28/08/2008

Nas - Nas

Nas - Nas

Ao nono álbum, Nas volta a fazer sentido fora dos limites de Nova Iorque, depois de anos a atravessar um deserto de ideias em que pregou essencialmente aos peixes. O álbum de estreia "Illmatic" fazia do rapper de Queens o legítimo herdeiro do hip-hop de causas na costa leste dos Estados Unidos. Quase uma década e meia depois, o poeta do gueto investe em rimas que deixam de ser apenas para consumo interno. Pelo meio, foi acusado de ser um vendido por causa de edições com grandes cedências comerciais e alimentou alguma guerrilha dentro do circuito.

O maior rival foi Jay-Z numa altura em que o insulto fazia vender mais papel do que a música. Mas Nasir Jones, o verdadeiro nome de Nas, sempre soube rodear-se de produtores da velha escola como Pete Rock e Large Professor e nunca abandonou verdadeiramente a disciplina de rua. Em 2001, editava o álbum que se pretendia de reconciliação com o passado, "Stillmatic", e em que respondia aos ataques dos outros. Cinco anos depois, a trégua foi selada através de um contrato com a Def Jam, a editora de Jay-Z, que também lança agora este disco homónimo.

Nas volta então a inscrever-se na facção mais militante do hip-hop, longe dos Roots dos 90, mais interessados no lado lúdico do jazz, mas muito próximo dos Dead Prez, empenhados em mostrar o dedo do meio a um sistema capitalista e opressor. De resto, stic.man, uma das metades do duo da Florida, participa em 'Untitled', enquanto Busta Rhymes faz o seu número no ataque às cadeias de comida rápida, em 'Fried Chicken'. Antes disso, 'You Can't Stop Us Now' já recuperava o enorme legado R&B dos Stylistics e a palavra falada dos Last Poets.

Os fundamentalistas vão certamente ler no par de canções orelhudas, 'Make the World Go Round' e 'Hero', mais uma concessão de Nas às lógicas do mercado. Mas os puristas mais quadrados nunca mereceram ser levados a sério. 'America' fala como nenhuma outra da questão racial porque junta letras certeiras e actuais a uma cama rítmica onde apetece mesmo deitar. Nesse tema, Nas fala por exemplo sobre as quotas de negros na NASA, a discriminação das mulheres e ainda sobre um país ferido de morte na sua capacidade de gerar sonhos.

A culpa é da dieta de propaganda servida pela cadeia de televisão Fox (é conferir 'Sly Fox') e de um sistema judicial podre por dentro ('Testify'). Mas Nas está longe de ser um fatalista e termina o disco a insuflar esperança. É que a América está muito diferente. Bush fez dela uma das nações mais odiadas do mundo. E o discurso de mudança vem de um homem que, se os astros se alinharem, será o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos. É sobre isso que Nas canta em 'Black President', num relato mais desassombrado do que o resto do álbum.

http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=384

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