28/08/2008
Nas - Nas
Ao nono álbum, Nas volta a fazer sentido fora dos limites de Nova Iorque, depois de anos a atravessar um deserto de ideias em que pregou essencialmente aos peixes. O álbum de estreia "Illmatic" fazia do rapper de Queens o legítimo herdeiro do hip-hop de causas na costa leste dos Estados Unidos. Quase uma década e meia depois, o poeta do gueto investe em rimas que deixam de ser apenas para consumo interno. Pelo meio, foi acusado de ser um vendido por causa de edições com grandes cedências comerciais e alimentou alguma guerrilha dentro do circuito.
O maior rival foi Jay-Z numa altura em que o insulto fazia vender mais papel do que a música. Mas Nasir Jones, o verdadeiro nome de Nas, sempre soube rodear-se de produtores da velha escola como Pete Rock e Large Professor e nunca abandonou verdadeiramente a disciplina de rua. Em 2001, editava o álbum que se pretendia de reconciliação com o passado, "Stillmatic", e em que respondia aos ataques dos outros. Cinco anos depois, a trégua foi selada através de um contrato com a Def Jam, a editora de Jay-Z, que também lança agora este disco homónimo.
Nas volta então a inscrever-se na facção mais militante do hip-hop, longe dos Roots dos 90, mais interessados no lado lúdico do jazz, mas muito próximo dos Dead Prez, empenhados em mostrar o dedo do meio a um sistema capitalista e opressor. De resto, stic.man, uma das metades do duo da Florida, participa em 'Untitled', enquanto Busta Rhymes faz o seu número no ataque às cadeias de comida rápida, em 'Fried Chicken'. Antes disso, 'You Can't Stop Us Now' já recuperava o enorme legado R&B dos Stylistics e a palavra falada dos Last Poets.
Os fundamentalistas vão certamente ler no par de canções orelhudas, 'Make the World Go Round' e 'Hero', mais uma concessão de Nas às lógicas do mercado. Mas os puristas mais quadrados nunca mereceram ser levados a sério. 'America' fala como nenhuma outra da questão racial porque junta letras certeiras e actuais a uma cama rítmica onde apetece mesmo deitar. Nesse tema, Nas fala por exemplo sobre as quotas de negros na NASA, a discriminação das mulheres e ainda sobre um país ferido de morte na sua capacidade de gerar sonhos.
A culpa é da dieta de propaganda servida pela cadeia de televisão Fox (é conferir 'Sly Fox') e de um sistema judicial podre por dentro ('Testify'). Mas Nas está longe de ser um fatalista e termina o disco a insuflar esperança. É que a América está muito diferente. Bush fez dela uma das nações mais odiadas do mundo. E o discurso de mudança vem de um homem que, se os astros se alinharem, será o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos. É sobre isso que Nas canta em 'Black President', num relato mais desassombrado do que o resto do álbum.
http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=384
26/08/2008
Especial: Reggae Clássico
Não há como escapar: as origens do reggae confundem-se com a história da Jamaica. Perdida no mar das Caraíbas, a sul de Cuba, a ilha é a pátria desse descomplexado estilo de música popularizado por Bob Marley. Uma análise aturada do fenómeno situa as raízes mais fundas no R&B de Nova Orleães, nos Estados Unidos. Quando tentam esgravatar na procura de pedaços de história, os entusiastas do reggae deparam-se sempre com um problema: na Jamaica não há factos, há em abundância versões diferentes da mesma história.
Talvez mais do que qualquer outro, este estilo de música é também um estilo de vida. Por volta de 1960, os músicos jamaicanos começaram a apurar o ska, uma derivação mais festiva do R&B que chegava dos EUA via rádio a pilhas. Os locais chamavam ao ska qualquer coisa como R&B do avesso, uma transgressão que atravessou facilmente o Oceano Atlântico até ao Reino Unido mas que mais dificilmente voltou ao epicentro de Nova Orleães.
Por sua vez, foi de uma ligeira desaceleração do ska que brotou o reggae. Na certidão de nascimento pode ainda ler-se que o género terá surgido nos bairros de lata de Kingston. Entretanto, florescia nas ruas da capital jamaicana uma geração de DJs que actuavam ao ar livre com os chamados “sound systems”. Eles foram decisivos para o lento despontar de uma indústria de gravação e produção de discos. No final dos anos 50, surgiam a R&B Records, precursora da mítica editora Island, e a West Indies Records, esta pelas mãos do futuro primeiro-ministro jamaicano Edward Seaga.
Com o ska cada vez mais popular, a descendência não pára de crescer. A voz chega-se à frente, o ritmo torna-se mais lento e eis que nasce o rocksteady. Mas se este tinha a disciplina da pop feita por brancos, o reggae insistia em faltar ao baile de formatura. A sua preocupação foi, desde muito cedo, inscrever-se num certo espiritualismo que há-de dever muito aos espirituais negros da América opressora. É então que a comunidade rastafari adopta o reggae como uma espécie de candeia numa sociedade cada vez mais fragmentada.
A Jamaica, que se tornara independente da coroa inglesa em 1962, falhava as promessas sociais e o reggae tornava-se mais político. Recorde-se que os rastafaris acreditavam que um rei negro seria coroado em África e libertaria as tribos perdidas da Babilónia. É em terras sedentas de liberdade que o reggae encontra pasto para arder, consumindo-se em apelos à paz e, aqui e ali, de dedo em riste apontado ao regime. Ao mesmo tempo, os antigos colonizadores apropriavam-se agora do som que chegava da Jamaica, tornavam-no mais agressivo e deixavam em solo britânico as sementes do punk rock.
