770
Rating: 8/10
There is a growing trend of jazz and hip-hop revivalism happening as we speak. From Mike Ladd’s Negrophilia to the exciting records that Soul Jazz Records is putting out, this may become the year when it is again fun to merge two apparently unrelated languages, as opposed to last year’s freak folk of Banhart and Six Organs of Admittance. Jazz and hip-hop have one thing in common to start with: it is hard to come up with a definition to describe both genres. When asked what jazz was, veteran musician Louis Armstrong had this to say: “If you still have to ask… shame on you.”
Us3 is a soul meets jazz meets hip-hop (and everything in between) project, commissioned by London-based Geoff Wilkinson, and its first US album in seven years, the appropriately titled Questions, is no exception to that ongoing symbiosis of genres. Formed in 1992, Us3 had since relied on sampling jazz tracks and meshing them with beats and breaks from various origins as their basic hub of work, and in that Blue Note had always occupied a central stage – until they gathered enough material to release their third album, An Ordinary Day in an Unusual Place. Initially meant to be issued on Sony, you know how the story ends: legal issues led to a two-year delay and the record ended up being released in Europe and Japan in 2001 and available as import-only in the US.
Partially because of that, and, Wilkinson says, as they are now more fond of working with “live musicians rather than dead ones,” Questions is their first sample-free record. This is to a great result, judging from the first track, “A New Beginning”, an instrumental two-minute take on ambient sounds to help digest the eclectic cauldron ahead. When the piano erupts from the trumpet-led track that is “Watcha Gonna Do?”, anticipating the soft and warm voice of South African Mpho, you know that you are holding a soothing album to accompany you throughout the year.
Its soul-searching kick is what gives this record enough ambience to delve into late-night, sax-driven tepid waters where romance can truly emerge. Reggi Wyns, just another affiliate of Us3’s rotating vocalists, first appears when “What Does That Mean?” comes to a start. Wyns is what I like to call a rap crooner, coming all the way from Brooklyn to embellish this distinctive melting pot. Also a distinguished actor, having appeared in Serendipity and Law and Order, Wyns has also recorded with New York crew LIB and is the break beat counterpart to the nu soul-influenced vocal work of Mpho.
The mash up between the two and other guests is perfect. The music never gets boring because they know how to cleverly mix styles, topping a new form of bastardized pop that has everything to evolve and influence. Latin and drum ‘n’ bass elements resonate throughout the tracks like a sharpened blade cutting through butter. “Why Not?” is so strongly-rooted in a studio-like performance, with all Wyns’ rap manners intertwined with the flutes, that the Us3 themselves would struggle to out-trump it when performing live, especially with a different line-up.
Some tracks here are assumedly cut from the same cloth, “Cantaloop 2004: Soul Mix” and its bossa mix equivalent (check out us3.com for an animated video of the former) being the most notorious examples, but the album rarely concedes to its stylistic parameters, instead expanding from those hot spots. The best parts come with the faint chalk sketching of “Give Thanks” and “The Healer.” There is indeed an unfinished sympathy about them, as Massive Attack would state. Although there is nothing here likely to significantly challenge our perspective on nu-jazz, Questions represents all that is done well when mixing diverse styles.
http://www.lostatsea.net/review.phtml?id=156331282442848bff0b770
22/05/2005
AGF/Delay + Jamie Lidell : entrevista
No início do ano passado foram os To Rococo Rot a invadir a estação de metro da Baixa-Chiado, em Lisboa. Este ano, por ocasião da Noite dos Museus, em serão de final da Taça UEFA, recebemos duas das propostas mais vivas da electrónica que ocupa um lugar de nenhures. Antye Greie-Fuchs, que costuma gravar com a sigla AGF, berlinense de gema, enamorou-se por Vladislav Delay, o produtor que veio do frio. Natural da Finlândia, ele junta-se assim a uma das peças do puzzle Laub para a edição conjunta de Explode. O duo apresenta-se, uma vez mais ao vivo mas agora acompanhado pelo compositor Craig Armstrong, a 4 de Junho próximo, dia em que arranca a segunda edição de Serralves em Festa, no Porto.
