08/02/2009

a grande família da humanidade

Lisboa é uma cidade romântica só porque existe. Existe, sabe que existe assim e, para sermos justos, não faz rigorosamente nada para continuar a merecer esse estatuto. É esse o lugar mítico que reservamos para as deusas, para as mulheres bonitas. As mulheres bonitas não precisam de ser simpáticas. Mas, quando o são, levam-nos a tocar o céu. Lisboa é um pequeno segredo, sussurrado aos ouvidos do mundo. É referida no início do Casablanca, o filme mais romântico de sempre, naquela voz de narrador de rádio como só o cinema clássico soube dar-nos. Às vezes, pergunto-me por que ando por aqui. Por que volto sempre depois de deixar Lisboa pelas costas. Cheguei recentemente a uma belíssima conclusão: volto a esta cidade e a este país porque gosto de lixar a cabeça destas pessoas. De me fazer passar por homossexual quando detecto traços grossos de homofobia do outro lado. De me fazer passar por muçulmano quando alguém concorda com o infeliz conselho sentimental do cardeal-patriarca. De inventar uma família de imigrantes quando alguém culpa os estrangeiros pelos males do mundo. Gosto de malhar nesta gente lusa - "malhar", esse termo cunhado na política recente por essa besta de ministro Augusto Santos Silva.

Ontem foi noite de juntar a grande família da humanidade. De deambular por Lisboa à noite e acabar num bar do Bairro Alto com uma legião de espanhóis. Nos últimos anos, desenvolvi a bonita capacidade de começar a falar com a pessoa que se senta ao meu lado. Ontem a Margarita foi a vítima. Falámos muito, ela em castelhano, eu em português. Falou mais ela, eu não falo muito. Mas dei por mim a dizer coisas interessantes. Acontece muito quando me ponho a falar. Acontece mais o contrário. No regresso a Alvalade, onde tinha ficado o carro, a inevitável conversa com o taxista. Ainda uma série de abraços de uma miúda querida, abraços que já dizem tudo sem palavras. O último regresso a casa foi já sozinho e só mesmo quando saí do carro, às quatro e tal da madrugada, é que percebi que Lisboa estava debaixo de uma lua imensa.


2 comentários:

eu disse...

Palavras para quê? ;) E hey!, eu não sou incrivelmente triste!!!

Helder Gomes disse...

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