Para continuar a ler sobre as origens do reggae, Bob Marley, Lee Perry (na foto), Peter Tosh e a Trojan Records, clicar aqui.
Para ouvir uma rádio programada com clássicos do reggae, clicar aqui.
Os Gully - Os Gully EP
Num mercado de música ainda acometido por uma excessiva magreza, é sempre de louvar que uma banda siga em contra-corrente e edite em nome próprio. Com a enorme vantagem de uma liberdade criativa sem amarras e a inevitável desvantagem de uma distribuição escassa, as edições de autor são um grito na pacatez de uma indústria que raramente consente riscos. Infelizmente, também falta aos projectos independentes algum jogo de cintura para encaixar uma crítica mais desfavorável.
Toda esta conversa seria desnecessária se este país não se chamasse Portugal e não passasse parte do tempo a lamber feridas. A bem da nação, sublima-se a escrita na língua de Camões e faz-se disso bandeira, ainda que a música não ultrapasse a marca do sofrível. É o caso deste primeiro EP dos Gully, que assenta essencialmente na linguagem de guitarras afinadas nos anos 70. Foi, de resto, nesta década que o quinteto de Azeitão cavou influências, mais na escola Deep Purple do que na de Jimi Hendrix.
São cinco temas, mais um radio edit de 'Estou Preso', de uma xaropada revivalista de gente que parou no tempo. Nada contra olhar para trás e lançar perspectiva sobre o presente. Afinal, a música é também e sobretudo memória. O problema é que os Gully não se conseguem decidir entre um rock sinfónico e um registo de pop pegajosa. As mais das vezes, ficam-se por uma beatice asfixiante amplificada por letras como "na ombreira da porta/ à entrada da igreja/ numa aldeia morta/ procuro onde esteja".
Logo aí, em 'Corpo Sem Sombra', se percebe que eles vêm de uma linhagem que faz do solo de guitarra o altar do virtuosismo. E a voz de Pedro Veiga aproxima-se perigosamente da de Axl Rose (ouça-se o arrastado 'Reencontro'). As rimas são, no mínimo, desinspiradas e ficam entre o piegas e o piroso. Como em "apareço de surpresa/ em corpo de inocência/ conforto e dou defesa/ não sou só de aparência". Em resumo, é um EP que passa mas não fica. Pode tocar em casa mas não é por ele que deixamos queimar a comida que está ao lume.
http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=382
23/08/2008
Zane Tate - Boom Bap Sunrise
Leisure Lab
The sunrise is that moment of the day when anything seems possible, especially after a night with no sleep at all. The body is so tired and the mind so far beyond numb, that time is decomposed in numerous shades, none of which is fully apprehended by the casual partygoer. Zane Tate's first volume of his "Boom Bap Sunrise: Rural Sounds" is the perfect soundtrack to that elliptical time when it's neither dark nor bright, even if the atmosphere feels more urban than rural.
A blend of downtempo textures and broken beat kicks infused with the finest instrumental hip-hop, this album is up any music gourmet's alley. The way it was composed adds that extra push to help create the right ambience: in the producer's own words, "a lot of the songs on this record were written in early morning hours before the sun came up over the mountains by my house".
These tracks do sound executed by sleepless hands; they don't belong to any time in particular but to all times at once. The bizarre pounding sound that you hear throughout "Belly" is the Treasure Island equivalent to a night out at any Afro-Cuban bar in a big city. Halfway through it, "For the Love" has a Middle Eastern vibe that deserves a clamorous reception. And for those chill nights alone at home, "Harbor View" is like that familiar portrait over the fireplace that never fails to comfort you.
Sometimes boldly jazzy ("Hearts & Minds"), other times reminiscently folksy ("Just Wanted to Say"), the record started to grow in Zane Tate's head after producing a digital release for the label Working Beats in 2005. The final number is a macroscopic revision of the second track, "Star Slide", where all elements are maximized by the dope scratching treatment that former label-mate Green Cigar gives the original version.
All in all, "Boom Bap Sunrise" is as suitable for night-driving as it is to greet the dawning of a new day. Its repetitive, circular patterns let in all sorts of moods and manners, making it the proper sonic mattress to the attention deficit state you're in after some tequila-pouring excess. It's glamorous and it's raw like the painting it tries to sketch with sounds instead of colors.
http://www.properlychilled.com/music/release/profile.php?view=602
The sunrise is that moment of the day when anything seems possible, especially after a night with no sleep at all. The body is so tired and the mind so far beyond numb, that time is decomposed in numerous shades, none of which is fully apprehended by the casual partygoer. Zane Tate's first volume of his "Boom Bap Sunrise: Rural Sounds" is the perfect soundtrack to that elliptical time when it's neither dark nor bright, even if the atmosphere feels more urban than rural.
A blend of downtempo textures and broken beat kicks infused with the finest instrumental hip-hop, this album is up any music gourmet's alley. The way it was composed adds that extra push to help create the right ambience: in the producer's own words, "a lot of the songs on this record were written in early morning hours before the sun came up over the mountains by my house".
These tracks do sound executed by sleepless hands; they don't belong to any time in particular but to all times at once. The bizarre pounding sound that you hear throughout "Belly" is the Treasure Island equivalent to a night out at any Afro-Cuban bar in a big city. Halfway through it, "For the Love" has a Middle Eastern vibe that deserves a clamorous reception. And for those chill nights alone at home, "Harbor View" is like that familiar portrait over the fireplace that never fails to comfort you.
