17/09/2008

B.B. King - One Kind Favor

B.B. King - One Kind Favor

B.B. King é uma figura maior entre os grandes. Se W.C. Handy foi o pai dos blues, por ter enxertado a música negra sulista nas consciências populares, nas longínquas primeiras décadas do século passado, King reina sem sucessor, sendo para muitos o mais importante guitarrista eléctrico do último meio século. Senhor digno de entrar directamente para um Panteão Nacional, depois de correr a existência terrena a pontapé, é a medo que avançamos para este "One Kind Favor".

Um disco que abre com 'See That My Grave Is Kept Clean' pode parecer toque de finados - afinal, o homem já não caminha para novo e acaba de completar 83 anos. Felizmente, o toque aveludado, negro como uma noite sem lua, não é senão um exercício de despojamento para recentrar atenções na forma mais tradicional de tocar blues. O aviso estava dado: B.B. King iria gravar um disco de regresso às origens, com a ajuda do produtor T Bone Burnett. E fê-lo, mas sem nunca soar fora de prazo.

A proeza maior destas 12 canções é conseguirem resgatar o período de reflorescimento dos blues, em meados do século passado. A música de King, como o melhor cinema de Oliveira, avança mais quando fica parada. 'I Get So Weary' e 'The World Gone Wrong' são duas belíssimas peças de colecção porque têm o ar de outros tempos, estão insufladas de um aroma a fumo de bares, a caminhos-de-ferro a ligar uma América mítica, com o Mississípi em fundo.

Tal como nos melhores discos de standards de jazz e blues (ouça-se quando Louis Armstrong revisita o trabalho de W.C. Handy), as canções assumem uma vocação algo reverencial. Talvez porque a melhor forma de tocar blues seja citá-los, temos 'Get These Blues Off Me', 'Blues Before Sunrise', 'Midnight Blues' e 'Backwater Blues'. Em qualquer um deles, o sentido da palavra atira para os blues tocados e para os blues sentidos: em inglês, "blues" também se refere a um estado de espírito, que, traduzido para Camões corrente, há-de significar qualquer coisa como "estar com a neura".

Num registo mais baladeiro ('My Love Is Down' e 'Sitting On Top of the World') ou num estilo mais conciliador (como no brilhante final que é 'Tomorrow Night'), B.B. King nunca perde a elegância nem a subtileza vintage de soar clássico e moderno na mesma nota. Para isso, faz-se acompanhar pelo baixista Nathan East, que já trabalhou com Clapton, o pianista Dr. John e Jim Keltner na bateria. O resultado é um disco que faz da escuridão luz e que devolve o classicismo à geografia dos blues. Ainda se vai falar muito deste "One Kind Favor" no futuro.

http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=394

Sem comentários: