30/09/2008

Vários - Hip Hop: The 2008 Collection

Vários - Hip Hop: The 2008 Collection

Sabemos que a face mais visível do hip-hop tem um lado de ostentação que afasta o ouvido mais exigente. Sabemos ainda que é justamente essa divisão mais comercial da coisa que molenga demoradamente nas rádios e nas tabelas de vendas. E não somos indiferentes ao facto do hip-hop ser hoje uma linguagem de liceu, como antes era o rock alternativo, por exemplo. Tudo somado, percebemos que o tempo é de contaminações várias. E que já não dá para ignorar a forma como o comercial e o criativo se tocam mais intensamente do que antes.

Não queremos legitimar mais a lógica dos cifrões e menos a palavra do gueto, bem pelo contrário. Haverá sempre um lugar especial no coração para os De La Soul, A Tribe Called Quest ou Company Flow. Mas a marcha triunfal da indústria sobre o jargão de rua tornou-se ensurdecedora. Kanye West, Snoop Dogg, 50 Cent, Busta Rhymes e The Black Eyed Peas são nomes que se confundem com a vaga de fundo que entretanto se abriu no hip-hop. Todos eles têm contas bancárias com muitos dígitos e, se não se aburguesaram mais com o tempo, é porque sempre tiveram vocação para o lucro instantâneo.

É também neste contexto que surge uma compilação como "Hip Hop: The 2008 Collection". Trata-se de um conjunto de temas orelhudos que fizeram carreira durante este ano, ainda que, em muitos casos, as edições originais já levem mais do que um bom par de anos. Mas, em vez de seguir desgovernada a distribuir os salteadores dos tops, a compilação consegue resistir à tentação de satisfazer de enfiada o apetite do ouvinte mais distraído, logo mais exposto às leis do rebanho. Por isso, roda um insuspeito Lupe Fiasco depois de Gwen Stefani, Rihanna e Ne-Yo.

A digestão fácil dos dois pratos servidos (a compilação é dupla) vai depender do grau de simpatia pelos artistas incluídos. O primeiro disco está mais carregado de testosterona - casos de 50 Cent, Akon e will.i.am - e de pernas mais bem torneadas - como as de Fergie, Mutya Buena e, de novo, da Rihanna da vida. Esse é um complexo que não descola do hip-hop burguês, o da sexualidade latente, do culto da imagem e de uma certa primazia sobre a música.

Já o segundo disco atalha mais vezes pela rima elaborada, através da inclusão de pequenos mas cirúrgicos golpes de teatro. Afinal, não é todos os dias que o 'Ghetto Gospel' de 2Pac roda antes da estafada 'Don't Phunk With My Heart', dos Black Eyed Peas. E também se percebe aqui um risco maior, com Basement Jaxx a remisturar Missy Elliott ou com Dr. Dre a revisitar o 'No Diggity' dos Blackstreet (no vídeo, eles são transformados em fantoches). É esse o valor maior desta compilação que, no resto, parece um trabalho de casa feito por cândidos e bem comportadinhos rappers. O hip-hop que interessa segue dentro de momentos.

http://cotonete.clix.pt/quiosque/novos_discos/body.aspx?id=400

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