Sometimes boldly jazzy ("Hearts & Minds"), other times reminiscently folksy ("Just Wanted to Say"), the record started to grow in Zane Tate's head after producing a digital release for the label Working Beats in 2005. The final number is a macroscopic revision of the second track, "Star Slide", where all elements are maximized by the dope scratching treatment that former label-mate Green Cigar gives the original version.
All in all, "Boom Bap Sunrise" is as suitable for night-driving as it is to greet the dawning of a new day. Its repetitive, circular patterns let in all sorts of moods and manners, making it the proper sonic mattress to the attention deficit state you're in after some tequila-pouring excess. It's glamorous and it's raw like the painting it tries to sketch with sounds instead of colors.
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22/08/2008
Get Funky with Del
Beatsource and Monolith Present: Get Funky With Del.
Win VIP tickets to meet Del The Funky Homosapien at The Monolith Festival, September 13-14, 2008 held in Morrison Colorado.
Read on for full contest details.
21/08/2008
The Boggs - Forts
No Inverno de 2001, os Boggs tocavam nas esquinas das ruas e nas estações de metro de Brooklyn. Enquanto isso, os Liars mudavam-se para Nova Iorque e ajudavam a definir uma nova cena pós-punk de inspiração freak e experimental. Por alguma razão alguém deu à coisa o nome de "new weird America". A aproximação de uns e outros faz sentido porque Julian Gross, dos Liars, ajudou na produção deste "Forts", tal como Christian Obermaier, dos SchneiderTM.
Este é um disco de quem está de bem com a vida ou pelo menos esforça-se por mostrar isso. Agora em Berlim, Jason Friedman (os Boggs são ele mais uns convidados) mostra como a folk, o disco e a sujidade própria do garage rock podem andar juntos numa mesma canção sem se canibalizarem. A faixa de abertura, com o título do álbum, lembra os Animal Collective de "Sung Tongs" e, mais adiante, 'Remember the Orphans' amplia essa vocação tribal.
As palminhas dos dois primeiros temas dão lugar a uma desgarrada de sininhos e instrumentos de sopro em 'Little Windows', que é dona de um viciante apelo pop. E depois temos cordas a pingar mel com a entrada de Heather D'Angelo, das Au Revoir Simone, em 'One Year On'. A marcação do terreno mais disco, mas ainda com as guitarras a mandar, começa em 'Bookends' e só termina em 'Melanie in the White Coat', altura em que o disco perde o rumo.
As três últimas faixas, descontando o tema-bónus 'After the Day' na versão de Heather, parecem sobras das sessões de gravação: uma mais apunkalhada ('If We Want (We Can)'), outra de vibração folk com bolas de espelhos ('Poor Things') e uma outra que, em pouco mais de um minuto, não diz grande coisa ('Holiday'). Mas como é de Boggs que se fala, são boas sobras ainda que façam o resto do disco empalidecer um pouco.
Contas feitas, a primeira meia-hora de "Forts" é surpreendentemente equilibrada e vem recheada de boas canções que tocam tudo, da vertigem punk dos Wire à pop desnatada dos Fall. Depois vem algum desnorte mas tudo se perdoa, sobretudo quando os Liars estão em período de pousio de estúdio e vão acumulando o pó da estrada. E claro, os Boggs só não são maiores porque o mundo anda distraído.
http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=381
The Subways - All or Nothing
O rock dos Subways é sem espinhas, está tudo no sítio e o coração deles está do lado certo. O problema é que ainda conservam tiques de adolescentes que tentam salvar o mundo em três minutos. Nota-se aqui o dedo de Butch Vig, responsável pela produção de um dos álbuns mais míticos dos anos 90 (e de sempre), o "Nevermind" dos Nirvana. "All or Nothing" é um disco competente e certinho mas não deixa de se inscrever num panorama rock a precisar de sopas e descanso.
Não se pense por isso que o trio de jovens músicos não subiu a pulso e não merece tudo de bom que lhe possa acontecer. Sujeitos na puberdade a uma dieta que foi desde os Ramones aos Pixies e aos Mudhoney, eles até podem soar tenrinhos como os australianos The Vines, mas já fazem da ressaca do grunge uma curva no tempo em vez de se curvarem a um tempo que já foi e não volta mais. E isso percebe-se nas primeiras três, quatro canções, centradas na guitarra, no baixo e numa bateria cujas baquetas apontam em frente.
Mas depois vem 'Move to Newlyn', um número de circo choninhas que se debulha em lamentos baladeiros, com direito a coros femininos em fundo. Deve ser qualquer coisa nos genes destas bandas que não resistem a uma ou outra deambulação electro-acústrica, como que a provar que também são capazes de tocar mais desligados da corrente. Acaba por ser um peso-morto que põe água na fervura quando o álbum seguia à temperatura certa.
Para compensar, depois há um par de canções mais aguerridas, 'I Won't Let You Down' e 'Turnaround', e o rock volta a conjugar-se com perigo e urgência. Chegados a 'Strawberry Blonde', o desespero agarra-se a nós como lapa à rocha. Percebemos então que um disco de apelo mais punk do que pop foi enxertado com duas ou três cançonetas mariquinhas para mostrar às namoradas.