Na noite que deixou um amargo de boca dentro das quatro linhas, houve ainda tempo para ouvir o gingão de serviço, o very british Jamie Lidell, uma caixa de fazer ritmos que deve ter deixado grande parte da socialite, que se concentrava nos jardins do Museu Nacional de Arte Antiga, de boca aberta. As conversas reproduzem-se a seguir.
Como é que se conheceram e porque decidiram trabalhar juntos?
Delay – Conhecemo-nos há quatro, cinco anos numa feira de música. Sentimos que podíamos dar muito um ao outro. Já conhecíamos os trabalhos do outro e decidimos fazer algo juntos. Era uma coisa que há muito fazia parte dos nossos planos mas que só agora se concretizou.
AGF – Mantemos uma relação amorosa, para além da relação artística. Eu amo-o mas sabemos separar as coisas quando se trata de trabalhar.
Delay – Temos uma relação estável e isso, de certo modo, permite-nos fazer o que queremos, artisticamente.
O que querem dizer quando afirmam que este disco é dedicado à Natureza?
AGF – Passámos dois meses no norte da Finlândia no mais completo isolamento. Atravessámos fronteiras, viajámos muito de carro, chegámos a ter uns problemas com a matrícula, que era alemã. Foi por essa altura que decidimos fazer este disco e mostrar de que forma vivemos esses dias.
Delay – Sim, como é estar rodeado de Natureza, sem contactos com o exterior. Depois desses dois meses, as vozes e os sons tornaram-se mais claros para nós, mais límpidos. Quando regressámos à Alemanha, tentámos incorporar no disco tudo isso que tínhamos sentido. Foi uma experiência muito maior e mais enriquecedora do que qualquer outra coisa que tenha vivido até então.
No vosso set de ontem e também no disco que gravaram em parceria, sinto uma certa economia de palavras. Concordam?
AGF – Humm… nem por isso. Às vezes, até sinto que elas são demais. Inspiro-me em livros, filmes mas também no que se passa à nossa volta.
Delay – Não queremos passar mensagem política, embora por vezes se pense que sim. Eu sou do tipo informativo, gosto de ler jornais e livros, gosto de estar informado.
AGF – No hip hop é diferente, claro. Aqui tentei usar as palavras que surgiam da colaboração artística e da relação que nós os dois mantemos. A observação, o detalhe são fundamentais na escrita de palavras, na abordagem de assuntos. As viagens desempenham, com os livros e os filmes, um papel central no florescimento das ideias que queremos explorar. Quando ainda andava a estudar, lia livros com uma frequência tal que aproveitava o caminho para a escola para ler mais. Depois deixei de ler e voltei-me para a música. Foi ele que me recuperou o gosto pela leitura. Gosto muito de autobiografias, por exemplo.
Há aquela música, que de resto tocaram ontem, “Explode Baby”, que parte de uma reportagem sobre uma bombista suicida…
AGF – Sim, o que tentei fazer com essa música foi pôr-me no lugar dessa mulher, perceber o que ela sentiu, lidar com a violência, perceber o que a levou a fazer aquilo, no fundo compreender tudo o que está por detrás de um acto desses. E quais eram os meus sentimentos perante isso, as minhas emoções. Mas sempre sem julgar nem me transformar em mensageira política, não é disso que se trata.
Por vezes, a tua voz parece vir de um fio de raciocínio muito rápido, quase instantâneo… Mas voltando ao disco, ele foi depois gravado em Berlim. Sentem que há uma comunhão entre os elementos rurais da Finlândia e a urbe?
AGF – Humm… Mesmo em Berlim estivemos sempre afastados do rebuliço. Gravámos num sítio recatado, longe da confusão do centro da cidade. Tivemos muito sossego, muito espaço para gravar. Não acho que haja muita pulsação urbana neste disco.