Ouve-se por aqui uma segunda voz, a da baixista Charlotte Cooper, que, com mais asfalto em cima, há-de chegar a rasgos mais felinos que o trio anda a precisar. E se foi pela produção que começámos, é por ela que vamos terminar. Butch Vig parece refrear um pouco a atitude pseudo-incendiária própria da idade. E isso faz acreditar que, enquanto estiverem bem acompanhados, os Subways lá se irão aguentando. O mal é que bandas assim, saídas da adolescência, costumam perder-se pelo caminho, sobretudo se o barulho das luzes começar a ouvir-se na garagem.
http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=380
José Cid - Ao Vivo no Campo Pequeno
Palco de touradas na capital do Reino, o Campo Pequeno já nos foi habituando a tristes espectáculos. Este foi só mais um. Mas em José Cid a barbárie é mais ao nível dos ouvidos do que no plano visual. Aos olhos o que se apresenta é o que se conhece de há vários anos: os óculos escuros, o cabelinho com risco ao lado, um piano e um ocasional par de velas. E aquele sorriso de quem sabe mais do que diz. Justiça seja feita ao homem, no meio de todo aquele kitsch, ele também não resiste à paródia de si. E isso é de louvar, até porque poupa trabalho aos críticos.
Numa edição que ultrapassa largamente as três horas, repartidas por um DVD, com o registo do concerto, uma faixa-bónus ('Favas com Xóriço') e uma entrevista, e por um disco generosamente recheado de êxitos, a música é alfinetada atrás de alfinetada e quase dá vontade de fugir do país. Há imagens que, por força de artistas como ele, não descolam de Portugal, por exemplo, a de um povo à espera de um qualquer Messias. Ouça-se a 'Lenda d'El Rey D. Sebastião' com aquelas gaitinhas em fundo e percebe-se tudo.
E o que dizer da 'Cabana Junto à Praia'? Simplesmente que, entre "as dunas e os canaviais", a libido cai de forma vertiginosa e nem chegamos lá com suplementos azuis. Mas enfim, José Cid tem público, esgota arenas e coliseus e ainda vai tocando com regularidade nos santuários-pimba do audiovisual. O que não deve desviar-nos do essencial: as letras são tão bafientas que até causam náusea ("tu ficas louquinha quando eu tiro a casca à banana/ ficas tão tontinha que a tua cauda abana") e a música é de uma ligeireza insuportável.
No concerto, por três vezes se tenta recuperar a memória do Quarteto 1111, a começar em 'Domingo em Bidonville', e por três vezes se falha. Mais à frente, sobem ao palco André Sardet para 'Perto Mais Perto' e 'Foi Feitiço', depois Luís Represas para '125 Azul' e 'Feiticeira'. Diz-me com quem andas... Mas também por aqui não há nada de novo. Quando se trata de tricotar o moralista manto da música portuguesa cantada em português, manda-se o bom gosto às urtigas e quase ninguém falta às aulas de costura.
A música de José Cid rima com um Portugal anacrónico, atrasadinho, longe da Europa e do mundo, e felizmente esse Portugal já não existe, salvo pequenas ilhas de resistência. Só quem nunca viu nevar em Nova Iorque pode pensar que 'Cai Neve em Nova York' é um retrato fiel da cidade e das suas gentes. Há tempo e espaço para tudo e para todos mas também há uma dignidade que quase nunca é tida em conta. As centenas ou milhares de pessoas que seguem em romaria para ver José Cid não deviam servir de desculpa para adiar a reforma do senhor.
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Vários - O Melhor dos Anos 80: As Músicas dos Filmes
É do conhecimento de todos que os anos 80 produziram os penteados que mais desafiaram as leis da gravidade. E, de caminho, deixaram para memória futura quilos de electropop xunga e rock manhoso. Mas nem tudo foi mau, como também sabemos. No meio da estrumeira é possível encontrar coisas valiosas que têm levado a sucessivas ondas de um revivalismo mais ou menos envergonhado.
Duran Duran e Echo & The Bunnymen são nomes grandes dos 80, responsáveis por essa constante revisão da matéria dada. Os dois alinham nesta compilação que reproduz alguns dos temas que, na década das lantejoulas e do "eyeliner", saltaram para o grande ecrã. Mas se é com os olhos brilhantes que recordamos 'Forbidden Colors' de Ryuichi Sakamoto e David Sylvian, 'The Power of Love' de Huey Lewis & The News já nos dá a volta à barriga.
São dois discos cheios que nem um ovo, com música que costuma ser vendida a preço de saldo. A novidade é mesmo a inclusão do tema da série de televisão Zé Gato, escrito a três mãos por Jorge Palma, Tozé e Pedro Brito. Também os Pop Dell'Arte picam o ponto pela selecção nacional com uma competente 'Querelle', que aparecia no filme Uma Pedra no Bolso, de Joaquim Pinto.
Tirando 'I Got You (I Feel Good)' de James Brown e 'Ghostbusters' de Ray Parker Jr (do tempo em que Bill Murray andava a caçar fantasmas), os outros temas não chegam a levar-nos ao cinema. 'I Heard It Through the Grapevine' vale por ser Marvin Gaye e sobretudo por rodar depois de 'Slave to Love' - qualquer coisa que venha depois de Bryan Ferry é um descanso. No resto, as canções vão-se sucedendo uma após outra sem provocarem grande comoção.
Ou seja, à excepção de uma ou outra figura que merecia melhor companhia, isto é gente apanhada numa altura em que estava a apimbalhar-se ou já vivia em plena galáxia do mau gosto. Voltar a ouvir 'Up Where We Belong' até pode sossegar o impulso nostálgico de algumas donas de casa mas acaba por estragar os dentes tanta é sacarose com que Joe Cocker e Jennifer Warnes cantam.
Não é por acaso que, quando se trata dos anos 80, muitos se põem à defesa. Por aqui, temos equipa mas sabemos de uns quantos bons reforços que também jogaram nessa época e que, desta vez, ficaram no banco. Uma coisa esta compilação cumpre: reúne temas que ilustram filmes mas que depois passaram a viver sem eles. Já não é certo que conseguiríamos viver a mesma vida sem estas músicas. Para o bem e para o mal.
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19/08/2008
G. Love & Special Sauce - Superhero Brother
Não há absolutamente nada de errado com a música relaxada, aquele som de esplanada e cocktail que afasta o stress e convida à preguiça. Mas a pintura começa a borrar quando todas as canções soam um pouco ao mesmo. Em "Superhero Brother" é como se G. Love fosse agora um homem religioso (não sabemos se é ou não) e andasse a fazer discos como quem compõe uma mantra, como quem diz uma oração.
E como o blues, elemento sempre presente na sua música, se aproxima mais dos ouvidos do Diabo, o novo disco estranha-se sem nunca se entranhar verdadeiramente. É pena, até porque Garrett Dutton (o nome verdadeiro) tem capital acumulado em pelo menos um par de discos anteriores. Lembram-se de "Coast to Coast Motel", um álbum cheio e de som apurado? Pois bem, este ficou algumas milhas atrás.
É certo que também aqui se tenta chegar a bandidos e diplomatas mas a esquizofrenia boa parou em 2001, com "Electric Mile". Agora com Mark Boyce nas teclas, G. Love e os seus Special Sauce andam nas imediações do funk, da soul e do velhinho rock de guitarras, mas não conseguem afirmar-se em nenhuma dessas pátrias. E é irónico que gente como Jack Johnson e Donavon Frankenreiter, que Dutton apadrinhou, faça parte do imaginário de quem visita as praias mais soalheiras enquanto G. Love fica com o lugar mais à sombra.
No arranque do disco há 'City Livin', uma faixa que toma conta do movimento da anca. No miolo há o habitual número hippie em 'Peace, Love and Happiness' e momentos de corte sentimental como 'Wontcha Come Home'. Logo a seguir, é fogo que arde mas não se vê. Já perto do final, o destaque maior vai para 'Who's Got the Weed'. Há por aqui pasto imenso para nos esticarmos à vontade e fazermos das noites de Verão o nosso templo.
Depois vem o tema-título, em que ele canta em alegre falsete sobre as coisas do mundo, de Bin Laden a Britney Spears. São os Stones em dança tribal com uns Beach Boys requentados. Enfim, um bonito final! É uma dor de alma que o resto não seja mais como estes minutos derradeiros. Assim como está, "Superhero Brother" é só mais um na discografia de G. Love & Special Sauce e isso é muito pouco.
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17/08/2008
Nneka - No Longer At Ease
Nascida em Warri, na Nigéria, Nneka Egbuna tem aquela africanidade na voz, aquela negritude no espírito, que não se perdem por nos mudarmos para Hamburgo, aos 19 anos. Mesmo assim, ela vive na Alemanha há tempo suficiente para se deixar contaminar pela cena electrónica de Berlim, via hip-hop e club. Mas as influências maiores vêm de trás, de gente como Fela Kuti (nigeriano como ela e nome enorme do afrobeat). E ainda da neo-soul de Erykah Badu e de uma forma actualizada de gospel.
Como estar no centro da Europa é também estar um pouco no centro do mundo, em "No Longer At Ease", Nneka deixa várias pontas soltas que, na economia do disco, arranjam forma de se encontrar. É essa universalidade que permite reunir canções como 'Gypsy', um tema soltinho como arroz malandro e que fala sobre a sensação de liberdade, e 'Niger Delta', que tem todas as cores e cheiros de África e é talvez a canção mais cheia do álbum, com trombone, saxofone e clarinete, entre outros instrumentos.
Na Alemanha, Nneka conhece DJ Farhot, personagem fundamental na sua ainda muito curta carreira e creditado como produtor deste álbum. Mas os novos valores culturais são cada vez mais precoces e aí temos a senhora a ser comparada a Lauryn Hill e a ser chamada de rainha da soul em formação. Pequenos mimos da imprensa que, desta vez, não erram nem o alvo nem o alcance.
"No Longer At Ease" é o disco de alguém que passou a adolescência a ouvir Mos Def e Talib Kweli, sem nunca esquecer a ligação à terra-mãe. E depois, esta "supa sista" tem consciência política, como se pode conferir em 'Streets Lack Love', 'Focus' ou mesmo no single 'Heartbeat'. Porque até uma canção de amor pode ser política.
Em 'Kangpe', Nneka é acompanhada por Wesley Williams, também conhecido como Maestro Fresh Wes e considerado o padrinho do hip-hop canadiano. Um pouco antes, em demorada palpitação dub, ela canta 'Something to Say' com Pat Attah, um conhecido actor de Nollywood - não, não são só os Estados Unidos e a Índia, a Nigéria também tem a sua indústria de cinema bem oleada. E claro, a presença de figuras ilustres, nem que seja à escala doméstica, diz qualquer coisa sobre a importância que Nneka vem assumindo.