Delay – Em Berlim também estive isolado. Eu não socializo, nunca vou a festas, clubes, bares ou coisas desse género.
[Pausa para comentar o marisco.]
AGF – Isto é um enorme desafio para mim, conseguir tirar o marisco da concha…
Delay – Confesso que o meu estômago é muito sensível. Se eu comesse isso, deitava logo tudo fora. Não como carne e só gosto de certos tipos de peixe. Se eu comesse essas coisas, o meu estômago ia parecer uma máquina de lavar roupa, às voltas.
Vocês tendem a desviar-se dos métodos mais tradicionais de fazer música electrónica. Consideram-se um duo disciplinado?
Delay – Não, de todo. É importante para nós que a música soe humana e não maquínica. Que haja elementos quentes, humanos na música que fazemos. Por isso, tentamos sempre que a nossa proposta seja tudo menos previsível ou temporizada, do tipo “isto vai acontecer assim, e depois entra isto” e está tudo programado ao milímetro, beat por beat. Isso não nos interessa, gosto de coisas fluidas. Talvez seja por causa disso que as pessoas dizem que não vamos atrás das formas tradicionais da electrónica. Costumam referir-se a nós como downtempo e isso não me incomoda. Percebo a necessidade de compartimentar as coisas para tornar mais fácil a assimilação. Mas, em resumo, a música é feita por seres humanos, portanto acho que toda ela, de uma forma ou de outra, tem traços humanos. Não podemos escapar a isso.
AGF – Consigo perceber o que perguntas. Acho que há o risco de alguma dessa música soar pouco emotiva, muito fria e distante. Não quero fazer música de amor mas penso que a poesia tem uma importância tremenda na forma de te expressares. Se for bem feita, a música encontra sempre maneira de ir ter contigo, de te tocar. Temos o noise, por exemplo, que apesar de tudo soa muito refrescante.
[Neste ponto da conversa, do outro lado da mesa, Jamie Lidell compara o marisco a cera do ouvido.]
Delay, tu começaste como percussionista jazz. O que guardas desses anos de formação?
Delay – É óbvio que a minha formação foi estruturante do trabalho que tenho vindo a desenvolver, quer sozinho, quer neste projecto com a Antye, quer nos projectos futuros que venha a ter. Para este disco, e talvez por isso ele soe tão natural, o trabalho de bateria assume realmente alguma importância, sobretudo porque ela é tocada em vez de ser manipulada. A grande diferença é que agora o meu trabalho está comparativamente mais exposto.
Continuas interessada em levar a música para um universo audiovisual?
AGF – Sim, sim. É algo que sempre gostei de fazer. Já fiz instalações e estive envolvida noutros projectos multimédia. Esse é o meu plano de reforma. (risos) Não, isso da reforma veio de uma conversa ontem com o Jamie. Mas, neste momento, estou a trabalhar em cinco discos. Tento fazer isso muito devagar, entrar aos poucos.
Vão-se embora de Portugal ainda hoje?
AGF – Sim, mas voltamos já daqui a duas semanas para uma actuação no Porto, em Serralves, ao lado de Craig Armstrong.
Jamie Lidell é um músico que se não existisse, dificilmente seria inventado. Produtor britânico, que tanto tem de incompreendido como de admirado, colaborou com Cristian Vogel no projecto Super_Collider em 1999, e com Matthew Herbert. A sua música, verdadeira artilharia sonora banhada a techno de muitos quilates e ainda mais decibéis, foi testada na noite de quarta-feira, logo a seguir ao duo AGF/Delay. Como, no dia seguinte, também se sentou à mesa da marisqueira da Almirante Reis, reproduzimos aqui uma breve e descontraída conversa com o homem, escrevinhada de improviso.