A acreditar no selo colado na capa do disco, há a circular uma edição exclusiva para Portugal que contém 'Africans', tema retirado de "Victim of Truth" de 2006. Na capa, Nneka aparece com olhar distante, a fazer lembrar as estampas míticas da época dourada da soul e do funk, de James Brown às Supremes. E, pelo que se ouve, ela não parece nada pouco à vontade como o título sugere.
"No Longer At Ease" é um disco de síntese de várias linguagens, da cadência abrasadora dos beats africanos (aqui e ali atravessados por teclas e pelo menos um ukelele) à fria matemática das técnicas modernas de estúdio, com programações ricas mas nunca gordurosas. E tanto serve de cancioneiro de Verão como para levar a castanha ao braseiro quando o Outono vai alto. Não há por aí muitos discos assim.
http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=374
The Mars Volta - The Bedlam in Goliath
Para quem não conhece, a história resume-se em poucas frases. Em 2000, os At The Drive-In editavam "Relationship of Command" e o mundo esperou deles não menos do que a salvação do rock, à época dominado por um nu-metal que perdia em cérebro o que ganhava em músculo. Poucos meses depois, os cinco de El Paso, no estado norte-americano do Texas, separavam-se numa lógica de divergências de estilo e não por questões capilares. Ainda assim, os três de penteado normal formaram os Sparta, que se aproximam perigosamente do punk mais pop. Os dois com cabeleira afro, Cedric Bixler-Zavala e Omar Rodriguez-Lopez, formaram os Mars Volta.
Desde "De-Loused in the Comatorium" de 2003, disco inspirado na morte de Jeremy Ward (ele chegou a tocar no EP "Tremulant"), que se sabe que eles são de todo o lado menos deste mundo. Não se pode estranhar, por isso, que agora editem um álbum que convoca as forças do oculto. Crendices à parte, os Mars Volta não devem suportar o silêncio: "The Bedlam in Goliath" acentua ainda mais a artilharia sónica, pontuada pelo novo baterista Thomas Pridgen e elevada ao infinito pela guitarra de John Frusciante (dos Red Hot Chili Peppers), também ele membro de pleno direito da banda.
Depois dos exercícios extremos de "Frances the Mute" (2005) e "Amputechture" (um ano depois), os Mars Volta levam ainda mais longe uma espécie de terrorismo sonoro que nenhuma jihad é capaz de conter. E ao quarto capítulo, ei-los que partem em direcção a um rock progressivo que só está bem a estilhaçar tudo o que lhe apareça pela frente, seja funk metaleiro, seja psicadelismo pincelado a ritmos latinos. Em solos de guitarra com os wah-wahs multiplicados por mil ou com a voz manipulada da raiz até às pontas, o aviso fica logo na faixa de abertura, 'Aberinkula'. Como que a prevenir que o sossego acabou durante a próxima hora.
O primeiro single a ser retirado do álbum, 'Wax Simulacra', não chega aos três minutos mas tem argumentos que convencem aos primeiros segundos, numa jam curtinha e enxuta. Os grandes épicos estavam reservados para mais tarde, 'Cavalettas' e 'Soothsayer', cada um a ultrapassar os nove minutos e o primeiro com direito a flauta. Ikie Owens, outro dos Mars Volta, também com os Long Beach Dub Allstars, atalha por 'Agadez' com teclas tão endiabradas que caem mal no goto depois de uma refeição bem regada. Enfim, praticamente todos os temas são tocados com a urgência de um mundo a arder lá fora.
Uma pequena nota em relação ao trabalho gráfico, sempre de uma beleza irrepreensível. Se em "De-Loused in the Comatorium", tínhamos uma cabeça dourada a emitir um feixe de luz pela boca, agora temos o que parece ser uma rua árabe, dominada por senhores de vestes brancas.
Sem nos alongarmos em prognósticos, com este excesso todo (sonoro e visual, já percebemos que uma coisa não existe sem a outra), é difícil que os Mars Volta continuem por muito mais tempo sem se tornarem aborrecidos, por se repetirem, ou inofensivos por amansarem, o que seria bem pior. Mas esse é um risco que eles parecem dispostos a correr.
http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=372
14/08/2008
Tricky - Knowle West Boy
A dada altura, um miúdo que vive num bairro problemático pode ter duas opções: ou engrossa as estatísticas do crime e outras associadas, ou faz música que, à sua escala, se inscreve num pequeno capítulo da história da arte. Nem sempre é assim mas também quase nunca é muito diferente disto. Tricky, a persona artística de Adrian Thaws, cresceu no pouco recomendável Knowle West de Bristol. E é sobretudo do bairro que fala no mais recente "Knowle West Boy".
Já não estamos perante um "Maxinquaye", o primeiro disco de 1995, uma espécie de clássico instantâneo junto da crítica e do público, que saiu quando o trip-hop era ainda uma criança. Mas também não se pede a um músico que ultrapasse a excelência, menos ainda quando ela foi conseguida à primeira cavadela. Por estes dias, Tricky já andará resignado e com ele o resto do mundo: qualquer novo álbum dele vai estar sempre uns furos abaixo daquele que tem momentos geniais como 'Pumpkin', 'Abbaon Fat Track' ou 'Overcome'.
Aclamado por muitos como um triunfante regresso aos grandes discos e arrasado por outros tantos por estar a milhas de distância da obra maior, "Knowle West Boy" não merece nem um nem outro tratamento. É um disco de canções ora mortiças, como a versão de 'Slow' de Kylie Minogue, ora carregadinhas de tensão como o poderoso single 'Council State'. E depois há outro factor a ter em conta: desde o álbum de estreia Tricky não demorava mais do que dois anos entre edições, desta vez foram cinco e a expectativa era muita, comparável à que envolveu o regresso dos Portishead, este ano, e que andaram mais de uma década para editar material novo.
A voz de apoio que se ouve já não é a voz quente de Martina Topley-Bird, mas a presença feminina continua a ser um contrapeso importante ao registo cavo e escuro de Tricky. E isso ouve-se logo em 'Puppy Toy', um tema que abre com teclados que parecem saídos de cabarets fumarentos. Mas também em 'Cross to Bear', uma canção que mais facilmente associamos a um jazz vocal e regrado do que ao universo habitualmente esquizofrénico de Tricky.
Uma coisa é certa: ele continua capaz de escrever grandes canções que, num tom arrastado e insinuante, se revelam pequenos hinos ao amor. Foi assim com 'Pumpkin', que cantava com Alison Goldfrapp, é assim com 'Past Mistake', um daqueles temas que fazem parar os ponteiros do relógio de tão belos e convidativos à contemplação. Chegados ao final do disco, outro preconceito cai por terra. A subdivisão da electrónica que, acidentalmente ou não, Tricky ajudou a criar já não vale apenas como música de fundo de quarto de hotel ou de elevador. Agora o trip-hop é também folk sem nunca ter deixado de ser funk e soul. É tudo isso que se ouve na derradeira 'School Gates'. Tricky voltou, para o caso pouco importa se está perdoado ou não.
http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=366
Appart - Flamencotronics
Milan Records
If flamenco doesn't necessarily float your boat, you may want to try some other traditional, rhythmic undertones revisited by contemporary electronic programming. Appart's third full-length album "Flamencotronics", is a collection of songs where the Spanish guitar and the cajón (a box drum of Afro-Peruvian origin) see their reach expanded and walked, or should I say gracefully taken to the dancefloor. While this record plays, an obvious parallel with Konono No.1's reworking of Congolese traditional music inevitably comes to mind.
Tradition is most evident in tracks like "Toni El Caballero" and "Gipsy Breakout"; in both numbers, the dialog between the hands and the feet is superb, and the electronic devices erupt with no great apparatus, just as an accompanying footnote. Diana Regano's hand clapping punctuates the speech so the listener will always keep in mind this is an ancestral genre amplified and conducted by the electrolytes of today, and not the other way around.
Anthony Rouchier's ventriloquist-like programming pumps new blood into the otherwise self-absorbed "¿Hola Que Tal?" with some sharply chopped keyboards and guitar lines. All these tracks aim at some sort of anthropological perfection by means of the grandiloquent vocals of Regano, Rouchier and Alejandro Pandore. But the most unexpected twist has to come from the first glossy, and then warm "Clap Clap Fuego".
While we're on it, "Rafael Nadal Dancefloor Superstar" is an electrified number where the beatbox is predominant – not to mention a resonating tribute to the young Spanish tennis player, as it even features a sample of a game's narration. If it wasn't for the pounding Hispanic-influenced arrhythmia, its true roots would go completely untraceable. This one here is the obvious highlight for those who would rather gush over tired techno than crack music's encoded legacy.
As the record draws to a close, the beat is considerably slowed down, making room for an overfed trio of songs, starting with the relaxed ode to the nap that is "Sprinkler System Siesta", the castanet-centered "San Sebastian Rules", and the soulful "Alma", which translates precisely as soul from the Spanish. "Flamencotronics" may play with an often explored tradition-meets-new formula, but it doesn't prevent it from being quite good.
http://www.properlychilled.com/music/release/profile.php?view=598
If flamenco doesn't necessarily float your boat, you may want to try some other traditional, rhythmic undertones revisited by contemporary electronic programming. Appart's third full-length album "Flamencotronics", is a collection of songs where the Spanish guitar and the cajón (a box drum of Afro-Peruvian origin) see their reach expanded and walked, or should I say gracefully taken to the dancefloor. While this record plays, an obvious parallel with Konono No.1's reworking of Congolese traditional music inevitably comes to mind.
Tradition is most evident in tracks like "Toni El Caballero" and "Gipsy Breakout"; in both numbers, the dialog between the hands and the feet is superb, and the electronic devices erupt with no great apparatus, just as an accompanying footnote. Diana Regano's hand clapping punctuates the speech so the listener will always keep in mind this is an ancestral genre amplified and conducted by the electrolytes of today, and not the other way around.
Anthony Rouchier's ventriloquist-like programming pumps new blood into the otherwise self-absorbed "¿Hola Que Tal?" with some sharply chopped keyboards and guitar lines. All these tracks aim at some sort of anthropological perfection by means of the grandiloquent vocals of Regano, Rouchier and Alejandro Pandore. But the most unexpected twist has to come from the first glossy, and then warm "Clap Clap Fuego".
While we're on it, "Rafael Nadal Dancefloor Superstar" is an electrified number where the beatbox is predominant – not to mention a resonating tribute to the young Spanish tennis player, as it even features a sample of a game's narration. If it wasn't for the pounding Hispanic-influenced arrhythmia, its true roots would go completely untraceable. This one here is the obvious highlight for those who would rather gush over tired techno than crack music's encoded legacy.