Fiquei impressionado com o concerto de ontem à noite. A primeira coisa que me ocorreu para descrever aquilo que fizeste foi “human beatbox”…
Sim, sim. É isso que lhe chamo, “human beatbox” [começa a improvisar falando para o microfone do gravador]. Deixas sair tudo da tua boca, há tanta merda que podes dizer. É muito divertido. Quando era pequeno, costumava cantar por cima dos discos [canta num tom muito agudo]. É uma energia tremenda, é o que a Missy Elliott anda a fazer. Não gostei muito da minha actuação de ontem, não encontrei uma direcção. Os meus últimos concertos foram diferentes, foram óptimos. Deixo passar para a música o que me vai passando pela cabeça. Gosto de sentir logo uma reacção do público. Se fico sozinho, sinto-me perdido.
Achas difícil encontrar uma direcção na tua música?
Como disse, tem tudo a ver com a comunicação entre mim e o público. Se encontro um caminho, as coisas acontecem, limito-me a actuar. Tento nunca deixar que os sons se tornem aborrecidos, tento encontrar um bom groove e explorá-lo durante muito tempo. Isso é que é o techno. Se a minha imaginação se esgotar, deixo de o fazer. Mas quando fazes um mau show, aprendes muito mais. É bom aprender.
Usas muito os erros que cometes na tua música?
Sim, os erros estão por toda a parte. Tanto quanto sei, os erros fazem parte da vida.
Em relação ao teu disco, vai sair em Junho…
A 13 de Junho. Chama-se Multiply e é composto por dez canções. Não há desperdícios neste álbum. São dez diferentes direcções mas que têm algo em comum. São muito intensas, muito extremas. No conjunto, funcionam todas como um livro, mas é sempre o mesmo livro. É como um exercício para mim, uma coisa que me dá gozo, como um groove da Motown. É tudo muito real. Aprendi muito a fazer este disco.
Pedro Santos (Flur) – Vais levar este disco para cima do palco?
Não, ainda não. Não tenho dinheiro para isso. Fiz algumas datas em Paris com uma série de gente, incluindo a Feist. Quando ela se aproxima do microfone, é como que um super poder que se forma. E depois há mais gente…
Uma espécie de techno big band…
Sim, incorpora um pouco de tudo, jazz, indie rock… A Feist é mais nessa onda, do indie rock. Uma canção dela foi single do mês na loja de música do iTunes, imagina. Ela está a atravessar fronteiras, tem uma voz muito doce.
Levas uma setlist contigo quando vais actuar?
Sim, mas ontem não olhei para ela. Talvez devesse ter feito isso. (risos) Nunca mais toco sem olhar para a setlist. Aprendi a minha lição, aprendi a lição.
Foram o quê, 90 minutos?
Não.
Pedro Santos – Não, acho que foi à volta de uma hora.
Mas pareceram 90 minutos… [solta um grunhido para o gravador]
Começaste a receber mais atenção por parte dos media quando colaboraste numa compilação da etiqueta Mille Plateaux – e depois com os Super_Collider…
[Pensa um pouco] Isso foi há muito tempo. Bom, há várias formas de as pessoas me encontrarem, de me conhecerem. Gosto das abordagens enigmáticas, sem rosto. É algo que aprecio muito. É como com os Boards of Canada, eles nunca tocam ao vivo. Há muita gente a pedir-lhes que toquem mas eles recusam-se. Com este disco estou a lutar pela platina, pela tripla platina. (risos) Se não conseguir, desisto. Estou a gozar, não me preocupo com isso. Os tipos do The Guardian falaram bem de mim e isso é o que importa.
Ao falares em música sem rosto, consideras a tua música inumana?
Não, não com este disco. Multiply é extremamente humano, é como um disco ao vivo. Trabalho com uma equipa muito boa.
[O Bodyspace assistiu à actuação do duo AGF/Delay e de Jamie Lidell a convite da distribuidora Flur.]
http://www.bodyspace.net/entrevistas.php?ent_id=41
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