As the record draws to a close, the beat is considerably slowed down, making room for an overfed trio of songs, starting with the relaxed ode to the nap that is "Sprinkler System Siesta", the castanet-centered "San Sebastian Rules", and the soulful "Alma", which translates precisely as soul from the Spanish. "Flamencotronics" may play with an often explored tradition-meets-new formula, but it doesn't prevent it from being quite good.
http://www.properlychilled.com/music/release/profile.php?view=598
07/08/2008
4Hero - ...Mixing
Sonar Kollektiv
The London-based duo 4hero is a major name in jungle and drum'n'bass, and it's as strong and pioneering as Burial and Kode9 will probably be in two decades for the dubstep/grime scene. Even geography plays in favor of this oracle – the epicenter is the same, the English capital, and the fuss it caused in the early 90s when the styles were still being shaped is just as heart-accelerating. Now that London is once again an exciting lab for music in the making, it's nice to look back and delve into the wonders of one of the most seminal acts' past and present influences.
That's the kind of journey Dennis McFarlane (aka Dego) and Mark Clair (aka Marc Mac) take the listener to in the third installment of Sonar Kollektiv's "...Mixing" series. Kicking things off is a funky and sweaty little number called "Fat Cat", delivered by Bootsy Collins, who in his early years played in James Brown's band and was part of Funkadelic and Parliament. You can't get much funkier than that, or so you think!
Then comes INT's "Beat 8", nothing more than a 1-minute prelude to "Game Over", a contagiously sickening track done by Dabrye and documenting the good ol' hip-hop the folks do in Detroit. This cut is so tight you can almost picture yourself as a character in a computer game being chased by demons with eyelids dripping blood. The first segment of the record is concluded with the late and great J Dilla doing "Over the Breaks", taken from the posthumous album "The Shining".
Later on, Dego and Marc Mac spin the glass ball for a hedonistic dive into the glossy, funk-driven disco of Two Sisters, Face, and Raymond Scott, who has been, as the press release assertively reminds us all, a great influence for the likes of Aphex Twin and even Robert Moog. However, as any revivalist mixtape is also a crossover of sorts, reggae, dub and roots is what follows in the menu. "Blood On His Lips" pays the electricity bill as cut by Hopeton Brown, here credited as Scientist, but it's "Roots Dub" by The Skatalites that truly shatters all codes and reconnects our collective ear to the Jamaican soil.
Sa-Ra's reworking of "On the One" is worth mentioning as well, as are the loosely tepid waters of Little Brother's "Nighttime Manoeuvres". But Detroit seems at times to be the new London as producer Waajeed comes in to gently dismiss everyone with the great finale that is "Make Doe". Needless to say, each track is glued to the following as in a tremendously good live set.
If you ever thought 4hero was the consciousness of a certain electronic sound with a tendency for both self-indulgence and numerous creative links, you're probably right. In "...Mixing" they reunite a clan of critical musicians and make their work available at a wallet easing discount. You won't see this happening again this year.
http://www.properlychilled.com/music/release/profile.php?view=595
The London-based duo 4hero is a major name in jungle and drum'n'bass, and it's as strong and pioneering as Burial and Kode9 will probably be in two decades for the dubstep/grime scene. Even geography plays in favor of this oracle – the epicenter is the same, the English capital, and the fuss it caused in the early 90s when the styles were still being shaped is just as heart-accelerating. Now that London is once again an exciting lab for music in the making, it's nice to look back and delve into the wonders of one of the most seminal acts' past and present influences.
That's the kind of journey Dennis McFarlane (aka Dego) and Mark Clair (aka Marc Mac) take the listener to in the third installment of Sonar Kollektiv's "...Mixing" series. Kicking things off is a funky and sweaty little number called "Fat Cat", delivered by Bootsy Collins, who in his early years played in James Brown's band and was part of Funkadelic and Parliament. You can't get much funkier than that, or so you think!
Then comes INT's "Beat 8", nothing more than a 1-minute prelude to "Game Over", a contagiously sickening track done by Dabrye and documenting the good ol' hip-hop the folks do in Detroit. This cut is so tight you can almost picture yourself as a character in a computer game being chased by demons with eyelids dripping blood. The first segment of the record is concluded with the late and great J Dilla doing "Over the Breaks", taken from the posthumous album "The Shining".
Later on, Dego and Marc Mac spin the glass ball for a hedonistic dive into the glossy, funk-driven disco of Two Sisters, Face, and Raymond Scott, who has been, as the press release assertively reminds us all, a great influence for the likes of Aphex Twin and even Robert Moog. However, as any revivalist mixtape is also a crossover of sorts, reggae, dub and roots is what follows in the menu. "Blood On His Lips" pays the electricity bill as cut by Hopeton Brown, here credited as Scientist, but it's "Roots Dub" by The Skatalites that truly shatters all codes and reconnects our collective ear to the Jamaican soil.
Sa-Ra's reworking of "On the One" is worth mentioning as well, as are the loosely tepid waters of Little Brother's "Nighttime Manoeuvres". But Detroit seems at times to be the new London as producer Waajeed comes in to gently dismiss everyone with the great finale that is "Make Doe". Needless to say, each track is glued to the following as in a tremendously good live set.
If you ever thought 4hero was the consciousness of a certain electronic sound with a tendency for both self-indulgence and numerous creative links, you're probably right. In "...Mixing" they reunite a clan of critical musicians and make their work available at a wallet easing discount. You won't see this happening again this year.
http://www.properlychilled.com/music/release/profile.php?view=595
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